Comunicar o óbito vira tabu

Uma sondagem feita por pesquisadores da Faculdade de Ciências Médicas, da Santa Casa de São Paulo, e da Universidade Federal de São Paulo mostrou que muitos médicos têm dificuldade de comunicar o óbito de pacientes aos seus familiares. As situações apontadas como mais difíceis de serem conversadas são casos de pacientes jovens (43,4%), morte por quadro agudo (56,6%) e quando a família não entende o caso (17%).

O principal problema apontado pelos profissionais é a falta de preparação do médico, ao longo da sua formação, para lidar com a morte. Segundo a pesquisa, apenas 18,9% dos médicos entrevistados consideraram a formação acadêmica adequada, e somente 7,5% dos profissionais dizem não enfrentar dificuldades ao comunicar um óbito. Os médicos ouvidos alegam que na faculdade existe pouca abordagem do tema, e eles acabam aprendendo  como lidar com o assunto na prática ou observando outros colegas de trabalho.

O diretor do curso de Medicina e professor titular da cadeira de Cardiologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Emilton Lima Júnior, diz que essa situação é muito complexa, porque ao longo da sua carreira o médico é treinado para promover a vida, e quando isso não acontece, sofre uma grande decepção. "O médico também é um ser humano, e em muitos casos se coloca no lugar da família e acaba se envolvendo com a situação", disse. Lima conta que alguns colegas tiveram problemas de depressão ou se tornaram inseguros após a perda de um paciente. "Também sei de casos de abandono da profissão", completou.

Psicólogo

A novas tecnologias na área médica acabam tornando o profissional cada vez mais técnico, diz o diretor, e por isso a preocupação com uma formação mais humanista acaba ficando em segundo plano. Para Lima, a orientação psicológica deveria ser rotina nos hospitais, principalmente para os que  trabalham em locais com Unidades de Terapia Intensiva (UTI) ou atendimentos de urgência e emergência, como o Siate (Sistema Integrado de Atendimento ao Trauma). A Associação Americana de Cardiologia orienta que após uma situação de parada cardíaca, todos os profissionais envolvidos com o atendimento deveriam participar de uma reunião de grupo para discutir o assunto. "Porém isso não acontece", falou. O diretor da PUCPR diz que a pesquisa de São Paulo serve para mostrar uma realidade da área, e como os cursos de formação são falhos nesse sentido.

A professora e psicoterapeuta Renate Vicente, constatou que essa dificuldade é cada vez menor entre os profissionais mais jovens. "Parece que eles estão menos sensíveis", falou. O grande problema quando há dificuldades, diz Renate, é que o médico se identifica em um papel de salvador – a própria população contribui para isso -, e quando perde um paciente se vê em uma situação complexa. Outro problema citado pela psicoterapeuta é falta de humanização nos hospitais. "Tudo que se precisa nessa hora – da perda – é o bom e velho calor humano", falou.

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