Governo anuncia salário mínimo de R$ 260,00

Após três semanas de negociações, o governo anunciou ontem que o novo valor do salário mínimo será de R$ 260 a partir do dia 1.º de maio. A informação foi confirmada pelo ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, após a sexta reunião consecutiva sobre o tema, no Palácio do Planalto. O reajuste representa um aumento de 8,3% em relação ao salário vigente, de R$ 240, e fica 1,73% acima da inflação – R$ 4 de aumento real. No ano passado, a correção foi de 1,23% acima da inflação.

Além do aumento do mínimo, o governo elevará o salário-família, de R$ 13,48 para R$ 20 – para quem recebe até um salário mínimo.

Com a confirmação do novo mínimo, prevaleceu a posição do braço econômico do governo. Nas diversas reuniões que teve nos últimos dias, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva chegou a defender que o valor deveria ser próximo a R$ 270. Durante sua campanha eleitoral, ele prometeu dobrar o valor real (acima da inflação) do mínimo.

A resistência a um aumento mais significativo partiu do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, que argumentava que um reajuste acima de R$ 260 causaria impacto negativo na Previdência Social e desequilibraria as contas das prefeituras do país.

Para definir o reajuste, Lula também enfrentou divergências entre os partidos que sustentam seu governo no Congresso e as centrais sindicais. O valor de R$ 260, aliás, frustra as pretensões dos sindicalistas, que defendiam até R$ 300.

O novo mínimo deverá ser alvo de protestos nas comemorações de 1.º de Maio (Dia do Trabalho) das duas principais centrais sindicais do país, a CUT (Central Única do Trabalhador) e a Força Sindical. Nesse dia, o presidente deverá participar da missa do trabalhador, em São Bernardo do Campo (ABC paulista).

Indústria considera que decisão foi responsável

A CNI (Confederação Nacional da Indústria) considerou que a elevação do salário mínimo de R$ 240 para R$ 260 a partir de 1.º de maio foi uma decisão “responsável” do governo.

Segundo a CNI, o aumento do salário mínimo terá pouco impacto sobre a indústria, porque a maioria das empresas já paga aos empregados vencimentos superiores a R$ 260.

“A fixação do salário mínimo traduz mais uma vez, a responsabilidade do governo no trato de questões muito sensíveis do setor público, como as contas da Previdência Social e o orçamento de muitas prefeituras”, afirmou o presidente da CNI, Armando Monteiro Neto.

Ele disse que é desejável que o País possa proporcionar uma remuneração maior para os trabalhadores, desde que isso não comprometa o equilíbrio das contas públicas e o processo de estabilização da economia.

“O presidente Lula definiu um valor para o salário mínimo compatível com a realidade fiscal do País.”

Impacto pequeno

O aumento do valor do salário mínimo ?de R$240 para R$ 260? tem impacto “muito pequeno” no setor industrial. A avaliação é do diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Fiesp (Federação das Indústrias no Estado de São Paulo), Claudio Vaz.

“O impacto maior será nas contas do governo, na Previdência”, afirmou. Ele considerou, porém, que em algumas cidades do Brasil, onde mais de 70% da renda é de aposentadoria, o reflexo desse aumento poderá ser relevante.

O diretor da Fiesp avalia que “não adianta o governo ser agradável com uma mão e carrasco com a outra”. Ou seja, o reajuste do salário mínimo não pode desequilibrar as contas publicas. “Se ele (o governo) entendeu que esse é o limite máximo (para o salário mínimo), como é que nós poderemos ser contra? O governo deve ter boas razões para isso.”

Políticos se dizem logrados com o anúncio

A bancada de oposição na Assembléia Legislativa ficou decepcionada com o anúncio do novo salário mínimo. “Nos deixa muito triste esse pequeno aumentou anunciado. Na verdade, a bancada de oposição está frustrada, pois o governo Lula assumiu o compromisso foi promessa de campanha que iria dobrar o valor de compra do salário mínimo até 2006, mas com esse anúncio ele está deixando de cumprir com sua palavra, assim como rompeu várias outras promessas”, destacou o líder da oposição, deputado Durval Amaral (PFL),

“O que nos deixa estarrecidos, é que o governo precisou de seis dias para anunciar esse aumento simbólico. Na verdade, descontada a inflação, tivemos um aumento real de apenas R$ 4. Isso frustra ainda mais a população brasileira, que viu seu poder de compra ser reduzido em 12% no primeiro ano do governo Lula. Ou seja, quem ganhava até um salário mínimo (R$ 240) passou a ganhar um pouco mais de R$ 211”, completou Durval.

O líder do PSB na Câmara Federal, deputado Renato Casagrande (ES), afirmou que o novo salário mínimo está abaixo do que esperava o seu partido – que pertence à base aliada do governo no Congresso. “O salário mínimo é uma bandeira das esquerdas, queremos que o governo tenha uma visão um pouco mais avançada sobre esse assunto”, entende Casagrande.

Bancos

A decisão do governo de reajustar o salário mínimo em R$ 20 ?para R$ 260, proporcionando um aumento mais significativo ao salário-família, foi ao encontro das expectativas dos economistas de instituições financeiras internacionais. Contudo, estimam que a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve cair.

“A iniciativa causaria um impacto fiscal menor, uma vez que 6 milhões de pessoas ganham o benefício familiar, contra os 14 milhões que recebem o salário mínimo”, avaliam os analistas da Merrill Lynch, Felipe Illanes e David Beker.

Além disso, como as aposentadorias estão ligadas ao mínimo, para cada R$ 1 de aumento, o déficit do INSS deteriora-se em cerca de R$ 130 milhões.

Por esse motivo, os analistas já previam em relatório que o governo não atenderia aos sindicatos, que pediam um salário entre R$ 280 e R$ 320.

Eleitor vai “dar o troco”

As principais lideranças dos partidos que fazem oposição ao governo Lula no Congresso adotaram discursos similares para criticar o reajuste do salário mínimo, que passará a valer R$ 260 a partir do próximo sábado.

“O único cargo que queremos é o seu, presidente, em 2006, pelo voto”, afirmou o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). “Peço ao senhor presidente que me prove que não pode dar mais que R$ 280. Se fizer isso, voto a favor do governo. Voto a favor do governo se ele (Lula) for à TV para fazer uma autocrítica e dizer que era delirante e cometeu um equívoco (ao criticar governos anteriores).”

“Felizmente, estamos numa democracia e faz sentido a contagem regressiva. Faltarão, a contar de 1.º de maio, 987 dias para o fim da experiência infeliz do governo Lula”, disse o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC). “Sem dúvida, em 2006 colocaremos fim aos fracassos e escândalos do governo Lula.”

“É necessário que o governo venha a público para fazer autocrítica ou falar que dava para dar um aumento maior e que é perverso e maus”, disse o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE).

Câmara

O líder do PFL na Câmara, deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA), afirmou que “o novo salário mínimo exige que o presidente Lula vá em cadeia nacional pedir desculpas à população”.

Expulso do PT no ano passado, o “ex-radical” da sigla, Babá, (sem partido-PA) disse que o anúncio “foi uma tentativa de se enganar a população”. “Continua o Lulinha paz e amor com os banqueiros e o Lulinha ódio no coração para os trabalhadores. É lamentável. Lula deveria pensar muito naquela vaia que levou em São Bernardo do Campo (SP) na semana passada. Ele deve estar levando hoje uma vaia de todos os trabalhadores do País.”

Centrais criticam novo valor

O presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Luiz Marinho, criticou o novo valor do salário mínimo de R$ 260, anunciado ontem pelo governo. A central cobrava um reajuste de R$ 240 para R$ 300. Ele considerou que o mínimo poderia subir para R$ 270 sem comprometer o orçamento federal.

“Acho que o presidente Lula perde a oportunidade de fazer o reajuste do salário mínimo no máximo que coubesse no orçamento. Se o máximo era R$ 270, deveria ser R$ 270, e não R$ 260”, disse Marinho.

O governo também elevou o salário-família de R$ 13,48 para R$ 20. O presidente da CUT considerou “erro” do governo a avaliação de que elevar o valor do salário-família e liberar recursos para investimentos em habitação e saneamento são medidas mais efetivas do que aumentar o salário mínimo dentro do permitido pelo orçamento.

Força Sindical critica

A segunda maior central sindical do país, a Força Sindical, divulgou nota oficial ontem criticando o reajuste do salário mínimo anunciado pelo governo (de R$ 240 passou para R$ 260) e exigiu que o valor seja elevado para R$ 320.

De acordo com a central, para cumprir sua promessa de campanha de dobrar o valor real (acima da inflação) do mínimo em quatro anos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve aumentá-lo em 33%, atingindo os R$ 320 reivindicados.

“A Força Sindical exige que o governo federal aumente o valor do salário mínimo para R 320. Defendemos este aumento porque esta é a única forma de o governo cumprir uma das promessas da campanha eleitoral”, diz a nota oficial. “O governo precisa ter sensibilidade e respeito com os trabalhadores. Um aumento digno é uma boa maneira de promover a distribuição de renda no País.”

OAB e CNBB consideram frustrante

A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), criticaram o reajuste do salário mínimo para R$ 260. Para o presidente da OAB, Roberto Busato, o anúncio feito ontem à tarde pelo governo “frustra”a população.

O presidente da CNBB, dom Geraldo Majella Agnelo, declarou que mesmo com o aumento, o povo permanece com fome. Ambos deram entrevista coletiva em Itaici, município de Indaiatuba (SP).

A OAB discute com a CNBB ações para combate à violência e à miséria no país. “É um momento que frustra mais uma vez a população mais humilde do país. O governo continua bastante sensível à ortodoxia da economia, ao que o Fundo Monetário Internacional preconiza, ao que os movimentos econômicos injustos impõem a este país, mas contrário à necessidade social do povo brasileiro”, disse Busato.

Dom Geraldo Majella afirmou que o valor novo salário mínimo mantém inalterada a situação de dificuldades da população brasileira. “O povo permanece do mesmo modo, com fome, sem emprego e com a remuneração que não lhe dá a possibilidade de um crescimento”, declarou. “Enquanto isso, há essa preocupação tão grande de não deixar os credores perderem seus ganhos, mas e o nosso povo, onde fica?”, disse.

Paim defende ação do Senado

Um dos principais defensores de um salário mínimo de R$ 300, o vice-presidente do Senado, Paulo Paim (PT-RS), disse estar frustrado com o reajuste anunciado pelo governo (de R$ 240 para R$ 260) e prometeu iniciar uma articulação para que o Congresso Nacional modifique esse valor.

Segundo Paim, a saída é criar uma comissão especial mista (Câmara e Senado) que fique encarregada de encontrar no Orçamento de 2004 fontes de recurso para financiar um reajuste maior. Se a idéia prosperar, a medida provisória que o governo enviará ao Congresso para aumentar o mínimo seria substituída pelo projeto aprovado pelos congressistas.

“Dá para fazer um bom entendimento entre a Câmara e o Senado para mudar o valor”, afirmou. “Foi decepcionante, frustrante (o aumento anunciado pelo governo). Tínhamos expectativa de R$ 300 ou próximo disso. Compete agora ao Congresso Nacional se articular e estabelecer um novo patamar.”

Pouco depois, em discurso no plenário da Casa, Paim disse não ter “a mínima condição de votar um salário mínimo de R$ 260”. Ele chegou a participar, a convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de uma das seis reuniões sobre o tema.

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