Lula descarta

Até agora, e em repetidas vezes, diretamente e através de porta-vozes e aliados, o presidente Lula tem tentado mostrar-se alheio à crise. Alheio, não participante, não interferente e, por isso mesmo, inocente. Os fatos, entretanto, levam a crer que, se de nada sabia, de muito deveria desconfiar, tal era o tamanho do furacão que atacou o seu governo, suas bases políticas, em especial o seu partido e o Congresso Nacional. Tão perto dele a crise sempre esteve que muitos são os seus auxiliares e companheiros que deixaram seus cargos, foram deles empurrados para fora e agora outros renunciam. O debulhamento continua, com os processos de cassações na Comissão de Ética da Câmara e mesmo que um ou outro fato possa, vez ou outra, desviar um pouco as atenções da opinião pública, a crise oferece todos os dias novos capítulos para alimentar o noticiário, as dúvidas e a desconfiança da sociedade. Se o ?nada sabia, nada sei? é uma tática, talvez seja hora de a assessoria do presidente repensá-la.

Em Moscou, onde visitou a Praça Vermelha, Putin e o túmulo de Lenin, buscando e até conseguindo alguns acordos e promessas importantes para a economia do Brasil, perguntado pelos jornalistas brasileiros se esperava a renúncia de outros deputados petistas, além de Paulo Rocha, seu ex-líder na Câmara, o presidente desconversou: ?Não esperava nada?, disse, para acrescentar: ?Os deputados estão dentro do Congresso Nacional, eles é que sabem o clima que estão vivendo lá dentro?. Disse ainda que no dia anterior tinha falado com o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, que lhe disse que estava tudo tranqüilo. Horas depois, Paulo Rocha renunciou e foram abertos processos contra cinco petistas, além do ex-ministro José Dirceu.

Notícias diziam que o Planalto tentou influenciar os petistas a renunciarem, a fim de encurtar a crise. O PT e o governo sairiam então da vitrine, onde sempre há perigo de que atirem pedras, e se evitaria que a crise se estenda até o ano eleitoral.

Lula acha que os acusados petistas que não renunciaram – João Paulo Cunha, professor Luizinho, José Mentor, Josias Gomes e João Magno – preferem ?fazer o debate político dentro da Câmara?.

A impressão que o presidente tenta dar é que é um fiel respeitador da independência e harmonia entre os poderes. Mais do que isso, que não está se importando muito com o que fazem seus correligionários, principalmente dentro do Congresso. Tal não casa com as contínuas interferências do Executivo no Congresso e mesmo nas CPIs, que, queiramos ou não, envolvem o seu governo.

A idéia que Lula tenta passar é que lava as mãos, como Pilatos, mas o que menos as suas bases políticas comprometidas nessa crise podem desejar é a orfandade, a falta da liderança sempre forte e efetiva do presidente, líder e fundador do PT e autor do milagre da virada que foi a sua eleição. Alguns conselheiros ou algum marqueteiro vêm assoprando nos ouvidos de Lula que esse é um bom caminho e que deve dedicar-se exclusivamente a ressaltar as conquistas positivas do seu governo. Um caminho perigoso, pois as vitórias que têm conseguido são relativas e podem, de uma hora para outra, com uma febre aftosa, aviária e uma alta do petróleo acima do desejável, ser obstaculizado. Melhor que assumisse por inteiro o comando, inclusive político, do seu grupo. Deixá-lo órfão só piora as coisas.

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