Governo emite nova MP para substituir a 232

A tabela do Imposto de Renda Pessoa Física vai ser corrigida por meio de uma nova medida provisória. O texto irá revogar todos os outros pontos da medida provisória 232, como o aumento de tributo aos prestadores de serviços e o recolhimento na fonte do Imposto de Renda para produtores rurais. A decisão visa acabar com a disputa política no Congresso surgida após o governo anunciar na terça-feira que havia desistido de tentar aprovar a MP 232.

O anúncio foi feito ontem pelo líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT/SP) e o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. A nova MP seria assinada ainda ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Dessa forma, os prestadores de serviço, que passariam a pagar mais imposto a partir de abril, não terão mais que arcar com novos custos tributários. ?Está muito claro para o governo hoje que não há espaço na sociedade brasileira para aumentar a carga tributária?, disse o secretário-executivo.

No entanto, ele fez questão de ressaltar que o aumento da carga tributária – resultado da arrecadação total de impostos dividida pelo PIB (Produto Interno Bruto, ou soma das riquezas produzidas por um país) – ocorreu no governo anterior (FHC).

?O aumento da carga tributária no país ocorreu não foi neste governo. O aumento da carga tributária ocorreu no governo anterior, em que ela passou em 1994 de um nível pouco superior a 25% do PIB para quase 36% do PIB em 2002?, explicou.

Benefícios à tecnologia

Chinaglia anunciou ainda, ao lado do ministro em exercício da Fazenda, Bernard Appy, e do secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, as alterações do texto da Medida Provisória 232 que se transformará em um projeto de lei que será encaminhado ao Congresso Nacional. Entre as alterações, o líder anunciou a suspensão da cobrança de PIS/Cofins, imposto de importação e IPI para os regimes especiais de tributação para plataforma de exportações de tecnologia da informação na aquisição de máquinas, equipamentos e serviços voltados para o desenvolvimento de software e para a prestação de serviço da tecnologia da informação voltados à exportação.

Chinaglia disse que tais medidas devem aumentar a entrada de divisas de US$ 100 milhões de 2001 para US$ 2 bilhões em 2007, além da geração de 1 milhão de empregos diretos. ?Esta medida vai garantir a inserção do Brasil no mercado internacional de serviço de tecnologia da informação?, disse o líder.

O líder confirmou também que o governo vai retirar do texto o aumento da base de cálculo da CSLL para o setor de serviços. Por outro lado, o governo colocará no texto do projeto de lei a retenção na fonte de PIS/Cofins e CSLL para os setores de serviços e incluirá na lista de setores sujeito à retenção mais quatro segmentos: transporte rodoviário de carga, medicina, engenharia, publicidade e propaganda.

Chinaglia explicou que tal medida não se aplicará às pessoas jurídicas que estão no Simples. Desta forma, segundo o deputado, das 100 mil empresas rodoviárias de carga que existem no País, apenas 9 mil serão atingidas pela retenção antecipada desses impostos. De acordo com o deputado, 91 mil estão no regime do Simples, 6 mil recolhem impostos pelo lucro presumido e as outras 3 mil, pelo lucro real.

O líder lembrou que na MP 232 o setor de transporte rodoviário estava sendo tratado como um todo, enquanto o projeto de lei restringirá ao segmento de cargas. ?Sem aumentar a alíquota, estamos aumentando a base de contribuição em 30%?, disse.

Cortes

O secretário-executivo explicou que bimestralmente o governo avalia as despesas e receitas. Se for verificado que provisão de receitas não será cumprida, os cortes nas despesas não estão descartados. ?Se houver a perspectiva de não comprimento da meta de superávit, faremos os ajustes necessários?, disse.

A meta do superávit – receitas menos despesas, excluindo gastos com juros – é de 4,25% do PIB. No início do ano o governo já tinha anunciado um contingenciamento de R$ 15,9 bilhões nas despesas deste ano. ?Não existe a necessidade de fazer o ajuste de imediado. Mas existe o compromisso claro desse governo de, se for necessário, fazer esse ajuste (para o cumprimento da meta).? 

É preciso aprovar, para depois revogar

Para que o governo possa revogar parte da medida provisória 232, é preciso que ela exista, que tenha sido aprovada pelo Congresso Nacional. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não poderia revogar integralmente o texto e editar outro com parte do mesmo assunto ou com o mesmo texto da medida anterior.

Técnicos da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados explicaram que o STF (Supremo Tribunal Federal) entende que essa prática visa apenas burlar o prazo de vigência das medidas provisórias, que é de 120 dias. Pelo entendimento dos ministros do Supremo, se a medida fosse revogada para a apresentação de outra, o governo estaria usando um instrumento provisório de forma perpetuada.

Assim, a MP 232 será aprovada originalmente. A nova medida provisória, assinada ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tem força de lei e revoga os artigos da MP 232 que aumentaram a carga tributária. Depois de votada, a nova MP substituirá definitivamente a MP 232.

A vantagem da nova medida provisória é evitar a cobrança maior da CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), cuja base de cálculo subiria de 32% para 40%, o recolhimento na fonte de Imposto de Renda por produtores rurais e a cobrança de CSLL sobre investimentos no exterior.

O projeto que será enviado pelo governo ao Congresso retomará o recolhimento na fonte de IR, obrigará outros setores – engenharia, medicina, transporte de cargas e publicidade e propaganda a pagarem, também na fonte, PIS, Cofins, CSLL e IR e instituirá a cobrança da CSLL para investimentos no exterior.

Ganho do contribuinte não desaparece

A rejeição da MP (medida provisória) 232 não suspende a correção de 10% da tabela do Imposto de Renda da Pessoa Física, que está em vigor desde o dia 1.º de janeiro. A avaliação é do ex-secretário da Receita Federal do governo FHC Everardo Maciel. Segundo ele, as cláusulas pétreas da Constituição estabelecem a norma da anterioridade, vedando aumento de determinados tributos – entre eles o Imposto de Renda – no mesmo exercício financeiro que os instituiu. A elevação da carga só pode ocorrer no ano seguinte ao do estabelecimento da nova norma.

Dois ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) têm a mesma avaliação. Como poderão ter de julgar eventual ação sobre o assunto, eles falaram sem se identificar. Um deles disse que, como o governo não pode aumentar IR num mesmo ano por meio de lei, também não pode revogar lei -no caso da MP 232 – que resulte num aumento do Imposto de Renda.

?Por uma via oblíqua, a rejeição da MP 232 tem o efeito de aumentar tributo, desrespeitando o princípio da anterioridade?, declara Everardo, citando o artigo 150 da Constituição.

Na opinião do ex-secretário, com a derrubada da MP 232, bastaria a Receita Federal editar um ato declaratório confirmando o reajuste da tabela para que não houvesse um vazio normativo. ?Se a MP for rejeitada, a Receita precisará baixar o ato declaratório em qualquer hipótese, para manter ou não o reajuste. O cidadão comum precisa saber o que está valendo?, acrescentou.

Everardo lista ainda dois outros artigos da Constituição (62 e 67) para afirmar que a intenção do governo de enviar um projeto de lei restituindo a correção da tabela é juridicamente questionável.

Isso porque, na análise do ex-secretário, um tema tratado em medida provisória rejeitada não poderia ser reapresentado na mesma sessão legislativa.

?O assunto não pode ser reapresentado em uma nova MP. E a matéria rejeitada em projeto de lei só pode ser reapresentada se for uma proposta da maioria absoluta de qualquer das Casas. Nesse caso, a MP 232 não é um projeto de lei, mas precisou passar por um projeto?, argumentou.

Para Everardo, o melhor caminho para o governo, já que há a decisão de reajustar a tabela, é aprovar a MP de forma fracionada – mantendo a correção e rejeitando os demais pontos.

?Para que essa confusão jurídica enorme, uma vez que se optou por conceder o reajuste??, questiona ele.

Voltar ao topo