Mais rigor na fiscalização da terra

A partir deste ano, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) vai fiscalizar os imóveis rurais conforme a lei federal 8629/93, que define que toda propriedade tem que cumprir sua função social. Dentro desse conceito estão a utilização adequada dos recursos naturais, preservação do meio ambiente e bom andamento das relações de trabalho com funcionários. Antigamente, a discussão se uma área poderia ou não ser destinada para a reforma agrária era baseada apenas nos índices de produtividade. A propriedade considerada improdutiva poderia se tornar um assentamento.

O superintendente do Incra no Paraná, Nilton Bezerra Guedes, conta que a eficácia em obter terras pela improdutividade é de atualmente 5%. Isto porque o parâmetro utilizado para a avaliação tem como base o Centro Agropecuário de 1975. Desde então, a produtividade nos campos teve um grande acréscimo e o índice ficou ultrapassado. “Somente uma portaria conjunta já seria suficiente para mudar. Mas os ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário não chegaram a um acordo. O maior problema para obter áreas no Paraná é justamente este”, afirma.

Ambiente

Com a aplicação efetiva da lei, Guedes acredita que deve saltar de 5% para 50% a quantidade de propriedades que podem ser passíveis de desapropriação. A indicação das áreas que poderiam ser destinadas para a reforma agrária será baseada em ilícitos que ferem o cumprimento da legislação. Na parte ambiental, um dos principais problemas encontrados nas propriedades é a utilização da Área de Proteção Permanente (APP) para plantio, especialmente de cana-de-açúcar, eucalipto e soja, além de pastagem. O fato da propriedade não possuir a reserva legal (mínimo de 20% de mata preservada) também pode constituir um ilícito. Existem casos em que a reserva legal está averbada, mas na prática tudo foi desmatado. Na área trabalhista, o imóvel pode ir para desapropriação se forem encontrados trabalhadores em situação semelhante à escravidão.

Reação

Para o superintendente, a medida anunciada pelo Incra vai gerar uma forte reação. “Por isto sempre nos pautamos pela cautela e há fundamentação técnica e jurídica”, comenta Guedes. Ele explica que o direito à propriedade, previsto na Constituição Federal, será preservado. O proprietário cujo imóvel for indicado para desapropriação tem três instâncias de recursos dentro do Incra, além da Justiça.

Benefícios

Mais do que uma maior quantidade de áreas que podem ser revertidas em assentamentos, Guedes acredita que a fiscalização mais rígida vai trazer benefícios para o Estado. “O efeito maior é o irradiador, que a fiscalização da função social traz. Um exemplo disto é a produtividade do Paraná, que era baixa entre a década de 1980 e meados de 1990. Havia resistência dos produtores em adotar tecnologia e também muita sonegação. A partir da fiscalização do Incra, eles tiveram que se adequar para no mínimo serem produtivos. Isto provocou a organização e profissionalização do meio rural. Na época, 70% das áreas eram consideradas improdutivas”, declara.

Agricultores mostram preocupação com medidas

A Federação da Agricultura do Estado do Paraná (Faep) considerou absurda a medida anunciada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O coordenador da comissão de política fundiária da entidade, Tarcisio Barbosa Souza, afirma que a atitude do órgão federal vai causar uma falsa expectat,iva nas famílias sem terra. Isto culminará em invasões e aumento dos acampamentos em beiras de rodovias, de acordo com ele. “Nosso Estado é altamente produtivo. É irresponsabilidade querer buscar terra a qualquer custo. É uma irresponsabilidade gerar uma falsa expectativa. Já tivemos experiências não muito boas anteriormente”, avalia.

Souza espera que o direito à propriedade seja preservado e que o governo não seja conivente com as invasões. “Também esperamos que o governador Beto Richa cumpra o que disse na posse, de manter a ordem e cumprir a lei. Já temos um grande problema com áreas invadidas, todas com reintegração de posse concedida, mas que o governo anterior não cumpriu. Queremos que as reintegrações sejam cumpridas imediatamente. Invasão é crime”, ressalta.

A reportagem tentou, por três dias, localizar os coordenadores do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Paraná para comentar o assunto, mas nenhum deles atendeu aos telefonemas até o fechamento desta matéria.