Aquecimento global triplica escassez de água

Hoje é comemorado o Dia Mundial da Água. A gestão dos recursos hídricos é uma preocupação em todos os países. A cada dia que passa, a poluição, o assoreamento e a destruição de nascentes estão diminuindo a quantidade que está disponível. Isso preocupa muito porque a população e a cadeia produtiva estão aumentado cada vez mais. Mas existe uma esperança. Graças à Lei das Águas (9.433/97), que completa 10 anos este mês, o País começa a adotar medidas práticas para preservar as bacias hidrográficas. No Paraná, o primeiro plano de manejo de bacia deve ficar pronto em julho.  

Para o coordenador de Recursos Hídricos da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Mauri César Barbosa, o Brasil vem avançando muito em relação à questão do uso da água. ?O País não criou apenas uma política, mas todo um sistema para implementá-la?, explica. A Lei das Águas e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Singreh) está completando 10 anos. Até agora, a maioria dos estados usou esse tempo para criar mecanismos que vão fazer a gestão da água. Com a lei, foi criada uma série de organismos que incluem, além do poder público, a participação da sociedade.

O País ganhou um conselho nacional e os estados conselhos estaduais, que estabelecem normas e diretrizes, além de serem órgãos consultivos e deliberativos. As unidades da federação também passaram a contar com os comitês de bacias, que serão os responsáveis pela elaboração de um conjunto de ações que serão implementadas no âmbito estadual e são as agências de bacia que vão colocá-las em prática.

Em princípio, o Paraná deve ter onze comitês de bacia. Quatro deles já estão funcionando: o do Alto Iguaçu e Alto Ribeira, do Rio Tibagi, do Rio Jordão e do Paraná 3. Esses comitês já começaram a pôr a mão na massa e estão elaborando os planos de bacia, que contêm um diagnóstico da situação, propõem estratégias para recuperar o que foi degradado e institui o uso racional.

O plano da bacia do Alto Iguaçu e Alto Ribeira é um dos mais adiantados. Deve ficar pronto em julho. O presidente do comitê, Péricles Salazar, diz que foi contratada uma empresa especializada para fazer o estudo, que começou a ser elaborado há quatro meses. É através do plano que será instituído, entre outras ações, a cobrança pelo uso da água. Os grandes consumidores, como Sanepar e indústrias, vão ter que tirar a mão do bolso, bem como as empresas que lançam efluentes nos rios. O dinheiro recolhido será revertido em ações em prol da bacia. ?O plano de bacia é a maior ferramenta criada nos últimos 20 anos. Não se preocupa apenas com a água, mas com o solo e a biodiversidade?, comenta Barbosa.

Péricles também é diretor da Federação das Indústrias do Paraná e diz que a indústria, segunda maior consumidora no Estado, precisa fazer a sua parte. ?A água precisa ser preservada. A água é vida. É um insumo de extrema relevância?, explica.

O plano da bacia do Rio Tibagi deve ficar pronto em setembro e o do Paraná 3 começa a ser elaborado hoje, Dia Mundial da Água, tendo a participação da Usina Hidrelétrica Itaipu Binacional.

Segundo Barbosa, o Estado também já está discutindo a implantação de outros comitês: o da bacia do Rio Pirapó e do Paranapanema 3 e 4. Para ele, o Paraná vem avançando muito na questão do uso da água. Ele explica que os comitês que já estão em ação cobrem as regiões onde vive 50% da população do Estado, locais onde a poluição é maior.

Segundo Barbosa, também não existem grandes conflitos pelo uso da água no Paraná, como em outras regiões. A disponibilidade dos recursos hídricos ainda consegue suprir a demanda. Por outro lado, diz que a situação não deixa de preocupar se forem levadas em conta a erosão e a pouca cobertura vegetal do Estado. Nos Rios Piquiri e Ivaí, por exemplo, o grande problema não é o consumo, mas o assoreamento. ?Ainda há tempo para se fazer uma boa gestão?, avalia. Este ano, além dos planos individuais de bacia, o Paraná também vai ganhar o Plano Estadual de Bacias.

Relatório da ANA apresenta realidade brasileira

A Agência Nacional de Águas (ANA) lançou no início deste mês o relatório Geo Brasil Recursos Hídricos, que inclui um diagnóstico da realidade brasileira. De acordo com o documento, o Brasil possui 12% de toda a água doce do mundo. O problema é que ela está mal distribuída. Desse total, 74% estão na Amazônia, região que é habitada por menos de 5% dos brasileiros.

A poluição é um dos maiores problemas que o País enfrenta. Hoje, pouco mais da metade (54%) dos domicílios brasileiros contam com o serviço de coleta de esgoto. As regiões com maiores coberturas – Paraná e Sudeste – não alcançam o índice de 70%; no outro extremo, a região do Parnaíba conta com 4% de coleta de esgoto.

O setor que mais consome água no País é a agricultura, com cerca de 60% do total. O uso doméstico e o setor comercial consomem cerca de 20%, e o setor industrial é responsável por outros 15% do consumo. Os 5% restantes têm outras destinações. No entanto, no Paraná, o maior consumidor é a Sanepar e em segundo lugar vem a indústria.

O relatório mostra ainda que todos esses consumidores tendem a usar a água de modo abusivo. Isto ocorre por vários motivos, que vão de problemas na irrigação à não-adoção de tecnologias mais avançadas nas indústrias, passando pelos banhos demorados e o abuso no consumo doméstico. Somente o reaproveitamento da água resultante das lavagens e banho para a descarga de latrinas resultaria numa economia de um terço de todo o consumo doméstico.

Fonte – Agência Nacional de Águas (ANA) – Relatório Geo Brasil Recursos Hídricos.

Esgoto é um dos principais inimigos

Foto: Chuniti Kawamura

Maria Arlete Rosa: ?Reservatório está sendo construído?.

A Sanepar é a maior consumidora de água no Estado. Segundo a diretora de Meio Ambiente e Ação Social da companhia, Maria Arlete Rosa, o esgoto é um dos principais inimigos do sistema de abastecimento público nas grandes cidades. Em Curitiba e Região Metropolitana, existem 299 mananciais e uma boa parte recebe dejetos domésticos e industriais. O plano de bacia do Alto Iguaçu está fazendo um levantamento da cobertura de esgoto nessas regiões para ampliá-la.

Maria Arlete fala que o esgoto é um dos maiores vilões quando o assunto é a poluição dos rios. Além do esgoto doméstico, tem o industrial, que apesar de a legislação obrigar que seja tratado antes de ir para o meio ambiente, é jogado em córregos e rios de forma bruta. Na semana passada, por exemplo, uma mancha de óleo atingiu os Rios Belém e Iguaçu, em Curitiba.

Para diminuir a quantidade de esgoto doméstico lançado nos rios, a Sanepar tem como meta cobrir com rede coletora de esgoto em 100% as regiões de mananciais. O plano de bacia do Alto Iguaçu, que está sendo elaborado pelo comitê de bacia, vai apresentar um diagnóstico sobre esta situação e nortear os trabalhos.

O projeto também vai estabelecer a cobrança pelo uso da água. Maria Arlete acha a medida positiva, pois vai direcionar os recursos para a bacia. Além de ampliar a rede coletora de esgoto, também deve ser melhorada a estrutura para fiscalizar as empresas. No entanto, ela explica que ainda não ficou definido se o consumidor final da Sanepar também vai ter que ajudar a pagar essa conta. Quem vai definir será o comitê de bacia, que reúne entidades públicas e privadas.

No ano que vem, Curitiba vai ganhar mais uma barragem, a Piraquara 2. Hoje, três delas abastecem a região – Iraí, Passaúna e Piraquara 1. ?O reservatório está sendo construído para que não tenhamos problemas futuros?, avalia.

Interior

Se nos grandes centros é o esgoto o grande problema, no interior do Estado há vários fatores, como o assoreamento dos rios e o agrotóxico. Na barragem dos Alagados, em Ponta Grossa, por exemplo, há o despejo de dejetos oriundos da suinocultura e da mineração. Em outras regiões é a falta de disponibilidade de água que preocupa. Em Jandaia do Sul, o rio que abastece a cidade apresenta pouco volume de água. O motivo disto foi a plantação de cana-de-açúcar e de eucalipto na região.

População pode e deve colaborar

Foto: Átila Alberti

Rio poluído na capital.

Mas não são somente as empresas e o poder público que podem fazer alguma coisa para racionalizar o uso da água. O consultor em meio ambiente Paulo Costa diz que em casa a população pode colaborar. Ele explica que os arejadores de vazão colocados na torneira diminuem pela metade o gasto com a água. Em um minuto de torneira aberta são gastos em média 12 litros, mas o consumo pode cair para 6. No chuveiro podem ser colocados os restritores. Os que possuem coluna de água quente e fria gastam em média de 30 a 60 litros por minuto, mas com o uso do dispositivo, isto cai para 14. Os dois mecanismos vão reduzir pela metade o consumo e não custam caro, em média R$ 45.

O vaso sanitário também gasta muita água e sozinho pode ser responsável por até 50% do consumo de uma casa. Por isso, a dica importante é usar reservatórios de apenas seis litros para fazer a descarga, metade do que se gasta com os comuns. ?Esses são os três principais consumidores de água em uma casa. Se a população adotar todas essas medidas o consumo diário cai pela metade?, avalia Costa.

Assunto deve ser tratado com muita consciência

Foto: Aliocha Maurício

José Luiz, da Suderhsa.

Para o diretor operacional de água da Superintendência de Recursos Hídricos e Saneamento Ambiental (Suderhsa), José Luiz Scroccaro, a questão da água é sempre preocupante porque se trata de um bem finito e público. Ele explica que a quantidade de água é sempre a mesma, não aumenta ou diminui. O problema é que boa parte não pode ser utilizada devido à poluição dos rios e, por outro lado, a população vem aumentando cada vez mais, fazendo com que o consumo cresca a cada ano. A gestão dos recursos hídricos vem para tentar equacionar este problema.

Segundo ele, hoje o lançamento de esgoto sem tratamento e a sujeira difusa das cidades (o lixo das ruas que é levado para dentro dos rios com a água da chuva) estão entre os maiores problemas. Boa parte dos rios que cortam os grandes centros do País estão totalmente poluídos. Em Curitiba, os Rios Barigüi, Belém, Água Verde e Atuba são exemplos. Para Scroccaro, a solução deste problema pode estar na execução dos planos de bacia.

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