Encontro internacional dos comerciários debate Mercosul

?Democracia não é uma palavra vazia. É realidade que sobrevive quando substanciada por conteúdo social?, diz Vicente Silva, presidente da Fetraparaná e da CGT.PR, destacando um dos pontos significativos da declaração aprovada no I Encontro Internacional do Trabalho do Mercosul, juntamente com o VI Encontro dos Comerciários do Paraná, realizados em Guaratuba, Paraná, de 29 a 31 de março, pela Federação dos Empregados no Comércio do Estado do Paraná, Comissão de Entidades Sindicais de Comércio e Serviços do Cone Sul, Confederação Nacional dos Trabalhadores no Comércio, Confederação Geral dos Trabalhadores e Coordenadora das Centrais Sindicais do Cone Sul. Frisou Vicente Silva que o objetivo dos eventos foi de ?promover a integração das entidades sindicais, a troca de conhecimento dos procedimentos jurídicos e constitucionais dos países participantes e o fortalecimento das relações de trabalho no Mercosul?. Participaram dirigentes sindicais, advogados e assessores das entidades sindicais do Brasil, Paraguai, Uruguai, Argentina e Chile. Tivemos a honra de apresentar a exposição sobre ?Negociação Coletiva?, em debates com o plenário, juntamente com o dr. Aramis Silveira, consultor jurídico da Fetraparana e dirigente da OAB.PR, e dos representantes das entidades sindicais da Argentina e do Chile, abordando as realidades de cada país e indicando rumos de superação dos problemas enfrentados em comum pela classe trabalhadora.

Registramos, ainda, como conferencistas, a Dra. Rosalie Michaele Bacila Batista, juíza vice-presidente do TRT.PR, abordando vários aspectos de atualização em Direito do Trabalho, o dr. Luiz Eduardo Gunther, juiz corregedor do TRT.PR., apresentando questões relativas a decisões da Justiça do Trabalho, e o jornalista Altamiro Borges, editor da Revista Debate Sindical, analisando a organização sindical e os principais aspectos das proposições da reforma sindical em tramitação no Congresso Nacional. Nos paineis de debates a presença do secretário geral da CNTC José Carlos Schulte, os advogados paranaenses Aramis Silveira e Roberto Barranco, e os representantes das entidades sindicais da região do Mercosul.

Evidenciadas as questões do Mercosul a partir do diagnóstico jurídico, político, social e econômico, procurando indicar rumos a serem seguidos na busca da efetiva integração dos povos e países do cone sul e, ademais, da América Latina. Foi apresentado um panorama do Direito do Trabalho e de seu setor sindical, em especial do Mercosul, na perspectiva da imprescindível a aprovação de uma Carta Social. Tendo sido desenvolvido até o momento basicamente um ajuste comercial e uma incipiente união aduaneira, poucos avanços têm sido assinalados no campo social, embora com a manutenção dos grupos de debate sobre relações de trabalho, a criação do Foro Consultivo Econômico-Social do Mercosul e do Observatório do Mercado de Trabalho, além da aprovação da Declaração Sócio-Laboral. Entretanto, os recentes anos de governos neoliberais criaram impasses que agora têm que ser superados por uma nova visão, a partir das políticas dos governos de centro-esquerda ora em desenvolvimento. com reflexos diretos nas expectativas de empregados e empregadores quanto a um ajuste social.

As recentes confrontações de brasileiros e paraguaios ocorridas na Ponte da Amizade (Foz do Iguaçu/Ciudad del Este) é o exemplo da incapacidade de organismos do Mercosul em superar os impasses surgidos com a crise na região. Os representantes sindicais vêm sistematicamente alertando os governos dos dois países da deflagração de manifestações, assim como a necessidade de exame de propostas de conformação de uma zona livre de comércio.

Ao final dos debates do Encontro Internacional do Mercosul, os dirigentes sindicais aprovaram a Carta de Guaratuba, sintetizando a linha de pensamento sobre as questões apresentadas, que transcrevemos, pela sua importância no atual contexto:

Carta de Guaratuba  

?Resta evidenciado, a globalização já é uma realidade inserida no contexto social de todos os países, o que determina não sejam mais somente os fatores e circunstâncias locais a regrar o curso das relações de trabalho, consumo e comerciais. A realidade mundial consiste em que tudo quanto ocorre em um País seja rapidamente difundido e produza reflexos, em maior ou menor intensidade, em todos os demais.

Há, assim, a necessidade de se estender a realidade de cada nação, fazendo um comparativo dos meios de produção, distribuição e consumo, com ênfase no elemento humano, buscando alcançar o melhor da experiência de cada país como caminho a percorrer na luta permanente em prol de condições mais justas, mais humanas e mais coerentes.

Não olvidamos que a integração entre culturas diversas e conhecimentos que se somam permitiu a inserção de inovações e invenções tecnológicas e científicas, com ampla repercussão nas relações de trabalho, em todo o mundo, sendo paradoxal o fato de que todos contribuem para a criação de novos meios e facilidades em toda a escala comercial e industrial e estes novos instrumentos acabam por gerar uma redução de vagas no mercado de trabalho.

Vemos diariamente as máquinas tomando o lugar dos homens, a exemplo do que se constata nos bancos, onde o chamado ?auto-atendimento? redundou na redução de cerca de três milhões de postos de trabalho, apenas nesta categoria específica bancária, significando a diminuição de cerca de 89% do número de empregados existente há uma década.

As benesses buscadas em decorrência do progresso científico-tecnológico haveriam de resultar em melhores condições de vida e existência para todos, também para aqueles que efetivamente contribuíram para tais realizações, e não como forma de destruição de vagas de trabalho.

Conscientes dessa realidade e de seu papel na constante busca da melhoria das condições de vida e de trabalho, os trabalhadores do Mercosul, representados neste Encontro pelas delegações compostas de dirigentes sindicais e de advogados trabalhistas da Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai, reunidos em Guaratuba, Paraná, afirmam suas preocupações e expectativas no aprimoramento da legislação de cada nação integrante do Mercosul a respeito das condições de trabalho e de salário, protegendo os empregos e permitindo que todos sejam beneficiários das realizações tecnológicas e não suas vítimas, instituindo normas que permitam aos trabalhadores dos países integrantes do bloco o direito ao emprego e a percepção de salários justos, suficientes a uma subsistência digna, com acesso à saúde, à educação e ao lazer.

A fim de efetivar a possibilidade de fruição de tais direitos, torna-se indispensável a redução semanal do trabalho, limitada a 40 horas, sem prejuízo dos salários, o que será naturalmente suportável pelo capital, mas com evidentes benefícios àqueles que, com seu esforço individual, são os reais construtores do progresso.

Democracia não é uma palavra vazia. É realidade que sobrevive quando substanciada por conteúdo social.

Os participantes deste I Encontro Internacional do Trabalho do Mercosul, cônscios de suas responsabilidades de preservar os valores sociais do trabalho e a dignidade da pessoa humana do trabalhador, se comprometem envidar todos os esforços no sentido de alcançar nos seus respectivos países a efetivação dessa realidade?.

Edésio Passos é advogado, ex-deputado federal (PT/PR).

E.mail: edesiopassos@terra.com.br

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