Filhos ao alcance de todas

Chris Beller

 Foto: Aliocha Maurício/Tribuna

Devanilda com Eduarda, Felipe e Fernanda.

Está cada vez mais fácil ser mãe. Desde o primeiro bebê de proveta, em 1978, os métodos de reprodução assistida foram aperfeiçoados e se popularizaram. Estima-se que tenham nascido em todo o mundo mais de 1 milhão de crianças geradas por fertilização in vitro, FIV, (quando os óvulos são fecundados em laboratório).

Os procedimentos deixaram de ser invasivos e as taxas de sucesso aumentaram de forma significativa. Dos 15%, em média, quando surgiu o tratamento, as chances de engravidar com a fertilização in vitro chegam hoje a 50% para mulheres abaixo de 35 anos. As mais velhas têm opção de engravidar com óvulos doados por mulheres mais jovens.

?Quanto maior a idade, menor a chance de engravidar. Acima de 38 anos a chance cai para 40%, acima de 42 cai para 20% e acima de 45 cai para 5%. Usando óvulos de mulheres mais jovens a gente aumenta a chance de gravidez dessa mulher que adiou a maternidade, mas não desistiu de ser mãe?, explica o médico especialista em reprodução humana, Alessandro Schüffner.

Mesmo sendo comum entre os laboratórios especializados esse procedimento ainda é caro, varia de R$ 8 mil a R$ 12 mil por tentativa e só está disponível nas clínicas particulares de Curitiba, mas a boa notícia é que as doadoras estão sendo escolhidas não só pelo perfil físico, mas também pelo desejo de ser mãe. E assim até quem não teria dinheiro para fazer todo o tratamento está sendo beneficiada.

A secretária Bianca de Andrade foi uma delas. Ela não conseguia engravidar por causa de um problema nas trompas, mas é jovem, tem 28 anos, e foi doadora de óvulos. Em troca, teve seu tratamento de fertilização in vitro custeado.

Há três meses ela não dorme direito, anda fazendo refeições em pé e não tem tempo para si. Desde que os gêmeos Pietra e Enzo nasceram, ela está sempre ocupada, mas não tira o sorriso do rosto.

?Sabe o que é chorar todo dia durante dois anos? Eu queria muito essas crianças. Graças a esse sistema de doação eu vou ganhar o meu primeiro Dia das Mães e isso é lindo. Eu espero, de coração, que os meus óvulos ajudem outras mulheres a realizar esse sonho?, resume a moça, que até um ano atrás evitava festas de criança e chorava escondido do marido.

O dia das mães também vai ser especial para Devanilda Wcsolowski, mãe de Eduardo, de três anos, e os gêmeos Felipe e Fernanda, de oito meses. Depois do primeiro filho, ela e o marido tentavam engravidar há três anos, quando um exame detectou um problema nele: pouco sêmem.

A solução veio através da técnica mais usada para tratar infertilidade masculina: ICSI. Devanilda, de 27 anos, foi doadora de óvulos e não pagou nada pelo tratamento que ajudou o casal a ter os gêmeos.

Com lágrimas nos olhos, ela conta que procurou tratamento pelo SUS e não encontrou. Pensou em adotar e em fazer empréstimo para fazer o tratamento.

?A gente escondia o problema, mas eu várias vezes achei que estava grávida. Ficava inchada, três, quatro meses sem menstruar. Foram anos de frustração até eles chegarem. Hoje eu sou feliz e o que me deixa mais alegre é saber que mais alguém vai ter o sonho realizado com a minha ajuda. Eu não desejo essa angústia de querer um filho e não poder para ninguém. Pelo contrário, gostaria que todo pudesse sentir a alegria de ser mãe.?

Maternidade, ansiedade e contemporaneidade

Kátia M. Straube
Psicóloga clínica, psicoterapeuta,
mestranda em Sociologia.

Nos últimos 50 anos, o mundo tem assistido a enormes e intensas mudanças cujo impacto se fez sentir nas diversas esferas do viver. Da chegada do homem a Lua ao fenômeno da intercomunicação global, facilitado pelo advento da internet, as transformações foram extremamente abrangentes e aceleradas, num processo que vem ocorrendo de modo ainda não visto pela história da humanidade.

Estas mudanças resultaram em novas formas de estar no mundo, atingiram os sujeitos, suas identidades, suas relações com o trabalho, com o dinheiro, com a família, com as pessoas, com os filhos. E atingiram muito especialmente a mulher, destinando a ela um novo lugar no mundo.

A mulher de hoje pode experimentar realização profissional, independência, autonomia, felicidade no amor, sucesso econômico-financeiro. A possibilidade de viver a sexualidade com plenitude, sem a preocupação de procriar, é uma das grandes repercussões deste tempo. Do dever de ser mãe ao prazer da maternidade, um longo percurso foi feito em direção ao direito de escolha.

Definitivamente, reprodução e sexualidade não mais se vinculam. Os recursos da contracepção tornaram possível viver o sexo com prazer e optar ou não pela gravidez, num momento em que se julgue mais adequado.

No entanto, esta nova realidade traz uma demora no tempo de se enfrentar a maternidade como desejo e daí podem decorrer dificuldades de engravidar – o corpo biológico trai o desejo inconsciente.

O mal-estar contemporâneo traz ansiedade às pessoas e pode atingir, também, sua capacidade reprodutiva. Aquilo que antes era visto como natural, como um dom, mas também um dever, agora passa a ser requisitado como artificial, através das novas tecnologias de reprodução, um bem, um direito, uma escolha que, embora possa ocorrer no tempo que se quiser, nem sempre ocorre quando se quer.

As muitas dificuldades a se transpor, desde questões como possibilidades de perda de emprego que uma situação de gestação pode favorecer, até as que dizem respeito às mudanças no cotidiano da vida com a vinda de um filho, os cuidados exigidos, sua educação e saúde, podem, indiscutivelmente, agir como bloqueadores de uma expectativa natural de reproduzir e constituir família.

Frente a situações de infertilidade, a ansiedade surge como uma vilã capaz de fazer desmoronar o sonho pelo filho desejado. Para tanto, mais do que nunca, é indispensável a reflexão sobre o que é ser mãe, o que é ser pai, o que é ser família neste início de século, o que está por trás do desejo pelo filho e o que ele representa neste momento para o casal, para a família, ou ainda, para a pessoa solteira que o busca, muitas vezes, a qualquer preço, o que pode fazer com que o filho não mais seja sentido como um dom, mas como um bem passível de ser adquirido, mercantilizado.

Em tempos de recursos médicos férteis destinados a sanar desordens orgânicas de quaisquer natureza, a infertilidade, muitas vezes, resiste à ansiedade. Cabe a quem aspira a maternidade/paternidade, fazer o exercício reflexivo que resultará, sem dúvida, numa opção consciente e segura, capaz de contribuir para a realização do desejo por filhos e trazer o bem-estar tão necessário, em tempos tão conturbados.

Brasil é campeão em gravidez múltipla

 Foto: Chuniti Kawamura/Tribuna

Dr. Alessandro: especialista em reprodução humana.

A popularização da reprodução assistida fez do Brasil um dos campeões do mundo em gravidez múltipla: 42% das gestações por FIV (fertilização in vitro) resultam em gêmeos, trigêmeos, quadrigêmeos e quíntuplos. Na Europa a média é de 25%.

O nascimento de múltiplos bebês coloca em risco a mãe, os bebês e custa caro ao sistema de saúde. Para minimizar o problema, o Conselho Federal de Medicina orienta os médicos a transplantar, no máximo, quatro embriões.

?Há dez anos, ter gêmeos era motivo de orgulho. Hoje, a gente tenta diminuir isso para não sobrecarregar os pais e evitar bebês prematuros, mas o risco de gestação múltipla existe. É de cerca de 10%?, conta o médico Alessandro Schüffner (foto), especialista em reprodução humana.

Segundo ele, é difícil convencer os futuros pais. Os casais preferem correr o risco de ter mais de um filho a não ter nenhum. ?Lidar com a ansiedade deles é sempre um problema. Mesmo os mais esclarecidos já estão tão frustrados de não conseguir ter filhos que comemoram poder ter gêmeos?, diz o médico. Na clínica dele os pais tem apoio de uma psicóloga.

Isso não impediu Bianca Andrade de ?encomendar? os gêmeos Enzo e Pietra, de três meses. ?Foram dois embriões. E os dois nasceram. Eu sabia do risco, mas não me arrependo. Passei dois anos chorando quase todos os dias até eles chegarem. Lógico que dá muito trabalho, mas estou realizada?, diz a mãe.

Na Europa, 70% das clínicas transferem um único embrião. Os países que financiam o tratamento orientam que seja transferido um único embrião de ótima qualidade para o útero de mulheres com idade inferior a 37 anos nos procedimentos de FIV (fertilização in vitro).

Com a medida, os serviços públicos reduziram pela metade o índice de múltiplos, com quase a mesma taxa de sucesso de gravidez quando comparado aos índices obtidos com a transferência de dois embriões.

Riscos

Os riscos da gravidez múltipla são, para a mãe, de pré-eclâmpsia, diabetes gestacional e rompimento do colo uterino, com parto prematuro. Para o bebê, o maior risco é o da prematuridade – má-formação dos órgãos, baixo peso e infecções hospitalares. Em geral, bebês múltiplos nascem prematuros e precisam de internamento em UTI neonatal.

Fertilização de graça no HC

Chris Beller

 Foto: Aliocha Maurício/Tribuna

Karam Saad, chefe do departamento de Reprodução Humana do HC.

Dois em cada dez casais tem dificuldade de engravidar. Para eles, até agora, os serviços públicos no Paraná eram restritos a tratamento para estimular a ovulação. Isso deve mudar em dois meses, quando o Hospital de Clínicas terá a parceria do Centro Paranaense de Fertilidade para fazer fertilizações in vitro e oferecer, de graça, as técnicas mais modernas para ajudar os casais a ter filhos.

Segundo o médico Karam Abdoul Saab, chefe do Departamento de Reprodução Humana do HC e sócio do Centro, a parceria é para melhorar o serviço prestado à comunidade.

?Não é justo oferecer só o básico. É frustrante para nós, médicos-pesquisadores, e também para a população que quando tem um problema mais grave precisa recorrer à clínicas particulares. Na parceria não haverá lucro, nem repasse de verbas. O Centro vai trabalhar de graça?, diz o médico.

O acordo entre a clínica particular e o hospital é para fecundação. Os óvulos e espermatozóides vão ser colhidos no HC, enviados para a clínica e depois de fertilizados os embriões voltam ao HC para serem transplantados nas pacientes.

Para ser um serviço exclusivo do HC haveria necessidade de investimento, cerca de 50 mil dólares, segundo o médico.

A expectativa é atender dez casais por mês. O serviço de reprodução assistida do HC atende 50 casais por mês e a metade deles consegue engravidar com ajuda de medicamentos (hormônios que estimulam a ovulação) e videolaparoscopia, uma cirurgia com câmera que tanto serve para diagnóstico de infertilidade como para corrigir aderências e endometriose.

Filas

No ambulatório do HC a espera por uma videolaparoscopia chega a cinco ou seis meses. Para o novo serviço, Karam Saab prevê filas e espera maiores.

?Não tenho dúvida que a procura será muito grande, maior do que temos hoje. Todo casal quer ter filhos, 15% deles têm problemas de infertilidade e a maioria não tem dinheiro para o tratamento?, explica o médico.

O especialista citou alguns dos critérios para selecionar os casais: mulheres até 40 anos, em uniões estáveis, com condições de sustentar um filho. A triagem deve ser feita pelo serviço social do HC.

Endometriose tem tratamento

Um estudo clínico conduzido por cientistas brasileiros trouxe novas perspectivas para o tratamento da endometriose, doença que atinge mais de 10% das mulheres em idade fértil e é uma das principais causas da infertilidade.

Os pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) concluíram que um método anticoncepcional usado desde 2000 é eficaz, também para tratar a doença.

Trata-se de um sistema intra-uterino em forma de T, que libera diariamente mínimas doses de levonorgestrel – hormônio similar à progesterona produzida pelos ovários – diretamente no útero. É um método reversível e de ação prolongada. A eficácia do hormônio se mantém por cinco anos, sendo que a fertilidade é restabelecida logo após a retirada.

A grande vantagem do método é evitar as cirurgias, a retirada de útero, entre elas. Cada dispositivo pode ser usado por um período de até cinco anos consecutivos. Só é indicado para mulheres que não desejam ter filhos.

A pesquisa, liderada pelo professor Carlos Petta, acompanhou mulheres com endometriose com idades entre 18 e 40 anos durante dois anos.

A doença

A doença se caracteriza pela invasão do endométrio (tecido que recobre internamente a cavidade uterina) no próprio músculo uterino. O principal sintoma da doença é a dor no período menstrual, mas como é confundida com cólica a maioria das pacientes só procura tratamento depois de muitos anos, o que pode comprometer trompas e ovários, causando a infertilidade.

Sessentonas também podem ser mamães

Grávida aos 63 anos, Patricia Rashbrook, uma psiquiatra infantil de Lewes, sudeste da Inglaterra, deve ser a mulher mais velha a dar à luz. Ela se submeteu a um tratamento de fecundação assistida na Itália e está em seu sétimo mês de gravidez.

Rashbrook já tem dois filhos, mas voltou a se casar – com John Farrant, de 61 -, e o casal quis ter outro filho. Segundo o jornal The Sun, a mulher procurou o ginecologista italiano Severino Antinori para se submeter ao tratamento.

?Queremos enfatizar que não foi uma decisão tomada às pressas ou sem reflexão?, declarou o casal em um comunicado conjunto, no qual ressaltou sua felicidade. Os filhos de Rashbrook, Caroline, de 26 anos, e William, de 22, também se declararam encantados com a chegada do irmãozinho.

A maioria dos médicos britânicos rejeita os tratamentos de fecundação assistida para mulheres acima dos 45 anos e a decisão da psiquiatra provocou um grande debate sobre os tratamentos de fertilidade para mulheres que já não estão na idade natural de ter filhos na Inglaterra.

Recordes mundiais

No ano passado, uma romena de 66 anos tornou-se a mãe mais idosa do mundo ao dar à luz depois de um tratamento de fertilização in vitro. Em 2004, uma senhora de 64 anos deu à luz um bebê sadio no hospital Tel Hashomer, em Tel Aviv, Israel.

Ela e seu marido, cuja identidade não foi divulgada, submeteram-se durante anos a tratamentos de fertilidade e, apesar de repetidos fracassos, não se deram por vencidos e continuaram tentando, até que finalmente, a mulher ficou grávida.

A gravidez da mulher foi possível graças a uma doação de óvulo. A paciente foi hospitalizada a partir do terceiro mês de gestação na unidade de gestações de alto risco.
O hospital israelense divulgou que sua ?política não é a de realizar fecundações invitro em mulheres dessa idade devido ao elevado risco de saúde para a mulher?.

O casal, ambos de 64 anos, fizeram os tratamentos de fertilização em um centro particular. Em 1997, também na Inglaterra, Liz Buttle, uma fazendeira, teve um filho aos 60 anos.

Desenvolvido teste caseiro para fertilidade masculina

Na Inglaterra os homens vão poder saber se são férteis com um teste caseiro. Os cientistas da Universidade de Birmingham anunciaram ter desenvolvido o primeiro teste caseiro de fertilidade masculina do mundo. O kit, chamado Fertell, leva menos de uma hora para informar se um homem é ou não capaz de ter filhos.

Para fazer o teste, o homem precisa coletar uma amostra de seu esperma. O material é, então, colocado em um aparelho que imita o ambiente do colo do útero da mulher.
Se um número satisfatório de espermatozóides conseguir atravessar essa barreira, o teste mostra uma linha vermelha, que significa um resultado positivo.

Os testes para o desenvolvimento do produto usaram amostras de 150 homens e deram resultado correto em 95% dos casos. Os pesquisadores querem lançar o Fertell no mercado e acreditam que ele será comprado em farmácias inglesas sem a necessidade de receita médica.

Nosso "bebê" de proveta já é maior de idade

 Foto: Arquivo/Tribuna

Ana Paula e a mãe, Ilze, em foto de 1998. Ela foi o primeiro bebê de proveta brasileiro, nasceu em São José dos Pinhais, em 1984.

O primeiro bebê de proveta da América Latina nasceu em São José dos Pinhais, Região Metropolitana de Curitiba. O nascimento de Ana Paula Caldeira, no dia 7 de outubro de 1984 foi um marco para a medicina brasileira e representou a esperança para milhares de casais.

Ela nasceu seis anos após Louise Brown, o primeiro do mundo. Chegou com 3 quilos e 550 gramas e 50 centímetros. O pais optaram pela fertilização in vitro porque a mãe teve uma infeção nas trompas e não poderia engravidar de modo natural. Quando souberam do trabalho realizado em São Paulo pelo médico, já falecido, Milton Nakamura resolveram tentar.

Durante toda a gravidez, tanto os médicos como os pais mantiveram silêncio. A imprensa só teve acesso às informações dias após o nascimento. Ana Paula apareceu na manchete do jornal O Estado do Paraná no dia 12 de outubro de 1984 e também no Guinness Book, o livro dos recordes, daquela época.

Hoje, a técnica que possibilitou o nascimento de Ana Paula é comum, mas na época o bebê chamou muita atenção. A mãe da menina contou que muita gente foi ao hospital para ver o ?bebezinho que nasceu no vidro?.

Inglaterra foi a precursora

Louise Brown foi o primeiro bebê de proveta. Nasceu na Inglaterra no dia 25 de julho de 1978. Os médicos Patrick Steptoe e Robert G. Edwards retiraram óvulos da mãe de Louise, com obstrução nas trompas, e espermatozóides do marido dela.A fertilização aconteceu em uma estufa, que imitava as condições encontradas no útero, onde embriões se desenvolveram. De um dos embriões, nasceu Louise.

Dessa técnica, fruto de dez anos de pesquisa dos doutores Steptoe e Edwards, nasceram milhares de bebês sadios. Hoje o método é mais seguro e menos invasivo. Os óvulos são retirados por aspiração, e não mais em uma cirurgia.

Desde 1992 existe ICSI, ou injeção intracitoplasmática no útero, que introduz o espermatozóide no núcleo do óvulo e auxilia homens com baixa qualidade ou quantidade de sêmen.

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