Mudando de lado

O PT sempre foi contra. O candidato Luiz Inácio Lula da Silva fez sua campanha, pelo menos no primeiro tempo, pregando contra a excessiva carga tributária. Mas agora que se preparam para assumir o governo conquistado nas urnas, PT e Lula estão de acordo: querem aumentar o imposto sobre a gasolina e derivados de petróleo (o famigerado Cide), de um lado e, de outro, tentam convencer o Congresso sobre a necessidade de manter os níveis escorchantes da mordida do leão da Receita Federal.

Aumento de imposto é sempre aumento de imposto. Não importa o nome que se dê ou o argumento que se invente. A previsão e a norma eram para, após passado dezembro próximo, baixar a faixa máxima de desconto do Imposto de Renda das Pessoas Físicas de 27% para 25%. Eram. Semana que entra será decisiva na negociação que tratam o PT e seus aliados com os partidos de oposição ao futuro governo sobre a matéria que, segundo se anuncia em Brasília, virou moeda de troca na estratégia de lado a lado.

Os opositores ao futuro governo podem concordar com a manutenção da alíquota de 27,5% advogada pelo PT, desde que seja aceita a proposta de um novo Refis (Programa de Recuperação Fiscal), permitindo o parcelamento da dívida de empresas inadimplentes com tributos federais em até 60 anos. Cerca de 130 mil empresas haviam pedido o parcelamento, aproveitando os prazos, mas menos de 40 mil delas permanecem no programa. Pelo que se informa, o total da dívida dessas empresas seria algo próximo dos noventa bilhões de reais. O argumento é que a maioria das empresas não conseguiu se enquadrar no programa de parcelamento e poderia aproveitar uma segunda chance. A ampliação do perdão tributário, que sempre gera desconforto entre os que pagam em dia, não poderia ser geral, segundo pondera o PT, a favor da idéia, pero no mucho.

Para manter a alíquota do IR em 27,5% (proposta que, em todo caso, deverá ser apresentada pelos aliados do futuro governo, que, assim, arcarão com o desgaste), os governistas atuais querem mais: a ampliação dos casos previstos pela legislação tributária de enquadramento no Simples ? um sistema de cobrança de impostos de pequenas e médias empresas. Seria o Simples 3, abrangendo também os setores de saúde e educação. Como se vê, tira-se de um santo para vestir outro. Apenas isso.

É do jogo democrático a negociação de partidos sobre propostas, assim como tentar obter compensações sobre posições perdidas e coisas do gênero. O que não pertence ao jogo democrático é essa sensação de traição ao eleitor, que já começa a se configurar, com a mudança de posição da agremiação política que comandará o processo de governo nos próximos quatro anos. Coerência é a palavra pela qual se deveria esperar. Que o candidato, ao subir nos palanques eleitorais, tenha mudado, é uma coisa; que venha a mudar de posição sobre questões que motivaram o voto do eleitor, eis o que já se denominou de estelionato. E não vale dizer que existem bons motivos para isso. Um governo eficaz precisa ter, antes de mais nada, credibilidade. E essa credibilidade não vem em função do número de autógrafos em camisetas, cadernos ou pernas engessadas.

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