O dano moral no direito de família

A Constituição Federal Brasileira garante o direito à reparação por danos morais, desde que configurados três elementos: o ato ilícito ou culposo por parte de uma pessoa, o dano sofrido por outra pessoa e o nexo causal entre a conduta culposa e o dano experimentado. Configurados estes elementos, tem-se o direito à reparação por dano moral.

Os tribunais brasileiros estão cada vez mais repletos de demandas onde se pleiteiam danos morais, como pedido principal ou como pedido cumulado, juntamente com indenizações de outra natureza, como por exemplo, por danos materiais, lucros cessantes, etc. De fato, as demandas em que se buscam indenizações por danos morais existem sob os mais diversos argumentos. São tão populares e numerosas que alguns doutrinadores receiam estarmos diante do que muitos denominam de a ?indústria do dano moral?, ou seja, a banalização de um importante instituto garantidor da incolumidade psicológica dos cidadãos brasileiros.

No direito de família, os pedidos de indenização por danos morais vêm ganhando terreno e proliferando-se, também sob diferentes fundamentos. Não se trata de praxe do direito de família; pelo contrário, hoje em dia ainda é possível dizer que o número de pedidos de indenização por danos morais em matéria de família é pequeno, se comparado com os demais ramos do direito civil.

Mas onde se configura o dano moral dentro das relações tuteladas pelo direito de família? Para respondermos a esta pergunta, primeiro convém analisar o próprio instituto em si. A reparação por dano moral visa atender ao tipo de dano que não pode ser facilmente mensurado pecuniariamente: não há prejuízo patrimonial à vítima do dano moral, o prejuízo é unicamente psicológico. Tem fundamento o dano moral na ofensa à honra da pessoa humana, na agressão ao bom nome e reputação que cada cidadão possui, decorrente de situação ou alegação de tal gravidade que é capaz de gerar um constrangimento traumatizante. Este constrangimento, por sua vez, deve decorrer diretamente de uma conduta ilícita ou culposa por parte de outra pessoa, é o que se denomina de nexo causal entre conduta e dano, elo capaz de ligar causador à vítima do dano.

A reparação por dano moral não visa repor o prejuízo, isto porque, conforme já referido, não se trata de prejuízo material; a vítima não ?perdeu? nada, nem teve subtraído de sua propriedade qualquer bem ou valor, tratando-se de prejuízo eminentemente extrapatrimonial. A intenção da reparação por danos morais possui dupla finalidade. De um lado, visa prevenir a reiteração da conduta que causou o dano pelo agente e servir de exemplo para as demais pessoas, enquanto punição, pois a indenização em geral envolve o pagamento de quantia em dinheiro. De outro lado, a reparação por dano moral visa compensar a vítima pelo desgosto sofrido com uma quantia razoável em dinheiro (na maioria das vezes) que será capaz de lhe proporcionar alegria em reparação pelo que passou. Daí porque o valor da indenização por danos morais é sempre arbitrado pelo juiz em cada caso, não pode ser tabelado ou pré-estabelecido, mas deve ser calculado levando-se em consideração a gravidade do dano, o grau de culpa, a possibilidade econômica do ofendido e a possibilidade econômica do ofensor.

Voltando para o direito de família, em que hipóteses se configuraria, então, o dano moral? Uma das situações mais comumente citadas seria a de frustração do casamento ou da promessa de casamento. Quando o casal está noivo, planeja a cerimônia do casamento, convida parentes e amigos, escolhe e comunica os padrinhos, reserva local da festa, serviço de buffet, banda, enfim, realiza, juntos e sem qualquer problema aparente, toda a estruturação da festa. Mas quando chega a apenas alguns dias (ou no dia anterior), um dos noivos decide cancelar o casamento. Neste caso, haveria que se falar em danos morais, pela frustração causada pela expectativa do casamento? Como já dissemos, depende da análise individual de cada caso, de cada um dos personagens envolvidos e da situação em si.

E no casamento em que um dos cônjuges se recusa a cumprir com os deveres matrimoniais como fidelidade, coabitação ou a manutenção de relações sexuais? Haveria aí a possibilidade de indenização para o outro cônjuge que teve uma expectativa diferente do que viria a ser o casamento? E no caso específico da infidelidade, se um dos cônjuges descobre que o outro possui um relacionamento extraconjugal, é caso de indenização por danos morais? Como já dissemos, a resposta depende da análise individual de cada caso e de cada um dos personagens envolvidos e da situação em si.

Tem-se falado e noticiado em revistas e jornais sobre casos em que filhos ?abandonados? têm obtido êxito em alcançar reparação por danos morais em decorrência desta negligência dos pais em acompanhar e participar de seu desenvolvimento e crescimento, de dar carinho e amor e, muitas vezes, até mesmo por recusar-se a reconhecer a filiação ou o pagamento de pensão alimentícia ao próprio filho. Porém, o ponto comum entre estas demandas é que se tratam de casos extremos de negligência, em que o dano psicológico é bastante fácil de ser detectado, de modo que nos parece seguro dizer que, acertadamente, nossos Tribunais vêm tratando estas questões com a devida razoabilidade que deve permear as relações familiares. Ainda bem!

Rafael Nogueira da Gama é advogado, especializado em Direito Processual Civil e Direito do Seguro. Membro do Instituto de Direito de Família.

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