O Contrato de experiência reinterpretado

(conforme o Novo Código Civil brasileiro)

É intuitiva – independendo de qualquer conceito jurídico -, a noção de que o contrato de experiência é o instrumento utilizado por empregado e empregador para uma avaliação recíproca das condições de trabalho e das aptidões do trabalhador. Com efeito. O contrato de experiência tem uma função peculiar, que é permitir que o empregador avalie as aptidões do empregado, e, enquanto este, verifica a conveniência das condições de trabalho. Ou seja, durante determinado lapso de tempo (no máximo por 90 dias), embora o contrato de trabalho gere todos os efeitos, como qualquer outro (anotação da CTPS, direito a salário, obrigação de trabalho, férias, décimo terceiro salário, etc.), sua continuação dependerá de determinado evento Å aptidão do empregado para a função; conveniência das condições de trabalho Å futuro e incerto. Ao final da experiência, se estiverem ambos satisfeitos, o contrato de trabalho prossegue, sem qualquer solução de continuidade. Caso contrário, o contrato pode ser extinto sem os ônus da rescisão sem justa causa, em especial, aviso prévio e a multa de 40% do FGTS.

Prevalece, contudo, no Direito do Trabalho brasileiro, em face do disposto no § 2.º do art. 443 da CLT, a concepção de que o contrato de experiência é meramente um contrato por prazo determinado. Assim, dentro desta concepção, ao final do prazo, pode, qualquer uma das partes, rescindir o contrato, sem ônus de uma rescisão sem justa causa, e, principalmente, sem o dever de comunicar à outra o resultado da experiência (negativo ou positivo): se o trabalhador está apto para desenvolver corretamente as atribuições da função, ou, senão, porque razões; e se as condições de trabalho propostas ao trabalhador impedem ou não a continuidade do contrato de trabalho.

O art. 422 do Código Civil de 2002 lançou nova luz sobre o contrato de experiência, na medida em que impõe às partes que guardem, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, o princípio da boa-fé objetiva.

Observe-se, de início, que na há incompatibilidade entre o princípio da boa-fé e os princípios fundamentais do Direito do Trabalho, de modo que não há óbice à aplicação do art. 422 referido à disciplina do contrato de experiência (CLT, art. 8.º).

Um dos elementos que formam o núcleo conceitual do princípio da boa-fé é a confiança. A confiança exprime a situação em que uma pessoa passa a acreditar de forma contundente na realização de certo acontecimento. Assim, quando uma das partes contratantes gera na outra a confiança acerca da realização de um determinado acontecimento, e, se, deslealmente, frustra-o, viola o princípio da boa-fé objetiva.

Trazendo esta idéia ao contrato de experiência, tem-se que o empregador, ao celebrar com o empregado um contrato de experiência, suscita neste a confiança de que se desenvolver corretamente as atribuições da função correspondente será contratado de forma definitiva após o término da experiência.

O empregador que ao final da experiência simplesmente considera extinto o contrato de trabalho, sem motivo, ou seja, sem que o empregado tenha se mostrado inapto à respectiva função, viola a confiança depositada no trabalhador, e, conseqüentemente, o princípio da boa-fé, como também a própria dignidade do trabalhador de saber a razão pela qual seu trabalho não foi considerado apto para aquela determinada função.

Desse modo, o empregador, ao término da experiência, deve necessariamente indicar as razões pelas quais o empregado não se mostrou apto para a função, pois, desse modo, estará correspondendo à confiança que despertara no empregado quando da contratação. Do contrário, deve ser considerado o contrato como por tempo indeterminado, com direito às verbas de rescisão correspondentes, sem prejuízo de indenização pela confiança violada.

A recíproca igualmente é verdadeira, embora rara, no sentido de que o empregado que não indicar as inconveniências do trabalho, no prazo da experiência, deverá sofrer os descontos das verbas de rescisão, se o aviso prévio não for cumprido, sem prejuízo da indenização pela confiança frustrada.

Vê-se, desse modo, a importância do art. 422 do Código Civil de 2002 para o Direito Individual do Trabalho, em especial, para a disciplina do contrato de experiência.

Eduardo Milléo Baracat

é coordenador adjunto da especialização em Direito do Trabalho das Faculdades Integradas Curitiba.

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