Ordem de despejo

Revisão de ações judiciais pode desabrigar 250 famílias

Uma briga judicial que já dura mais de 30 anos pode acabar no desalojamento de cerca de 250 famílias que moram na Vila Domitila, localizada na divisa dos bairros Ahu e Cabral. Com a revisão de algumas ações que tramitam na Justiça, algumas delas já estão recebendo mandados de reintegração de posse para que deixem suas casas e devolvam os terrenos ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que os reivindica. O lote de mais de 190 mil metros quadrados inclusive está em processo de venda para o governo do Estado e o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), segundo o próprio INSS.

Para a pesquisadora Sirlene Motta, esta é uma situação na qual “o Estado está querendo grilar as terras de particulares”. Ela e outros vizinhos garantem que possuem documentos comprovando a propriedade dos terrenos, adquiridos da família de Abdon Soares e Mylka Polysu. “Não somos invasores, não somos posseiros de luxo, como já falaram anteriormente. Temos documentos que comprovam que compramos e pagamos. A maioria está aqui há mais de 25 anos. A própria Justiça já reconheceu isso anteriormente e agora está desconsiderando as decisões favoráveis anteriores”, comenta.

A juíza Gisele Lemke, da 2ª Vara Federal, explica que as novas decisões da Justiça, que resultaram em mandados de reintegração de posse, foram tomadas com base na confrontação de três perícias distintas realizadas para complementar as ações. “Esses processos já estão em trânsito em julgado, com decisões finais no Tribunal Regional Federal da 4ª Região ou no Superior Tribunal de Justiça. Por isso, não é possível recorrer”, explica. Esta não é a primeira vez que são emitidos mandados de reintegração de posse. Nas anteriores, entretanto, os terrenos foram desocupados sem que houvesse confusão. Procurado pela reportagem, o INSS informou que somente a Justiça poderia comentar as ações.

Perícias divergentes motivam mudanças nas decisões

A confusão da Vila Domitila começou ainda na década de 1970, quando Abdon Soares e Mylka Polysu entraram com uma ação na Justiça reivindicando a posse do lote de mais de 190 mil metros quadrados na divisa dos bairros Ahu e Cabral. Este processo terminou de forma favorável ao INSS. Mesmo assim, a família chegou a vender parte dos terrenos a terceiros. Alguns deles chegaram até mesmo a registrar os imóveis em cartórios, o que não seria possível, pois já havia um registro em nome do INSS. As matrículas, portanto, eram coincidentes, referindo-se ao mesmo lote.

Mais tarde, já na década de 1980, o INSS teria contratado uma empresa de vigilância para monitorar o local e, com base nas informações repassadas por ela, iniciou uma série de ações na Justiça reivindicando a posse perante os ocupantes dos terrenos. São esses processos que estão resultando em mandados de reintegração de posse agora. Anteriormente, algumas decisões foram embasadas em uma perícia realizada em 1998 por Renor Valério da Silva, que apontava outra localização para o lote do INSS. Uma segunda perícia, entretanto, realizada em 1999 por Regina Lucia Lauand de Paula, mostrava que o INSS era mesmo proprietário do terreno onde está a Vila Domitila.

Devido a essa divergência nos laudos, a Justiça solicitou uma nova perícia, concluída em 2006 por Zung Che Yee, para tirar a dúvida. Esta terceira perícia também aponta que o INSS é o proprietário do lote inteiro. E é com base na confrontação desses três documentos que as ações passaram a ser revistas, mudando algumas das decisões, que antes eram favoráveis aos moradores da Vila Domitila. O registro do imóvel é de 1944. Antes disso, o lote pertencia a Caetano Munhoz da Rocha. Para encerrar de vez o caso, a Justi,ça ainda propôs a realização de uma audiência de conciliação, mas não houve proposta de indenização pelo órgão.

Marco André Lima
INSS negocia venda do lote para governo e Tribunal de Justiça.
Voltar ao topo