Ensino do Direito: a pesquisa científica na graduação

O fomento à atividade de pesquisa em um curso de graduação de Direito, assim como o desenvolvimento de outras práticas acadêmicas de ensino e extensão, denota o empenho de uma instituição de ensino superior (IES) em assumir sua função pública de articuladora e implementadora de programas institucionais de relevância e inserção social com os quais, em princípio, todas estas Instituições devem estar compromissadas. A pesquisa científica, especialmente aquela que incorpora em seus procedimentos metodológicos (à parte seu fundamental papel na produção do conhecimento) a observância de dados empíricos, do trabalho de campo, da etnografia e da interlocução com teorias que fundamentam áreas afins, propicia ao aluno desde a graduação um aprofundamento qualitativo sem igual dos conteúdos e práticas apreendidos em sala de aula porque promove o contato construtivo, crítico e participante com as complexidades da realidade social, qualificando o pensamento analítico deste aluno de maneira ímpar. Essa experiência intelectual peculiar sedimenta tanto os fundamentos de uma formação de excelência quanto os fundamentos de uma especialização balizada.

Aprender a pesquisar pesquisando, é aprender de uma forma epistemológica a enfrentar os desafios impostos pela prática sócio-política e profissional. Além disso, é aprender a propor de forma objetiva, crítica, competente e compartilhada alternativas e caminhos de intervenção que visem a resolução justa e ética desses desafios. Em síntese, pesquisar é adquirir, re-significar em padrões teóricos-metodológicos, produzir e socializar conhecimento.

As dificuldades deste processo são muitas (como a indisponibilidade de tempo e de interesse dos alunos em realizarem os procedimentos de construção de uma pesquisa científica, assim como a indisponibilidade de tempo e interesse dos professores responsáveis por orientar as pesquisas, ou ainda, a carência de recursos materiais). Todavia, incentivar e fomentar trabalhos de pesquisa nos cursos de graduação em Direito que não se limitem apenas à discussão ou comentário da doutrina ou ?aspectos de decibilidade?, mas que coloquem em diálogo permanente o campo jurídico e o campo científico, significa incorporar fontes mais ricas em dados quantitativos e qualitativos e análises teóricas mais densas do que a simples especulação ou senso comum.

A escolha da pesquisa como processo pedagógico tende a se traduzir na renovação e melhoria constante da compreensão discente, particularmente em relação ao ordenamento e agenciamento ao qual estão sujeitos os indivíduos, os grupos e as instituições sociais e políticas. Assim, justamente por refinar a construção do pensamento analítico, a pesquisa científica é fundamental na formação jurídica e deve, para garantir os resultados esperados, ser inserida, incentivada, motivada e praticada desde a graduação, fato que não é comum nas faculdades de Direito do Brasil.

De um modo geral, os cursos de graduação em Direito concentram seus esforços, programas, currículos e atividades complementares na formação da ?prática? jurídica em detrimento de uma formação acadêmico-científica. Pesquisas propriamente ditas são desenvolvidas, em regra, apenas nos mestrados e doutorados e, mesmo assim, alguns programas de pós-graduação em Direito (e as pesquisas que deles derivam) se caracterizam pela inconsistência no tratamento dos dados, no manejo da pesquisa de campo e na interlocução com os outros campos do conhecimento, fatos que revelam dificuldades na construção de uma legitimidade científica do campo jurídico.

Em tese, não existem dicotomias inseparáveis e incontornáveis entre a formação profissional de um advogado, de um defensor público, de um procurador, de um promotor ou de um juiz e a produção científica no âmbito da formação jurídica, pela razão direta de que o pensamento científico impõe aos alunos a reflexão metodológica e epistemológica que se expressa na capacidade de compreender a realidade social – prática e cotidiana – de uma forma peculiar que, não obstante não ser a única e nem tampouco a verdadeira, por seus pressupostos de sistematização, racionalidade, probabilidade, verificação e generalização permite ao aluno de graduação em Direito discutir o significado e a aplicabilidade da sua inserção profissional (e cidadã) posto que, o coloca frente a questões que implicam diversidade, pluralismo, autonomia, mudança, o que no limite é um exercício constante de tolerância ou admissão de modos de pensar, agir e sentir diversos dos seus enquanto indivíduo, membro de um grupo ou agente inserido em uma determinada cultura.

Laura Garbini Both é mestre em Ciências Sociais pela UFPR, professora de Sociologia do curso de Direito da UniBrasil e tutora do Pet-Direito/Unibrasil. laura.both@unibrasil.com.br

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