Registrado primeiro caso da doença de Chagas no PR

Foi registrado na última terça-feira o primeiro caso de doença de Chagas – oriundos de caldo de cana vendido em quiosques no litoral norte de Santa Catarina – no Paraná. O paciente Jair Pedro Fritzen, 33 anos, está internado no Hospital Nossa Senhora das Graças, em Curitiba,  recebendo tratamento necessário, cuja duração é de 30 a 60 dias.

?Chamamos esse de um caso importado, pois a pessoa contraiu em Santa Catarina?, explica a diretora do Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal de Saúde. No dia 12 de fevereiro, o caminhoneiro Fritzen voltava da praia com a mulher Louvânia, 26 anos, e um amigo em direção a Joinville, onde mora, e resolveu parar para tomar caldo de cana em um quiosque na BR-101, próximo a Navegantes. Segundo Jair, o amigo tomou cinco copos da bebida e hoje está internado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) de um hospital de Joinville, em estado grave. Fritzen tomou dois copos. ?Tinha muita gente lá. Havia fila de carro para tomar caldo de cana. No mesmo dia tinha umas 40 pessoas. Tinha argentino, paraguaio, uruguaio?, conta Jair.

Segundo o médico infectologista do hospital, Clóvis Arns da Cunha, a quantidade da bebida ingerida também influencia na gravidade da doença. ?Tem relação sim. Isso chama-se inóculo, quantidade de protozoário que o indivíduo ingeriu. Se o amigo tomou mais, terá a doença mais grave?, explica doutor Clóvis.

Sintomas

O paciente ingeriu a bebida num sábado (12 de fevereiro). Ele conta que já na segunda-feira tentou ir trabalhar, mas se sentia muito mal, com os sintomas de febre, dor de cabeça e muita dor no estômago. Então teve de ficar em casa nos dois dias seguintes (terça e quarta). ?Na quinta-feira (17 de fevereiro) eu fui trabalhar meio mal. Na sexta eu não consegui. Domingo fui internado?, afirma Jair.

Primeiro, Jair foi internado em Araucária, no Hospital São Vicente de Paula, onde pensaram se tratar de uma meningite. Na semana passada, os médicos o transferiram para o Nossa Senhora das Graças, onde os médicos desconfiavam de toxoplasmose. Somente na terça-feira, após os testes, o hospital conseguiu isolar o Trypanosoma cruzi e diagnosticar precisamente a doença de chaga aguda. ?Hoje (ontem) de manhã já começou o tratamento. O medicamento, em caso de forma aguda da doença, é bastante eficaz. Cerca de 80% de sucesso. O paciente está bem, mas é cedo para saber como vai se desenvolver. O paciente pode vir a ter, como seqüela, uma cardiopatia (doença no coração, causada pelo protozoário) que pode ser fatal?, explica o infectologista.

A família está bastante satisfeita com a agilidade do hospital em diagnosticar e iniciar o tratamento, pois o medicamento é de difícil distribuição em todo o País. ?Os médicos estão bem confiantes. Por sorte tinha a medicação por aqui e começaram o tratamento logo?, diz a esposa.

Estudo comprova transmissão

Brasília – Um estudo de laboratório feito no Centro de Pesquisa Gonçalo Moniz (CPqGM), da Fiocruz, em Salvador, na Bahia, comprovou que a transmissão da doença de Chagas pode sim ocorrer por via oral. De acordo com a médica Sônia Gumes Andrade, especialista em patologias, que publicou sua experiência a respeito há dois anos, os testes realizados em camundongos mostraram que os parasitas colocados no estômago desses animais resistiram à acidez do suco gástrico.

Sônia explicou que a experiência envolveu as análises de várias cepas diferentes e ?o que se esperava era que ao inocular os parasitas no tubo digestivo eles seriam destruídos?. Ela informou que os alimentos expostos aos parasitas silvestres podem ser contaminados como ocorreu em outros casos, no Pará, Paraíba e Rio Grande do Sul.

Na floresta amazônica, no Pará, já houve transmissão por ingestão de suco de açaí contaminado. ?Em geral, não há barbeiros nas casas, os insetos vêm das matas e atraídos pela luz caem nos equipamentos em que são feitos os sucos?, esclarece. Ela informou ainda que a contaminação também pode ocorrer por meio da urina de gambás. Esses animais do tipo marsupial podem servir de reservatórios de parasitas.

Lacen recebe amostras

O Laboratório Central do Estado (Lacen) recebeu nas últimas 24 horas mais de 50 amostras para fazer o exame que detecta a doença de Chagas. Esse número é três vezes maior que o total de exames da doença realizados por mês, e dez vezes maior que a média diária. As coletas são feitas em todos os postos de saúde do Estado e enviados ao Lacen para que possa fazer os exames. O Lacen foi indicado pela Secretaria de Estado da Saúde como laboratório de referência no Estado para detectar a doença.

Todas as pessoas que estiveram em Santa Catarina, no trecho entre Garuva e Itajaí da BR-101 e tomaram caldo de cana no período de primeiro de fevereiro até 20 de março devem procurar os postos de saúde para a coleta de sangue. As amostras são enviadas ao laboratório, que conclui os exames em um período de dois a três dias. ?Não existe motivo para a população entrar em pânico no Paraná, um surto como o que ocorreu em Santa Catarina é muito raro. O último que aconteceu foi no Estado da Paraíba há muito tempo?, disse o coordenador do Centro de Saúde Ambiental da Secretaria da Saúde, Natal Jataí de Camargo. ?No entanto, é fundamental que todas as pessoas que estiveram nesses locais e tomaram o caldo de cana durante a temporada, façam os exames porque a doença pode não apresentar sintomas. Nos exames, já é detectada no dia da contaminação. Seria um procedimento de prevenção e esses testes são simples, sem complicação?.

Os exames são feitos a partir de uma coleta de sangue nos postos de saúde. O sangue vai para o laboratório, que faz uma pesquisa de anticorpos contra o protozoário Trypanosoma cruzi classe IgM (fase aguda). É feita uma triagem de amostras para cadastro no sistema. Separa-se o soro do sangue e o material é encaminhado para a imunologia, que usa uma técnica chamada imunofluorescência indireta. Essa técnica é para fazer uma pesquisa de anticorpos contra o protozoário. ?Quando o exame der positivo, o paciente é rechamado para proceder a novos exames. Como a cultura e biologia molecular do protozoário?, disse Soraia Reda Gilber, farmacêutica bioquímica da área de imunologia do Lacen.

Doença pode ter atingido 50 mil pessoas em SC

Florianópolis – A Secretaria de Saúde de Santa Catarina está trabalhando com a estimativa de que cerca de 50 mil pessoas podem ter contraído a doença de Chagas após consumirem caldo de cana em quiosques às margens da BR-101, entre os municípios de Piçarras e Itajaí. Por enquanto, a doença matou seis pessoas e há outras 30 notificações da doença.

?As secretarias municipais de saúde estão sendo mobilizadas para fazer o teste, a partir de segunda-feira. Estamos recebendo 40 mil kits do Ministério da Saúde?, disse ontem o diretor da Vigilância Epidemiológica do Estado, Luiz Antônio Silva. Segundo ele, no momento não existe estrutura suficiente para atender a demanda.

Silva disse também que não é possível determinar a quantidade de pessoas de outros estados que podem estar com a doença, pois o período em que foi servido o caldo de cana contaminado coincidiu com um grande movimento de turistas na BR-101. A recomendação é de que as pessoas que consumiram caldo de cana na região em fevereiro procurem com urgência o serviço de saúde de suas cidades se estiverem com febre, mal-estar, falta de apetite, inchaço nas pálpebras e distúrbios cardíacos.

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