Ética e pose

O ministro Tarso Genro vem sendo, desde a administração passada de Lula e ainda na que estamos enfrentando, o homem da cúpula petista que mais porfia por uma reforma total do partido, de maneira que possa recuperar seu histórico perfil ético. Ele foi, dentro da agremiação e entre seus membros proeminentes, o primeiro a reconhecer os descaminhos, a deterioração da pose ética e o evidente comportamento antiético de altos próceres da agremiação. Sentiu, aparentemente com sinceridade, o quanto os escândalos estavam comprometendo a agremiação que ajudou a fundar e que, quando enveredou por descaminhos, criou-lhe constrangimentos e até mesmo problemas no seio de sua própria família, pois sua filha, deputada federal, esteve entre os parlamentares que romperam com Lula para fundar o PSOL.

Não obstante, Tarso Genro agarrou-se na esperança de que, salva a imagem de Lula, estaria preservada a do próprio governo. E, destarte, seria possível separar o joio do trigo, ou o governo dos governantes transviados, uma química difícil, mas que, se possível, satisfaria suas esperanças. No Congresso Nacional do PT, que se realizou na semana passada perante um auditório de cerca de três mil pessoas, encontro que se sucedeu à histórica decisão do Supremo Tribunal Federal de processar criminalmente a turma do escândalo do mensalão, inclusive ex-ministros de Lula, deputados e ex-deputados federais a ele aliados e nomes da cúpula do diretório nacional do PT, tentou-se o impossível: ignorar os fatos e oferecer um diagnóstico em que nem o governo nem o partido mostravam sequer arranhões por tão contundentes reações na Justiça. Tomou-se um comportamento diametralmente oposto ao que foi recomendado e pelo qual lutou Tarso Genro e os petistas puros. E existiram e ainda existem petistas puros, daqueles que acreditam na bandeira do partido, na sua estrela vermelha, sua vocação socialista e sua destinação de agremiação dos trabalhadores e defensora dos pobres e oprimidos. Mas eles não mandavam e não mandam na agremiação e nem mesmo no governo, mesmo depois do projeto de expurgo pregado por Tarso Genro.

Tentou-se o silêncio ou fingir ignorar a decisão do STF. Lula foi mais corajoso. Comparecendo à sessão do segundo dia do congresso, discursou usando e abusando de sua conhecida e aplaudida retórica. Buscou minimizar a decisão do Supremo repetindo o óbvio: ninguém está inocentado e ninguém foi considerado culpado. Por enquanto e não se sabe até quando. Conclamou seus correligionários a não esmorecerem e se dedicarem à defesa dos companheiros que passam pelo inferno astral das acusações em apuração no âmbito da Justiça. Repetiu, como de seu feitio, que se há culpados terão de ser punidos, doa a quem doer. Mas sempre deixou claro que não dói no governo nem no PT, entidades que pairam acima dos desvios éticos. Políticos éticos e éticos morais, como classificou.

Lula admitiu que o PT errou no caso do mensalão. A certa altura, num arroubo de oratória, afirmou que ?ninguém neste País tem mais autoridade moral e ética do que o nosso partido. Admitimos que tem gente igual a nós, mas não admitimos que tenha melhor (…). Na hora em que algum de nós cometer um erro, por mais amigo que seja, ele estará subordinado às mesmas leis e regras do que os 190 milhões de habitantes (do Brasil) estão submetidos?.

Infelizmente, essa ousada afirmação não soa como um auto-elogio nem como uma defesa. Soa como a proclamação de que a moral e os bons costumes mudam de acordo com a longitude e a latitude, conforme as circunstâncias. Ao invés de convencer que os petistas que o cercam são éticos, Lula acabou insinuando que todos os demais políticos brasileiros, dos partidos aliados ou não, são farinha do mesmo saco.

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