O dinheiro dos marajás

O funcionalismo público está em greve. Luta contra a reforma da Previdência, em especial de pontos nela inseridos que julgam prejudiciais às suas carreiras e às suas aposentadorias e às pensões de seus dependentes. São contra a taxação dos inativos, o aumento de idade para aposentar-se, a redução das pensões das viúvas e dependentes e a fixação de tetos e sub-tetos salariais, que, à guisa de acabar com privilégios, fazem com que nos Estados carreiras como a da magistratura passem a receber menores remunerações que os membros da Justiça Federal.

Os magistrados ameaçam greve, mesmo contra a posição dos presidentes dos tribunais superiores. Entendem que as prerrogativas da classe podem ser defendidas sem o recurso extremo, de certa forma inusitado e injustificável, da paralisação. Se são membros de uma carreira de Estado, não podem entrar em greve. Se são funcionários públicos, podem. E aí há uma incongruência no tratamento que estão recebendo dos poderes Executivo e Legislativo na reforma da Previdência. Esses poderes dizem que são funcionários públicos como os demais, mas lhes negam o direito à greve.

Há de parte do executivo e do legislativo a preocupação de conquistar a opinião pública, voltando-a contra os funcionários grevistas. O próprio Lula já discursou condenando aqueles que, ganhando R$ 17 mil, 20 mil, 30 mil ou 50 mil, acham pouco e estão entrando em greve. E no Congresso fala-se em CPI para investigar o Judiciário, quando este Poder já propôs CPI para investigar tanto o Judiciário, quanto o Executivo e o Legislativo. Há muita sujeira exposta ou empurrada por debaixo dos tapetes nos três Poderes. É verdade que existem funcionários privilegiados, ganhando vencimentos e aposentadorias absurdas. Seus ganhos, se cotejados com os que recebem trabalhadores da iniciativa privada, contribuintes do INSS, causam espanto e revolta. É fácil, portanto, voltar a opinião pública contra esses marajás. Mas é errado fazer crer que todos os funcionários públicos, notadamente os federais em greve cada vez mais acirrada, são marajás. Seus salários são baixíssimos e há quase uma década não têm reajustes. Os privilegiados, de absurdos salários e aposentadorias, são uma minoria e justifica-se qualquer ação legal para acabar com suas mamatas. Ganham muito, mas são poucos e se seus ganhos forem distribuídos aos trabalhadores, inclusive funcionários públicos, mal remunerados, em nada melhora a situação da maioria.

Isso lembra fato ocorrido no período da Constituinte de 46. Na época, um deputado federal paulista era muito rico, mas se declarava comunista. Por isso, era alvo de muitas críticas de seus opositores, que o desafiavam a distribuir as suas fortunas para a pobre população brasileira. Certa vez, diante de mais um desses desafios, o deputado comunista milionário decidiu responder de forma contundente ao seu desafiante. Disse algo como: “É verdade que sou muito rico. Minha fortuna é calculada em cerca de 60 milhões de cruzeiros. A população brasileira é de cerca de 60 milhões de habitantes. Assim, dividindo minha fortuna dá mais um cruzeiro para cada um”. E pondo a mão no bolso, o deputado milionário comunista tirou uma nota de um cruzeiro, estendeu-a ao deputado desafiante e disse: “Toma aí o seu cruzeiro e vê se não me enche mais o saco!”.

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