Paraná está na rota dos aliciadores de escravos

No Dia da Consciência Negra, uma constatação péssima. O Paraná é um dos principais pontos de aliciamento para trabalho escravo do Brasil. A informação é da Comissão Pastoral da Terra, seção Paraná, com base em relatos das comissões presentes nos estados brasileiros.

Segundo o secretário-executivo da comissão no Paraná, Gélson Oliveira, não existe um levantamento que estipule quantos trabalhadores deixaram o Estado. Mas, segundo ele, paranaenses já foram encontrados trabalhando em regime de escravidão nas carvoarias de Mato Grosso do Sul, e em fazendas de Minas Gerais, São Paulo e Roraima. “São pessoas que saem principalmente da região Noroeste do Estado.”

As plantações paranaenses também atraem trabalhadores de outros estados, que acabam sendo usados como escravos. De acordo com números da CPT, em 1999, 1,5 mil pessoas vieram ao Paraná para trabalhar nas lavouras. “Veio gente de todo Nordeste, principalmente de Alagoas.”

O aliciamento de pessoas em locais distantes daqueles onde elas irão “trabalhar” não acontece por acaso. Segundo Gélson, um trabalhador paranaense que vai para Roraima, por exemplo, não tem contato ou referência. “Em sua cidade, ele conhece o padre, conhece o delegado, sabe como se defender. Já nas fazendas para onde são levados, os trabalhadores não sabem nem a localização.” O aliciamento começa com o “gato”, que é a pessoa que consegue a mão-de-obra a mando do proprietário da fazenda. Depois de iludidas pelo “gato”, as pessoas são levadas para as propriedades, acreditando que vão ganhar um determinado salário. Quando começam a trabalhar, no entanto, descobrem que a remuneração é bem inferior a prometida e que as condições de trabalho ficam abaixo da desejado. “Muitas vezes não existem abrigos. Os trabalhadores dormem onde dá.” Os proprietário também usam as contas nas “cantinas” das fazendas para confundir os trabalhadores. “A pessoa compra comida, material para trabalho, algumas peças de roupas. Tudo é anotado. Quando ela recebe o salário, já está devendo para o patrão”, explica Gélson.

Líder

O Estado líder em trabalho escravo é o Pará. Para a CPT, a impunidade é um dos principais motivos do trabalho escravo. “Existe um jogo de empurra entre as justiças federal e do trabalho. As primeira não quer assumir a causa e a outra não tem estrutura para julgar a questão.”

A dificuldade de fiscalização de grandes áreas territoriais também dificulta a punição dos fazendeiros e de grupos empresarias responsáveis pelo trabalho escravo. “Quem assumiu o papel de fiscalizador são os voluntários. Fiscais do trabalho e agentes da Polícia Federal, por iniciativa própria, atendem as denúncias de exploração.”

A solução para acabar com o quadro do trabalho escravo, de acordo com Gélson, é aumentar os efetivos da Polícia Federal, do Ibama e do Ministério Público do Trabalho. No ano passado, a CPT registrou 465 casos de trabalhadores escravos em 21 fazendas. Mas, de acordo com o Ministério do Trabalho, para cada trabalhador libertado, três continuam escravos.

Pesquisa do Dieese aponta disparidade

Mais uma pesquisa comprova a disparidade social entre negros, pardos e brancos no Brasil. Segundo estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), os negros são maioria entre os desempregados no país. Em São Paulo, a taxa de desemprego para os negros é 7,2 pontos percentuais acima da taxa para os não-negros.

E, apesar de corresponderem a 46% da população, o rendimento médio de negros e pardos que estão no mercado de trabalho é apenas metade do rendimento dos brancos. Na região Sudeste, maior mercado consumidor do País, o rendimento médio dos brancos correspondeu a 4,5 salários mínimos em 2001, contra 2,3 dos negros e 2,2 dos pardos.

Os dados fazem parte do estudo Desigualdade Racial no Mercado de Trabalho?, elaborado em convênio com o Seade e instituições governamentais de seis regiões do País, para marcar o Dia Nacional da Consciência Negra, que é celebrado hoje.

Em Salvador, por exemplo, em média, de cada cem negros na força de trabalho, 29 se encontravam desempregados nos primeiros seis meses de 2002, enquanto 19,9 dos não-negros estavam sem trabalho. Em relação à ocupação, o estudo mostra que a proporção de negros e pardos ocupados é maior nos ramos agrícola, construção civil e prestação de serviços. Nos serviços domésticos, enquanto a participação de brancos é de 6,3%, a de negros chega a 13,7% e a de pardos a 9,1%.

Livro mostra situação atual

Guilherme Voitch

O lançamento do livro Vidas Roubadas. A Escravidão moderna na Amazônia brasileira, da jornalista inglesa radicada no Brasil, Binka Le Breton, é o destaque da programação das comemorações do Dia da Consciência Negra. A obra será lançada hoje, às 19h, no Conservatório de Música Popular Brasileira de Curitiba, na Rua Mateus Leme, 66.

No livro, a jornalista dá um panorama da indústria do trabalho escravo que se instalou, principalmente nos estados do Norte, Centro-Oeste e Nordeste brasileiro. No período da tarde, o movimento negro promove um ato em homenagem a Zumbi dos Palmares, na Boca Maldita, no centro de Curitiba. O evento vai contar com panfletagem e apresentações musicais.

UFPR estuda cotas a negros

Guilherme Voitch

A Universidade Federal do Paraná (UFPR) pode adotar uma política de cotas para estudantes negros a partir de 2003 ou 2004. A informação é do presidente da Associação Cultural de Negritude e Ação Popular (ACNAP), Jaime Tadeu da Silva.

Segundo Jaime, as conversas com o reitor da UFPR, Carlos Moreira Júnior, iniciaram no começo do ano. “Ele se mostrou bem receptivo quanto a essa política de adoção de cotas para estudantes negros. Vamos conversar agora com o Conselho Universitário.” A assessoria de imprensa da universidade confirmou que já existem estudos para a adoção das costas. As universidades federais do Rio de Janeiro e da Bahia são algumas das instituições que adotam as cotas.

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