Ministério Público vê indícios de improbidade praticados por José Dirceu

Brasília (AE) – O Ministério Público Federal levantou indícios de que o deputado federal José Dirceu (PT-SP) cometeu improbidade administrativa no período em que ocupou a Casa Civil da Presidência da República (janeiro de 2003 a julho de 2005) e deverá ser processado pelos crimes de tráfico de influência e peculato, cujas penas podem somar oito anos de prisão. O termo da denúncia está sendo concluído para ser formulado ainda esta semana pelo procurador da República em Brasília Luciano Sampaio Rolim e alcança também o filho do parlamentar, José Carlos Becker de Oliveira, o Zeca Dirceu.

Ele disse que ainda não definiu todas as tipificações, mas confirmou que os depoimentos de servidores da Casa Civil e as provas materiais colhidas não deixam dúvida de que a Pasta mantinha uma infra-estrutura destinada a carrear recursos para os municípios da base eleitoral de Zeca. Mesmo sem ser parlamentar e nem sequer exercer cargo de primeiro escalão no governo do Paraná, ele tinha trânsito livre no Ministério, usava as secretárias para marcar suas reuniões e tinha a seu serviço o próprio chefe da Assessoria de Assuntos Parlamentares, Waldomiro Diniz, levado para o governo por Dirceu.

As provas colhidas pelo procurador indicam que foi montado na Casa Civil um balcão exclusivo para atendimento de pai para filho, para aprovação de emendas apresentadas por Zeca em favor de muncípios do Noroeste do Paraná, região onde ele era pré-candidato a prefeito de uma das cidades, Cruzeiro D’Oeste, para a qual foi eleito.

Como Dirceu é parlamentar e tem direito a foro privilegiado, o relatório da investigação será encaminhado ao procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, ao qual cabe decidir se abre processo no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o ex-ministro. "Não posso antecipar o resultado da análise e as conclusões, mas nos depoimentos colhidos, os próprios servidores envolvidos revelaram a existência de tráfico de influência", disse Rolim.

O esquema, conforme as investigações, era operado por Waldomiro, afastado do cargo em fevereiro de 2004, após a divulgação de fita de vídeo em que ele aparece negociando propina com o empresário de jogos Carlinhos Cachoeira. "Depois da saída dele, não sei se o esquema continuou funcionando", observou o procurador, que investiga a denúncia há 17 meses.

Para disfarçar o tráfico de influência, Isabel Carneiro Silva, assessora parlamentar do deputado federal Airton Roveda (PMDB-PR), confessou que fazia ligações do seu celular para que Zeca conversasse com Waldomiro durante as reuniões para aprovação de verbas, à frente de caravanas de prefeitos do noroeste do Paraná que ele trazia a Brasília.

No curso da investigação, outro procurador, José Robalinho, da área criminal, requereu em julho do ano passado a abertura de inquérito na Polícia Federal para investigar os indícios, então já evidentes, de peculato e tráfico de influência. Até agora, porém, a PF não realizou uma diligência, interrogatório ou ato de investigação.

As investigações do Ministério Público constataram que, além da ajuda ao filho de Dirceu, Waldomiro e assessores da pasta cometeram irregularidades nas assinaturas de convênios com vários órgãos públicos e Ministérios em favor dos municípios apadrinhados por Zeca. O nome dele aparecia nas emendas ora por extenso, ora disfarçado com as iniciais JCB.

Processos eram montados com retroatividade para que fossem anexados documentos, pareceres e outros requisitos fora de data. Em geral a retroatividade era de semanas, mas em alguns casos foi de mais de dois meses. Só em duas áreas cuja análise já foi fechada pelo Ministério Público, a Fundação Nacional da Saúde (Funasa) e o Ministério do Desenvolvimento Social, na gestão da ministra Benedita da Silva, as liberações de recursos em processos intermediados por Zeca somam cerca de R$ 2 milhões.

Os processos flagrados por Rolim foram alvo de tentativa de fraude. Perícia encomendada pelo Ministério Público constatou que tentaram apagar o nome ou as iniciais JCB, escritas a lápis, que identificavam a tutela de Zeca ao lado dos processos. Sobre o nome apagado, escreveram nomes de parlamentares para disfarçar verdadeiro dono da emenda.

Depoimentos de assessores de Dirceu confirmam que a Casa Civil foi instrumentalizada para atender aos pleitos de Zeca. Convocado reiteradamente para prestar esclarecimentos, Dirceu não quis se manifestar. Zeca, hoje prefeito de Cruzeiro D’Oeste, mesmo sem ter direito a foro privilegiado ou imunidades, recusou-se a comparecer à intimação do Ministério Público. "Ele está exercendo o direito de não produzir provas contra si. Mas a omissão depõe contra. Ele não poderá depois alegar cerceamento de defesa", observou o procurador.

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