As explosões dos raios gama e a ameaça à vida

Três vezes por dia, aproximadamente, um poderoso clarão de raios gama, invisível ao olho mas detectável pelos instrumentos astronômicos, ilumina o céu. Cada clarão dura entre alguns segundos e alguns minutos, emitindo mais energia que o Sol emitiria ao curso da sua vida em dez bilhões de anos. Qual é a origem desses sobressaltos e como eles liberam tanta energia? Os astrofísicos estudam tal mistério há quase 30 anos. A imprevisibilidade e a rapidez do fenômeno têm dificultado os seus estudos: os impulsos provêm de todas as direções do espaço e desaparecem rapidamente sem deixar vestígios.

A partir de 1980, a maior parte dos astrônomos concordou em aceitar que os sobressaltos provêm de estrelas de nêutrons situadas em nossa galáxia. No entanto, as variedades de clarões tornam qualquer explicação muito difícil. Um clarão pode durar entre 30 milissegundos e 15 minutos e, em alguns casos, mais de uma hora e meia. Em conseqüência, ainda existem diferentes hipóteses para explicar a origem dos raios gama, estrelas supernovas, anãs-brancas, etc.

Agora, uma equipe internacional de astrônomos chefiada pelos norte-americanos Kris Staneck, do Centro de Astrofísica do Observatório Smithsoniano-Harvard, e Peter Garnavich, da Universidade de Notre Dame, ao procurar evidências visíveis das explosões de alta energia usando o telescópio polonês de 1,3 metro do Observatório Europeu Austral, em La Silla, Chile, e o espectroscópio do Telescópio Magellan-Walter Baade de 6,5 metros, ambos associados ao Telescópio Espacial Hubble, descobriram a supernova responsável pela explosão de raios gama. Com efeito, a presença de uma estrela supernova – designada SN 2001 Kc – é a melhor evidência de que os clarões de raios gama são gerados pela presença de uma estrela explosiva, ou melhor, pela morte de uma estrela maciça (de grande massa, em geral várias vezes superior à do Sol).

A explosão de raios gama, designados pelas letras iniciais da expressão inglesa GRB – Gamma Ray Bust – parece portanto ter sua origem em uma estrela que explodiu. Assim, a fonte de raios gama GRB 011121, detectada em 21 de novembro de 2001 pelo satélite ítalo-holandês Beppo-SAX, parece associada a uma supernova.

Aliás, foram os experimentos embarcados nos satélites Beppo-SAX e no Compton Gamma Ray Observatory (Observatório de Raios Gama Compton), respectivamente da ESA e da Nasa, que revolucionaram a nossa compreensão relativa às fontes de raios gama GRB, ao permitirem uma localização mais precisa que permitiu o seu estudo espectroscópico complementar com telescópios locados na superfície terrestre.

Ainda que os GRB sejam resultados de uma estrela de nêutron ou de um buraco negro, está mais claro, pelo menos para a maior parte dos astrônomos, que os clarões de raios gama são produzidos quando uma estrela oito vezes mais maciça que o Sol alcança o fim da sua vida. Na realidade, uma supernova surge quando o núcleo de uma tal estrela maciça não pode mais manter o equilíbrio entre a gravidade e a sua irradiação luminosa. Em conseqüência, a força da gravidade acaba vencendo e a estrela se colapsa em uma estrela de nêutron ou um buraco negro. O colapso aparentemente envia para o exterior estreitos jatos de matéria e energia com uma velocidade próxima à da luz. Quando esses jatos estão dirigidos para a Terra, os nossos telescópios detectam as emissões de raios gama assim como de rádio e de luz.

Para o astrofísico Arnon Dar, do Instituto de Tecnologia de Haifa, a origem dos clarões seria causada pela interação entre uma “bola de fogo” de origem desconhecida, rica em metais pesados, e as radiações de estrelas mais próximas: os íons quentes de ferro ou de níquel poderiam interagir com as radiações de estrelas próximas que, nesse caso, emitiriam uma radiação gama. Segundo Arnon Dar, a explosão de uma estrela supermaciça (de massa muitas vezes superior à da Terra), na nossa galáxia poderia provocar uma grande extinção de vida no nosso planeta.

Ronaldo Rogério de Freitas Mourão

é, além de pesquisador-titutar do Museu de Astronomia e Ciências Afins, do qual foi fundador e primeiro diretor, escreveu mais de 65 livros, entre outros, Do universo ao multiverso: uma nova visão do cosmos.Consulte a homepage:
http://www.ronaldomourao.com

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