Rigidez na nova redação do ECA

O Senado aprovou dia 21 de outubro projeto de lei que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O texto é de autoria da senadora licenciada Marina Silva (PT-AC), hoje ministra do Meio Ambiente, e segue para sanção presidencial nesta semana. Essa é a primeira revisão ampla no ECA realizada pelo Senado desde que a lei foi promulgada, em 1990.

A nova redação do Estatuto diz que é crime “apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, inclusive rede mundial de computadores – internet -, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito envolvendo criança ou adolescente (artigo 241)”. A pena para quem cometer essa prática é de dois a oito anos de cadeia. “A proposta representa um avanço na luta em defesa dos direitos de crianças e adolescentes”, afirma a senadora Patrícia Saboya (PPS-CE), coordenadora da Frente Parlamentar pela Infância. “Além de aperfeiçoar vários artigos do estatuto, ainda cria novos tipos penais.”

Ausência temporária

Embora agora há previsão de punições mais rigorosas para alguns tipos de crimes, o Senado retirou do projeto que altera o estatuto a proposta aprovada na Câmara dos Deputados que previa até seis anos de cadeia para quem tirasse vantagem financeira de meninos e meninas. O artigo tinha um alvo principal: pessoas que usam crianças para pedir esmola nas ruas, cena comum nas grandes cidades do País.

O relator do projeto no Senado, Demóstenes Torres (PFL-GO), declarou que o artigo foi suprimido temporariamente para ser aperfeiçoado, mas será incluído novamente antes da sanção presidencial. “Da forma que estava não dava para mantê-lo. Seria piorar ainda mais a situação daquelas pessoas que já vivem em situação de extrema exclusão”, disse. Segundo o senador, é preciso discutir mais o assunto para deixar clara a diferença entre sobrevivência e a exploração infantil. “O artigo voltará a ser incluído, mas antes precisamos definir o texto de forma que incrimine, principalmente, essas redes “profissionais” que utilizam crianças e adolescentes para praticarem a mendicância, e não puna a mãe que utiliza a criança em estado de urgente necessidade”, defende o senador.

Imagem protegida

Foi aumentado também o rigor do artigo 143, que preserva a identidade e a imagem da criança ou adolescente que comete ato infracional. A antiga versão da lei já proibia a divulgação ou publicação de fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco e residência. A novidade é que agora será proibido também divulgar as iniciais do nome e sobrenome dos jovens acusados de qualquer crime. A punição aumentou para até seis anos de cadeia. Segundo Beth Costa, editora da TV Globo, a alteração foi positiva, pois algumas matérias atuais trazem as iniciais de uma criança junto com informações, por exemplo, acerca do bairro onde mora, onde estuda e outros dados que acabam por revelar sua identidade. “As mudanças no ECA preservam ainda mais crianças e adolescentes sem prejudicar em absolutamente nada a cobertura jornalística”, afirmou a profissional.

Desarmamento

Quem vender ou fornecer arma e munição para crianças ou adolescentes também será punido com mais rigor. A pena máxima passa de dois para seis anos de prisão. “As mudanças estão em harmonia com a nova lei do desarmamento”, afirma o senador Demóstenes. O mesmo ocorre com quem fornecer drogas. A pena máxima foi aumentada de dois para quatro anos.

Polêmica

O parágrafo 240, que já previa punição para quem veiculasse imagens de pornografia infantil, agora incrimina também a exibição de cenas de crianças e adolescentes em situação vexatória. A mudança causou polêmica porque alguns advogados chegaram a afirmar que a inclusão da palavra “vexatória” no artigo teria sentido muito amplo, impedindo a veiculação até mesmo de imagens de crianças em situação de risco social. A discussão teve início quando o advogado Dálio Zippin Filho, da OAB-PR, afirmou, em uma entrevista ao site Comunique-se, que a alteração no artigo não permitiria a jornais publicarem, por exemplo, matérias que denunciassem o descaso do Estado com relação às crianças em condições de pobreza. “A palavra ?vexatória? abarca múltiplas interpretações, o que poderia gerar ações indenizatórias contra meios de comunicação”, disse Zippin. Porém o senador Demóstenes não concorda com a posição do advogado e afirmou que não há riscos para a liberdade de imprensa com o novo projeto. “Essa é uma preocupação desnecessária. No direito penal, colocar uma pessoa em situação vexatória pressupõe dolo a intenção de constranger a vítima por parte de quem veicula a imagem. E é claro que uma fotografia de uma criança pobre catando lixo num aterro, por exemplo, não se enquadra nessa lei”, afirma.

Segundo Saulo de Castro Bezerra, presidente da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude (ABMP), a inclusão da palavra “vexatória” foi um grande ganho para o ECA. Segundo ele, exatamente a amplitude do seu significado protege, de forma mais abrangente, meninos e meninas. “Um jornal não poderá, por exemplo, veicular a imagem e a identidade de um adolescente como inadimplente numa instituição escolar, ou expor uma fotografia de uma vítima de assédio ou abuso sexual”, disse.

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