O Velho e o Mar

Os atuais chefes de Estado têm diferentes estilos de oratória. Fidel Castro, por exemplo, apresenta um tom professoral e seus discursos caracterizam-se pela duração. Fala quatro, cinco ou até seis horas, ininterruptamente. Não deixa a tribuna nem para fazer xixi. Bush é arrogante. Arrogante e burro, se é que o chefe de Estado do mais poderoso país do mundo pode ser burro. Já o nosso presidente Lula é um orador impecável. Inspira confiança e honestidade, falando a linguagem que o povo entende, sem chegar a complicadas formulações, que retirariam seu discurso do alcance das massas. Usa, com maestria, as metáforas. Cristo as usava para se fazer entender pelas massas e elas o seguiam.

Falando na cerimônia de lançamento das conferências nacionais de Agricultura e Pesca, o presidente Lula ganhou mais alguns fãs ao dizer que “as coisas são muito mais difíceis do que imaginava”. E acrescentou: “Se eu tivesse que fazer uma imagem sobre a pesca no Brasil e sobre a vida dos pescadores, a imagem, para mim, seria a imagem da paciência”. Não se referia somente à política de incentivo à pesca, mas às dificuldades de governar. E quando falou em paciência, tomando uma figura ligada à pesca, o pescador à espreita, às vezes por horas, para conseguir um peixe, também estendia a imagem a todo o processo que um chefe de nação precisa desenvolver para que alcance os seus objetivos.

Paciência, perseverança e consciência de que as coisas não são fáceis.

Para falar em paciência, o presidente usou a obra O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway, um livro que relata a luta de um velho pescador solitário, em seu barco, que depois de pescar um gigantesco peixe, teve de arrastá-lo por longo tempo, amarrado à sua embarcação, sem poder içá-lo. E lutar com ele num duelo de vida e morte, sem desistir mesmo quando lhe faltavam as forças, até chegar ao seu porto de destino. Chegar vitorioso, o peixe vencido, mas apenas em esqueleto, pois na travessia predadores o haviam destruído. Foi a perseverança e a vitória, fruto da paciência. Vitória sem outro troféu que os ossos do peixe morto.

Como se sabe, o escritor norte-americano Ernest Hemingway foi jornalista, caçador, envolveu-se em várias e justas guerras e inúmeras aventuras. Em Cuba, no bairro Habana Vieja, há um famoso bar que costumava freqüentar e no qual há uma placa comemorativa da passagem do famoso escritor americano, Prêmio Nobel de Literatura. Hemingway suicidou-se, dizem que quando sentiu-se velho e impossibilitado de continuar sendo um homem de ação.

A invocação, por Lula, do romance O Velho e o Mar, traz dupla lição. A lição da paciência, que o presidente brasileiro bem captou e transmitiu, incorporando-a às figuras de retórica que caracterizam seus discursos e a da paciência e perseverança sem resultados práticos, objetivos, que parece não haver percebido. Insiste Lula em políticas, notadamente na área econômico-financeira, que vêm acumulando críticas e adversários, inclusive no próprio PT e nas forças aliadas. Enquanto isso, a carne do peixe, no caso a estrutura produtiva do País, vem fenecendo, sendo carcomida pelos juros elevados e pelo desemprego. É preciso paciência, mas há um tempo para esperar e outro para agir. Agir, antes que sua política de aperto financeiro venha a estrangular o desenvolvimento do Brasil.

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