Estado de terror

Depois que um bando de delinqüentes metralhou a sede da Prefeitura do Rio de Janeiro numa dessas madrugadas, o prefeito César Maia sugeriu (e o governo FHC não concordou) a decretação do estado de defesa previsto na Constituição, cujos efeitos são um pouco semelhantes ao estado de sítio. A discussão foi estabelecida: o que é preferível – o estado de defesa, que teria o objetivo de proteger os cidadãos contra o poder paralelo do crime que afronta o Estado e toda a sociedade, ou o estado de terror que impera e se alastra por todo o País? O que resta fazer para dar um basta a tudo isso e inverter o processo que faz de todo brasileiro esse ser encurralado pelo medo?

A organização não-governamental Small Arms Survey, pouco conhecida entre nós, mas tida como uma das principais fontes de informação sobre o assunto no mundo, informa em Genebra que no Brasil morrem por ano cerca de 41 mil pessoas vítimas de crimes praticados por armas leves. Aqui não estamos em guerra declarada contra ninguém, mas ganhamos da Colômbia e da Palestina. Pior que isso é saber que esse número cresce ano a ano. Ninguém tem condições de contestar esse número e é bem possível que ele seja ainda maior. “O Brasil – disse um dos pesquisadores da ONG – vive uma epidemia de violência social.”

Ano após ano, isso significa muito mais: na década de 90, segundo o mesmo estudo, cerca de 300 mil pessoas morreram atingidas por armas leves no Brasil do futebol e do carnaval, onde circulam, de acordo com a mesma fonte, quase dezenove milhões de armas. Desse total, apenas sete milhões estariam registradas. Nesse setor, ostentamos outra estatística nada lisonjeira: somos o 13.º maior produtor de armas leves do mundo e um dos principais exportadores, ao lado dos Estados Unidos e Rússia. Isto é, além de produzir a nossa própria desgraça, ajudamos a realizar a dos outros.

A ONG reconhece o nosso esforço no combate à violência, ao informar a maior campanha mundial de destruição de armas já feita, que retirou de circulação mais de cem mil unidades de armas. Mas ela está desatualizada com relação aos últimos acontecimentos: da violência passamos ao terror.

Com efeito, o que disse o prefeito César Maia é verdadeiro: violência, quando passa para a produção de atos de intimidação, chama-se terror. E o terrorismo exige outras táticas de combate.

O que está acontecendo no Rio de Janeiro – embora alguns queiram dourar a pílula com argumentos políticos, partidários e até eleitoreiros – não pode ser visto como uma coisa isolada. O debate é pertinente em todos os lugares e urge que o Estado tome medidas enérgicas e eficazes para sufocar de vez a sanha assassina dos agentes do mal. É inadmissível que os cidadãos tenham que viver encurralados e amedrontados, enquanto bandidos e facínoras circulem em liberdade e, impunes, construam seus próprios cemitérios nos morros e baixadas. Nessa empreitada – não pode haver omissão – todos estão convocados. Passividade ou indiferença são sintomas graves dessa epidemia nacional.

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