Produtores de fumo reclamam de condições precárias

Depois de embates entre produtores e indústrias do fumo desde o fim do ano passado, o reajuste da safra 2008/2009 foi fixado em 13,1%. O pedido dos agricultores era de aumento de 25% a 28%. A decisão reforça a exploração e a má remuneração à produção familiar no Paraná. E mudanças nessa realidade, por enquanto, não passam de promessa e discurso político.

Do total de municípios da região Sul do Brasil, 65% são produtores de tabaco, segundo estimativas do governo federal. E, apesar dos crescentes lucros da indústria do tabaco – só em 2008 o lucro com exportações ficou em R$ 1,25 bilhão – só uma parte ínfima do dinheiro fica nos municípios produtores, que apresentam os menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH).

No Paraná, a produção das folhas de tabaco concentra-se na região centro-sul e os municípios líderes são Rio Azul (com 11,7 mil toneladas), São João do Triunfo (11 mil) e Palmeira (6,3 mil). Após o período de colheita, que acontece de novembro a março, é feita a classificação das folhas, processo que se estende até junho.

É com base nessa classificação que as folhas podem ser separadas em até 41 classes diferentes. Dessas, apenas oito têm um pagamento que fica acima do custo de produção, segundo o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Palmeira. A variação do quilo comercializado, segundo as classes, é de R$ 0,30 a R$ 7,07. “Um quilo de fumo custa de R$ 5 a R$ 6. O pouco do valor retirado de cada quilo faz toda a diferença no final para pagamento dos gastos e do que seria o lucro”, comenta Anderson Sviech, do sindicato de Palmeira.

Como a análise é feita pela própria empresa compradora, o preço é estabelecido por ela, o que é a principal reclamação dos agricultores. “O trabalho do ano todo é avaliado em menos de dez segundos, numa olhada rápida de um técnico da empresa”, lastima o produtor de Palmeira Evaldo Gross, 45 anos, que trabalha com o tabaco desde os cinco anos de idade.

Além do valor do produto comercializado, os trabalhadores chegam a pagar até 30% a mais nos insumos necessários, adquiridos por meio de contrato com a empresa, do que o preço praticado no mercado local. Outra reclamação é com o montante da dívida e os juros cobrados, que muitas vezes não são explicados ao agricultor. Em todos os processos que chegaram até o Ministério Público do Trabalho (MPT), foi verificado que, pelo preço médio e volume da produção entregue, as dívidas já estariam quitadas.

Em Mandirituba foram protocoladas 60 ações judiciais contra empresas do tabaco em 2008. O MPT também detectou redução de 30% a 40% dos estudantes no transporte escolar em período de safra, porque as crianças ajudam os pais no trabalho. Em Teixeira Soares e São João do Triunfo há registro de escolas que mudam o horário das aulas na época de secagem da folha.

A reportagem de O Estado tentou contato com a Souza Cruz, líder no mercado nacional de tabaco, para comentar a situação a que os trabalhadores são submetidos, assim como a remuneração paga a eles. Não houve qualquer resposta da empresa.

Pouco avanço em programas governamentais

Daniel Caron
Produtor Evaldo Gross: “Trabalho do ano todo é avaliado em apenas dez segundos”.

Não é de hoje que se discute a precariedade da situação dos trabalhadores que trabalham com a produção do fumo. Junto com essa discussão, crescem as promessas governamentais de apoio, aos trabalhadores e para oferecer alternativas à pratica desta atividade. Mas até agora, os projetos para tentar retirar os trabalhadores dessa situação tiveram pouco avanço. E, enquanto o fumo ainda for um dos mercados mais atraentes de produção, a previsão não é das melhores.

No papel, os programas de auxílio ao fumicultor são excelentes. Mas colocá-los em prática é um processo que caminha a passos bem mais lentos do que os próprios trabalhadores gostariam. Entre eles está o Programa Mais Alimentos, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), lançado em julho do ano passado, que prevê a diversificação da produção.

Os R$ 15 milhões previstos no orçamento chegaram a ser encaminhados para entidades como Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul (Fetraf-Sul), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e universidades para o desenvolvimento de pesquisas.

Mesmo assim, para a ideia deslanchar é imprescindível um suporte maior, conforme aponta o assessor técnico da Fetraf-Sul para a área do fumo, Albino Gewehr. “A maioria dos agricultores gostaria que o programa avançasse rápido, há vontade de diversificar, mas o projeto carece de um suporte maior. Uma opção seria investir em agentes rurais para capacitar os trabalhadores”, avalia.

Também em parceria com o MDA, o Instituto Os Guardiões da Natureza trabalha para oferecer aos produtores de tabaco novas fontes de renda atreladas ao comércio de alimento orgânico. A presidente do Instituto, Vânia Mara Moreira dos Santos, reconhece que não é um trabalho fácil.

“Todos querem sair da cultura do fumo, mas não conseguem por causa das dívidas. Um agricultor de Rebouças, por exemplo, começou com uma dívida de R$ 10 mil. Agora a dívida já inclui familiares, o montante subiu para R$ 147 mil e tudo o que eles têm está penhorado”, aponta.

Para Santos, falta eficácia nos programas estaduais e federais. “Existe muito enfeite, mas não políticas públicas sérias e eficientes. O governo diz que vai ajudar a diversificar a produção, mas atende um número restrito de agricultores”, conclui.

A denúncia sobre a participação de cerca de de 80 mil crianças no trabalho do fumo chegou à Comissão de Direitos Humanos do Senado no meio do ano passado. Mesmo com audiência pública para pedir esclarecimentos às autoridades responsáveis pela fiscalização do trabalho infantil no Estado, efetivamente, ainda não se percebem mudanças.

Voltar ao topo