FGTS encolhe

Os escândalos e a ciranda que os rodeia continuam ocupando o noticiário e as atenções da nação. Isso porque se repetem e, felizmente, o Ministério Público decidiu mexer nas feridas que os meios políticos procuraram esconder da população, seja através de curativos mal-feitos com a gaze transparente do corporativismo ou do fisiologismo políticos, seja acreditando que não existe pecado no lado de baixo do Equador, principalmente quando se trata de roubar ou malversar o dinheiro do povo.

Mas enquanto no Senado discutem a duvidosa ética ou falta de ética do presidente Renan Calheiros e no Supremo abre-se, em prestações, um gigantesco processo contra gente envolvida no escândalo do mensalão, é preciso que não nos esqueçamos que neste País de dimensões continentais existem males incomensuráveis e que perduram até mesmo pela inércia.

Um deles acaba de ser revelado, ou melhor, contabilizado. O FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) corrigido pela TR (taxa referencial) tem provocado pesadas perdas ao patrimônio dos trabalhadores. A informação vem de reportagem da Folha de S. Paulo, assinada por Marcos Cézari. Ele se baseou em cálculos do Instituto FGTS Fácil, uma organização não governamental especializada em informações sobre o fundo. Eles mostram, que desde 1991, a taxa referencial teve variação de 32,422%. Já o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) teve uma variação de 41,749%. Cotejando as duas correções, conclui-se que as contas do FGTS perderam 28,7%.

É oferecido um exemplo. Um trabalhador cujo fundo tem juros de 3% ao ano e que durante dez anos (1981/1991) recebeu um salário mínimo, entre 1991 e julho de 2007 deveria ter recebido R$ 3.192,00 somente de juros, excluídos os depósitos mensais, desde que o FGTS fosse corrigido pelo INPC. Mas com a correção pela TR ele recebeu apenas R$ 2.488,00. A perda foi de R$ 704,00. O governo afirma que esta correção minguada obedece a Lei n.º 8.036/90. A Caixa Econômica silencia. Se é verdade, por que não mudaram a lei? Porque os prejudicados são os trabalhadores, os que menos ganham, têm um fundo cujos juros são os menores praticados no Brasil e, aqui vale um apêndice, ainda pagam coisas como a tal da CPMF, que sai dos seus bolsos rasos todos os dias e em geral nem sabem de que se trata.

O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço foi formado para construir uma reserva para os casos de desemprego, compra de imóvel, aposentadoria, invalidez e morte do trabalhador. Existe desde o governo Castelo Branco. O valor depositado sai do caixa do patrão. O governo não entra com nenhum tostão, o que nos leva a crer que os empregadores, pelo menos na teoria, indiretamente também são prejudicados. Dá ao seu empregado, todos os meses, um percentual do seu salário com o objetivo de garantir-lhe as situações adversas já referidas e não vê esse pecúlio crescer como deveria. Verdade que acaba pagando menor multa rescisória sem justa causa, mais um prejuízo para o trabalhador.

O trabalhador também é prejudicado quando usa o saldo do FGTS para a compra da casa própria, o que tem sido cada vez mais comum e, diga-se de passagem, vantajoso, pois os juros pagos pelo dinheiro do FGTS são tão pequenos que perdem de longe para os que são cobrados no financiamento de moradias.

O assunto não se esgota na análise dessas perdas nem na insuficiência do FGTS como garantia contra o desemprego. Mas deveria bastar a revelação de que, corrigido pela TR, vem encolhendo, para que o governo devesse tomar uma providência em favor dos trabalhadores. Ou o Congresso, roubando um pouco do seu precioso tempo dedicado a ações de ataque e defesa de rumorosos escândalos, parasse para pensar nos trabalhadores. Ou mesmo os sindicatos e as centrais sindicais, que raras vezes faltam no debate de assuntos de interesse político (e devem fazê-lo), mas que têm a obrigação primeira de defender os interesses mais próximos das causas dos trabalhadores, entre eles o FGTS.

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