Orçamento e chantagem

O Congresso aprovou o Orçamento da União para 2006. Houve negociações com cheiro de chantagem, pois a oposição, que atrasou por quase cinco meses a votação da Lei de Meios, queria impedir o uso eleitoreiro dos recursos públicos pelo governo que tem o presidente Lula como candidato à reeleição. De outro lado, exigia que o Executivo cumprisse determinações da Lei Kandir, que manda indenizar os estados prejudicados pelas isenções fiscais nas exportações. O governo entesourou esse dinheiro, provocando uma romaria de governadores a Brasília, de onde voltavam de mãos abanando.

A última pedra no caminho do Orçamento, além do temor de que Lula e seu governo usem os recursos públicos para fazer campanha política, era o caso de Sergipe. O Executivo negava dinheiro àquele estado nordestino com razão, pois há três anos ele não cumpre a Lei de Responsabilidade Fiscal, um legado do governo FHC, que, não importa que opinião se tenha do governo passado, se há de reconhecer que é moralizador na medida em que dá responsabilidades com penas coercitivas aos governadores e demais administradores que gerem mal recursos públicos.

Houve chantagem, também, de parte do governo, quando ameaçou aprovar o Orçamento via medidas provisórias, um discutível instrumento que cheira a ditadura, pois permite ao Poder Executivo governar dispensando o Congresso Nacional. Isso significa dispensar as legítimas decisões do povo, por seus representantes.

Agora surgem novas investidas ditatoriais, a mais espantosa a de fazer com que volte o decurso de prazo. Já funcionou na ditadura militar. Se o governo manda um projeto de lei ao Congresso, que pode ser a própria proposta orçamentária, este terá de aprovar ou rejeitar dentro de determinado prazo. Se não o fizer, entende-se como aprovado e ponto final. Haverá oposição legislativa. A opinião pública, por sua vez, deverá ser esclarecida para que se levante contra esse retrocesso ditatorial.

O Orçamento aprovado prevê investimentos da ordem de R$ 21,2 bilhões, valor 49% maior do que o previsto no projeto original do governo, que destinava R$ 14,3 bilhões para essa finalidade. A maior parte do dinheiro será destinada para infra-estrutura urbana e de turismo e saúde. Receitas foram reestimadas para aumentar o volume de recursos, o que também possibilitou o aumento do salário mínimo para R$ 350,00. Para compensações aos estados das perdas da Lei Kandir, foram previstos R$ 3,9 bilhões.

Embora sobejem razões para o atraso na apreciação do Orçamento e seja inegável que um país não pode atravessar todo um exercício financeiro sem Lei de Meios, é evidente que os recursos públicos vão servir este ano para a campanha eleitoral do candidato à reeleição. As forças situacionistas no Senado conseguiram amainar a nova legislação eleitoral, composta de alguns remendos, até que se decida afinal votar a matéria com modificações profundas e definitivas. Foi retirada do projeto a obrigação de divulgar amiúde as verbas para campanha, inclusive as arrecadadas de terceiros ou via caixa 2. Na prática, caixa 2 passou a ser legal. A esperança é que a Justiça Eleitoral decida que a nova lei, tão leniente, não seja aplicável no pleito de outubro próximo, o que nos dá esperança de uma eleição um pouco mais higiênica.

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