Ensinar o analfabeto é economicamente rentável

Rio  – Joelma Tayene da Costa interrompeu os estudos 11 anos atrás. Sem certidão de nascimento, não tinha como provar sua existência e regularizar a matrícula. Sueli Lins da Silva saiu da escola também em 1992, quando, aos 14 anos, engravidou pela primeira vez. Na mesma idade, Júlio César Bernardo do Nascimento parou de estudar e começou a trabalhar para ajudar a mãe, recém-separada de seu pai. Afastados abruptamente do cotidiano escolar, esses três jovens brasileiros entraram no século XXI sem saber ler e escrever. Hoje, tentam recuperar o tempo perdido numa sala de aula do projeto TransFormar, da Federação das Indústrias do Rio (Firjan), em São João de Meriti.

Alfabetizar Joelma, Sueli, Júlio e outros quase 11 milhões de jovens, adultos e idosos brasileiros afastados da escola por dramas pessoais, é socialmente justo. E economicamente rentável. Estudo recém-concluído pelos economistas Ricardo Paes de Barros, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e Mirela de Carvalho e Samuel Franco, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), estima que a erradicação do analfabetismo adicionaria R$ 3 bilhões à renda nacional todos os anos.

Os pesquisadores compararam indivíduos com características idênticas e descobriram que trabalhadores que sabem ler e escrever ganham de 25% (se aprenderam quando adultos) a 35% (na infância) a mais que os analfabetos, cujo rendimento médio não chegava a R$ 195 por mês em 2001, segundo dados do IBGE. O estudo foi apresentado ao ministro Cristovam Buarque, que numa de suas primeiras ações à frente da pasta da Educação criou a Secretaria Extraordinária de Erradicação do Analfabetismo. A meta é pôr fim ao problema nos próximos quatro anos.

“Alfabetizar também é extrair riqueza. O Brasil precisa aprender a fazer isso, da mesma forma que aprendeu a tirar petróleo do fundo do mar. O fim do analfabetismo teria impactos na saúde, na educação das crianças, na inserção no mercado de trabalho. Mas é também um investimento lucrativo. Se a rentabilidade é superior a 25% ao ano, só pode valer a pena investir nisso”, diz Paes de Barros.

Mesmo sem ter noção da estatística, o trio da Baixada Fluminense ratifica a conclusão. Aos 19 anos, Joelma perdeu a conta da humilhações que sofreu por não saber ler. Já foi dispensada de uma vaga numa fábrica de sorvetes e trabalhou como monitora de ônibus escolar por menos de meio salário mínimo. Agora, espera o documento de sua vida ficar pronto para concluir o Ensino Fundamental, passar pelo Médio, fazer o curso de Enfermagem, arrumar trabalho e, enfim, formar-se obstetra:

“Parar de estudar? Jamais”.

Sueli, de 23, festeja o privilégio de ajudar o filho do meio, de 7 anos, nos deveres da escola, enquanto sonha com o salário de R$ 500 no emprego de vendedora de loja que planeja conquistar ao fim do Ensino Médio. Mãe de três filhos, jamais conseguiu ganhar mais de um mínimo nos empregos que arrumou em restaurantes e pensões. Júlio, também de 23, já conta com a promoção na empresa em que trabalha como instalador de linhas telefônicas. Além disso, quer cursar Educação Física apenas para provar a si próprio que é capaz de realizar um desejo.

“O cerco estava se fechando para mim, mas agora que estou na escola, acredito que tudo vai mudar”, diz.

Mudou para o operador de máquinas Paulo Sérgio Lopes, de 42 anos. Desde que concluiu a quarta série do Ensino Fundamental, há dois anos, num programa desenvolvido pela empresa onde trabalha, a Apolo (fabricante de tubos e equipamentos de aço), Lopes viu seu salário passar do piso nacional para pouco mais de R$ 600. O colega Atlas da Silva Jerônimo, de 51, também já foi promovido e hoje ganha R$ 400.

“Ficou tudo diferente na minha vida. No trabalho e até em casa. Antes, eu não sabia nada”, diz Lopes, que está na sexta série e promete estudar enquanto viver.

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