Ensino fundamental de nove anos no Paraná: prejuízos mais que benefícios

Ainda que a legislação federal tenha fixado o prazo até 2010, o Conselho Estadual de Educação do Paraná deliberou que o ensino fundamental de nove anos deve ser obrigatoriamente implantado, no sistema público e privado, a partir de 2007, o que aparentemente se mostra louvável.

Ocorre que o mesmo Conselho está pretendendo limitar o acesso ao primeiro ano desse novo sistema de ensino fundamental às crianças que completem seis anos de idade até 1.º de março.

Essa limitação é absurda e ilegal, pois vai excluir mais de 80% das crianças dos benefícios que a legislação federal pretendeu criar.

A legislação federal, que os Conselhos de Educação devem obrigatoriamente observar, em nenhum momento estabelece o limite de 1.º de março, nem antes, nem após as alterações do sistema de ensino fundamental.

As únicas alterações introduzidas pelas Leis n.º 11.114/2005 e 11.274/2006 compreenderam a faixa etária de ingresso (antes era de sete anos, passando a ser de seis anos de idade) e o tempo de duração (antes de oito anos e agora de nove anos).

Essas alterações vieram ao encontro das metas e objetivos do Plano Nacional de Educação, instituído em 2001, que é de antecipar a data de ingresso da criança no ensino fundamental e, por conseqüência, aumentar o tempo de sua duração (de oito para nove anos).

Logo, a alteração visou a aumentar um ano no início. Assim, o ensino fundamental, que antes compreendida a faixa etária dos 7 aos 14 anos, passa a compreender a faixa etária dos 6 aos 14 anos.

Ora, até 2006, no Paraná matriculavam-se na primeira série do ensino fundamental de oito anos todas as crianças que completassem sete anos no curso do ano, sem qualquer limitação. Essa era a regra vigente mesmo antes da Lei n.º 9.394/96. Portanto, por exemplo, a criança que completou sete anos em 2006, seja em janeiro ou em dezembro de 2006, deveria estar freqüentando a primeira séria do ensino fundamental no ano de 2006.

Assim, com a limitação indevidamente imposta pelo Conselho Estadual de Educação do Paraná, o novo sistema, a vigorar no Paraná já a partir de 2007, somente favorecerá reduzida parcela de crianças, ou seja, as que fizessem seis anos de 1.º de janeiro a 1.º de março.

As demais, que fazem aniversário de 1.º de março até 31 de dezembro, logo, a grande maioria, além de ficarem excluída do benefício criado pela lei (antecipação do ingresso no ensino fundamental obrigatório), terão ampliado o período de duração do ensino fundamental para nove anos no seu final, ingressando no ano que fizerem sete anos e concluindo essa fase com quinze anos.

A comparação exemplificativa de duas crianças nascidas no mesmo ano, uma (?A?) que faz aniversário em 28 de fevereiro e a outra (?B?) que faz aniversário em 2 de março, ou seja, com dois dias de diferença de idade (três dias nos anos bissextos), deixará mais clara essa incongruência:

No sistema em vigor, de oito anos de ensino fundamental, ambas ingressariam no ano em que completassem sete anos. Se tivessem nascido em 2001 e o sistema não fosse imediatamente implantado, ingressariam na 1.ª série do ensino fundamental de oito anos em 2008 (ano em que ambas completariam sete anos de idade), concluindo essa fase em 2015, com quatorze anos de idade.

Implantado o novo sistema de ensino fundamental de nove anos segundo a regulamentação do Conselho de Educação do Estado do Paraná, a criança ?A? ingressaria na 1.ª série do ensino fundamental em 2007, concluindo essa fase em 2015, com quatorze anos de idade, logo, atendendo exatamente os termos e o espírito da legislação federal.

Já a criança ?B?, com diferença de idade de dois dias, ingressaria na 1.ª série do ensino fundamental de nove anos em 2008, concluindo essa fase em 2016, com quinze anos de idade.

Como se vê, a criança ?B?, além de ingressar com a mesma idade que iniciaria o ensino fundamental no sistema atual (no ano em que completaria sete anos), ainda permaneceria um ano a mais.

Não se pode olvidar, ainda, que o primeiro ano do ensino fundamental de nove anos, com ingresso aos seis anos de idade, não terá (e não deve ter) o mesmo conteúdo pedagógico da 1.ª série do ensino fundamental de oito anos, pois estará direcionado para crianças mais novas, conforme, inclusive, as orientações já traçadas pelo MEC.

Portanto, pela regulamentação do Conselho de Educação do Paraná, as crianças nascidas entre 1.º de março e 31 de dezembro estarão excluídas dos benefícios do novo sistema (antecipação do ingresso no ensino fundamental) e ainda terão que se submeter a nove anos de ensino fundamental e com conteúdo pedagógico defasado, pois direcionado para crianças mais novas.

Não se pode, também, desconsiderar a situação das crianças que completam seis anos em 2007, mas após 1.º de março e que em 2006 estão freqüentando a pré-escola. Essas crianças, segundo a regulamentação do Conselho Estadual de Educação, não poderia ingressar na 1.ª série do novo sistema de ensino fundamental em 2007, devendo repetir a pré-escola ou então ficar fora da escola por um ano.

Parece simples a constatação que a regulamentação proposta pelo Conselho de Educação do Estado do Paraná afronta a lei federal e é extremamente prejudicial a todas as crianças que nasceram e nascerem entre 1.º de março e 31 de dezembro.

Não se pode conceber que os membros do Conselho Estadual não tenham se percebido desse absurdo, pois se tratam de pessoas que dirigem o ensino em nosso Estado. Seria temeroso cogitar que o nosso ensino estivesse nas mãos de educadores com tamanha limitação de percepção.

A única explicação é que se tratou de decisão política, a fim de aparentemente se estar implantando imediatamente o novo sistema, mas com eficácia reduzidíssima, atingindo pequena parcela das crianças. Evidentemente, essa justificativa não torna menos lamentável a decisão.

O que se espera, portanto, é a revisão dessa decisão, a fim de que o acesso à 1.ª série do ensino fundamental de nove anos seja garantido a todas as crianças que completem seis anos de idade no ano de ingresso, ainda que para tanto seja necessário observar o prazo previsto na lei para a implantação desse novo sistema (até 2010).

A educação no Brasil precisa ser tratada com seriedade!

Arion Mazurkevic é juiz do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná.

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