Licença-maternidade de seis meses?

A evolução do trabalho feminino, demonstra que, na Antigüidade, as atividades de caça e pesca eram incumbência dos homens, enquanto às mulheres eram delegadas funções como coleta de frutos, evoluindo para a cultura da terra, tosquia de ovelhas, tecelagem de lã, ceifa do trigo e preparo do pão. Já do século X a XV, há registros de que houve certa evolução destas relações de trabalho, com o aumento de profissões comuns aos dois sexos, havendo mulheres escrivãs, médicas e professoras, no entanto, com o renascimento as mulheres acabaram confinadas em casa e entregues ao trabalho doméstico. Quando este estado de coisas, começa a mudar, a mulher é requisitada para o trabalho na indústria têxtil e nas minas de carvão, por ser mão-de-obra mais barata. Nessa época, a exploração do trabalho da mulher foi às últimas conseqüências, resultando que o trabalho da mulher foi um dos primeiros a ser objeto de regulamentação pelos organismos internacionais, como a Organização Internacional do Trabalho. No Brasil, as primeiras legislações acerca do trabalho da mulher, surgiram em 1932, evoluindo tais regras de proteção a ponto de proibir o trabalho noturno da mulher, o trabalho nos subterrâneos, nas minerações em subsolos, nas pedreiras e obras da construção civil, pública ou particular e nas atividades insalubres, perigosas e em trabalho extraordinário, salvo força maior. Em relação à jornada de trabalho, argumenta-se que eram as tarefas domésticas, as quais estas deveriam dedicar-se ao retornar ao lar após o trabalho, que as impediam de fazê-las. Denota-se, pois, aqui, clara divisão de trabalho baseada no gênero, o que acarretava discriminação à mulher, pois com tantas restrições, o empregador acabava por optar pelo trabalho masculino.

O legislador Constituinte, sensível a tais fatos, estabeleceu logo no inciso I, do art. 5.º da CF a igualdade de direitos e deveres entre homens e mulheres, a partir de então e, ainda com o advento de outras leis surgidas após a Constituição de 1988, estes artigos da CLT, que restringiam o trabalho da mulher, sob a égide de protegê-la, foram paulatinamente revogados.

Somos otimistas, pois, atualmente, subsistem direitos à mulher, mais consentâneos com a realidade e com a igualdade de gênero. O fato é quando se quer proteger muito, pode-se cair no paradoxo da desproteção total, marginalizando ao invés de praticar a inclusão ao trabalho, principalmente, porque em certas situações, denota-se que uma mudança de cultura masculina, auxiliando e dividindo mais as tarefas domésticas com as mulheres, já seria suficiente para que estas pudessem fazer parte do mercado de trabalho sem quaisquer restrições acarretadoras de discriminação. É claro, que não podemos deixar de ressaltar que em determinadas situações é de bom alvitre que haja a proteção, como no caso da licença-maternidade, eis que se trata de uma condição específica, em razão de fatores de ordem biológica. A gestante necessita de um certo período para a recuperação do seu corpo, bem como para amamentar o filho. Nesse aspecto, a lei já estabelece licença-maternidade de 120 dias e dois descansos especiais de meia hora cada, para amamentar o filho, até que este complete seis meses de idade. Porém, mesmo nesta questão, há que se ficar alerta, pois servidoras das prefeituras de 14 capitais já tiveram a licença-maternidade ampliada de quatro para seis meses e, no Congresso Nacional, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara já aprovou a proposta de Emenda à Constituição, que aumenta a licença-maternidade de quatro para seis meses. Há que se questionar se não estaria havendo um retrocesso, onde o Estado, no afã de muito proteger acabaria por desproteger. Parece-nos, que apesar de todas as questões que envolvem a maternidade em seu aspecto biológico, seria conveniente que também o pai pudesse ter oportunidade de mais contato com o filho, o que é perfeitamente saudável para a criança e para o mercado de trabalho das mães das crianças. Assim, a nossa proposta é para que esta licença seja dividida, o que poderia ser feito ficando a mãe com os três ou quatro primeiros meses desta licença e o pai, com o restante. Pesquisa realizada por Cecília Troiano, que deu origem ao livro ?Vida de equilibrista-dores e delícias da mãe que trabalha?, demonstra que cerca de 91% das mães são as responsáveis por levar o filho ao médico, ante 4% dos pais, e 75% das mulheres participam das reuniões da escola, ante 6% dos homens e isso mesmo após os primeiros anos de vida do filho.

Portanto, concluímos que uma maior participação dos homens na vida familiar e doméstica, contribuiria para evitar o excesso de proteção às mulheres, que no intuito de proteger acaba discriminando, e que esta seria uma forma de fazer valer, efetivamente, o inciso I, do art. 5.º da Constituição, o qual prega a igualdade entre homens e mulheres em direitos e obrigações, evitando, inclusive, que tantas mulheres talentosas, tenham muitas vezes que fazer uma opção entre carreira e filhos, quando ,com mais apoio, poderiam conduzir-se no mercado de trabalho com muito mais maestria. Além do que, evitar-se-ia o estresse a que estão submetidas muitas mulheres, em função de assumirem jornadas duplas de trabalho, arcando com as tarefas inerentes ao lar e no ambiente de trabalho.

Mais evolução nessa cultura de divisão do trabalho em razão do gênero, seria uma grande contribuição dos homens e da sociedade em geral, às mulheres.

Leda Maria Messias da Silva é mestre e doutora em Direito do Trabalho, pela PUC-SP, coordenadora do Curso de Direito do Centro Universitário de Maringá, professora da graduação e do mestrado do Cesumar, professora da Universidade Estadual de Maringá, membro de Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos, em Maringá-PR, e do Instituto dos Advogados Brasileiros, ex-professora da Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro.

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