Esperanças e desilusões

Dois intelectuais de esquerda, o prêmio Nobel José Saramago e Chico Buarque de Holanda, há poucos dias deram declarações à imprensa revelando desilusões em relação ao governo Lula. Saramago, nome internacional na literatura e esquerdista convicto, não escondia simpatias pelo atual presidente brasileiro e por outros líderes socialistas, em especial o cubano Fidel Castro. Mas, em suas mais recentes declarações, disse não reconhecer no Lula de hoje o de antes, entendendo que o presidente renunciou às suas idéias e se entregou ao capitalismo orientado por organismos como o FMI e capitaneado pelos Estados Unidos. Não rompeu de vez com Lula, mas já deixou claro que o está olhando de esguelha, entendendo que hoje é mais um adversário das idéias que, em comum, com ele defendia, que um companheiro temporariamente desviado e que pode ser reconquistado.

Já Chico Buarque de Holanda é condescendente com o atual presidente do Brasil como companheiro das esquerdas. Repete suas juras de amor a Fidel Castro e expressa a esperança de que haja um retorno à esquerda do presidente brasileiro. Chico diz-se cansado de ver governos manipulados pelo capitalismo norte-americano e aí, com certeza, inclui o brasileiro do seu companheiro Lula.

Essas desilusões e as remanescentes esperanças têm sido um empecilho ao governo petista para ultimar importantes projetos que se destinam a oferecer ao Brasil obras de infra- estrutura, como as ferrovias, rodovias e hidrovias de que necessitamos para fazer transitar a nossa produção, que as estatísticas, olhadas com lentes de aumento, apresentam ovacionado crescimento, embora revelem um movimento ascendente modesto.

Lula reclama da lentidão com que o Congresso examina as Parcerias Público-Privadas (PPPs), associações entre o poder público e a iniciativa privada em que recursos unidos, mais desta do que daquele, viabilizariam grandes obras, essenciais para a realização do “milagre do desenvolvimento”, mas que são famintas de imensos recursos, reclamam largo tempo para realização e acenam com um lento retorno dos capitais investidos.

Embora de parte do empresariado tenham havido manifestações favoráveis a essa associação com o governo, temos a impressão de que a administração Lula está sendo enrolada. Uma das exigências que se fazem no Congresso é a da prioridade, ou seja, que nesses empreendimentos os lucros auferidos sejam pagos antes para fundos de pensão ou quaisquer outros capitais privados que venham a entrar nessas associações de capitais, que, diga-se de passagem, são estranhas ao regime socialista e se apresentam como um modelo híbrido de estatização e privatização. Dois sistemas igualmente rejeitados, ora por uma, ora por outra das partes que estão sendo convocadas para se entender e viabilizar o desenvolvimento econômico.

A aproximação que Lula procura com o capitalismo desagrada seus companheiros de esquerda. Ou os que, sendo de esquerda, ainda teimam em ser seus companheiros. No PT, a nova linha programático-ideológica adotada pelo governo já provocou protestos e até expulsões de velhos companheiros.

Este é um problema, mas menor se considerarmos que é preciso conquistar de vez a confiança da iniciativa privada. As esquerdas fazem discursos, mas não têm dinheiro. A iniciativa privada está com um pé atrás. Nela, muitos temem o retorno de Lula aos caminhos com que sonham Saramago e Chico Buarque.

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