Educação religiosa numa sociedade pluralista

O XIV Congresso Estadual de Educação da AEC/PR, realizado este mês, teve como tema do primeiro dia de debates “A educação confessional em uma sociedade pluralista”.

O pluralismo é um fato incontestável em nossa sociedade e vai além do reconhecimento da pluralidade. Numa perspectiva antropológica, o pluralismo emerge da descoberta da pessoa como um “nó de relações”, fundando-se na convicção de que, qualquer que seja o grau de realidade de nossas idéias, a realidade sempre será maior que todas elas. E isto tem muito a ver com as religiões, especialmente no contexto de um projeto democrático. O pluralismo não é uma “anti-religião”. Ivan Illich aponta para o sentido de uma “laicidade” nova, que defende o espaço de liberdade de cada concepção, religiosa ou não, no contexto do Estado, na medida em que não entre em conflito com as exigências de uma sociedade democrática. Não se trata mais de opor os princípios laicos aos princípios religiosos, mas de afirmar valores universais válidos para todos.

O ponto de partida de uma visão religiosa (e educativa) pluralista deve ser a dignidade da pessoa, que abarca todos os outros valores de referência: tolerância, pluralismo, autenticidade, igualdade, e assim por diante. Ademais, o pluralismo implica uma adequada visão dos direitos humanos. A relação entre pluralismo, direitos humanos e religião é tão patente que se pode afirmar que os direitos humanos são essencialmente religiosos – não, por certo, no sentido da religião institucional, mas num sentido literalmente icônico: conectam as pessoas com algo maior que as transcende, evocando sentimentos de respeito e reverência, podendo até chegar a motivar pessoas a arriscar suas vidas por eles.

Por outro lado, há uma expectativa de que, em tempos de globalização, se intensifique o pluralismo religioso. Porém, percebem-se duas respostas possíveis: as religiões, tanto podem abraçar o mundo global, na compreensão de que somos todos solidários nessa grande aventura e na celebração da nossa diversidade cultural como riqueza, como podem resistir a ele, enfatizando suas particularidades distintivas e desenvolvendo respostas fundamentalistas, tornando intransponíveis as fronteiras e encapsulando a fé.

A realidade da diversidade religiosa é um fato do qual não se pode, hoje, esquivar. Alguém pode ser Budista, Cristão, Muçulmano, Judeu, Agnóstico, mas sempre estará diante da rica pluralidade de religiões, sendo necessário, no interior de sua própria crença, que a pessoa seja orientada acerca do relacionamento com as demais crenças. É o sentido da tolerância religiosa, mais amplo e profundo que o da simples liberdade religiosa, pois pressupõe compartilhamento de valores sem esconder diferenças. Num momento em que as forças globalizantes se esforçam por apagar os fatores de diferenciação, a possibilidade de conjugar a memória religiosa (e cultural) com a construção coletiva do futuro constitui uma decisão educativa de longo alcance.

A aceitação do pluralismo deve suscitar projetos educativos capazes de superar a atmosfera de um “relativismo pós-moderno” que faz tábula rasa das visões diferentes. Por paradoxal que possa parecer, o futuro de nossas sociedades pluralistas depende, em grande parte, do nosso respeito às fontes originais das identidades diversas. Daí porque o ensino religioso, numa sociedade pluralista, implica a construção de um projeto pedagógico que saiba aliar, de modo dialético, a expressão das identidades individuais com o respeito, acolhida e partilha das memórias coletivas diferentes.

* Teofilo Bacha Filho é vice-presidente do Conselho Estadual de Educação do Paraná.

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