É, ou não é?

Diz o ministro José Dirceu, da Casa Civil, que, com a reformas concluídas, o Brasil estará apto a crescer. Isso não vai acontecer este ano, entretanto. A nova data é julho do ano que vem. Até lá, renovem-se os estoques de pão e água. “Precisamos virar a página das reformas e partir para outra agenda”, disse o ministro a um grupo de parlamentares nordestinos amotinados em busca da liberação de escassos recursos do orçamento. O Brasil precisa gerar empregos, resolver o problema da habitação, da segurança pública e o problema agrário. Mais: é preciso acelerar os investimentos e distribuir renda para fortalecer o mercado interno e, assim, criar certas imunidades contra crises externas…

Certo. Faz tempo que o País está esperando por tudo isso. E com muita ansiedade. O presidente Lula havia dito que o espetáculo do crescimento começaria ainda em julho. A data escolhida já foi para refazer esperanças perdidas ao cabo de quase seis meses de governo. Depois o Planalto inventou outra data. No fim do ano, talvez. Ou, melhor, no comecinho do outro. Acabou-se o tempo das vacas magras, garantiu o presidente num célebre improviso que agradou à nação inteira, ávida pelo espetáculo prometido. Agora, Dirceu já diz que “não são nove meses, não, são de seis a dezoito meses”. O período de gestação sempre referido por Lula é, portanto, variável e o nascituro poderá ser um natimorto. Lambemo-nos os dedos: “Às vezes, acho que é quase um milagre ter chegado até aqui”, garante o ministro que mais manda no governo.

Outro ministro que manda bastante – o da Fazenda, Antônio Palocci Filho – no mesmo dia era sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Sete horas de bombardeio e alguma discussão inútil acerca do passado, como se críticas ao que já foi fizesse melhor o que agora é. E para esse outro ministro – a surpresa é nossa! – as coisas estão acontecendo no momento errado. Este é o pior momento para uma reforma tributária ampla, garantiu ele.

Aparentemente estranha, realmente, é essa falta de nexo entre o que diz um e o que afirma outro. O que diz Dirceu condiciona nosso futuro à reforma. O que afirma Palocci manda para as calendas a reforma que já tem mais cara de remendo. Mas se o Brasil depende das reformas (e a principal é a tributária, sempre foi dito isso) para começar a crescer, por qual motivo Palocci mudou de idéia e passou a defender outro remendo no sistema tributário em lugar de uma reforma ampla, funda e justa para mais ajudar em nosso crescimento?

Alguns senadores quiseram saber se a conversas da reforma tributária não era apenas um biombo para esconder a prorrogação da CPMF – o famigerado imposto do cheque. Palocci disse que não. Mas garantiu que para o governo é mais interessante que algumas mudanças tributárias sejam operadas por decreto, sem a mudança de dispositivos constitucionais, conforme consta do projeto atualmente. Entre essas mudanças estaria o fim da cumulatividade da Cofins e a redução do IPI sobre bens de capital. “Não queremos atropelar o processo – disse Palocci – mas gostaríamos de enviar essas propostas antes de concluir a votação da reforma.”

Ora, é ou não é importante a reforma tributária, como sempre disse o presidente Lula, desde que subiu a rampa do Planalto? Ou também esse faz-de-conta estava no script, como a repetir a representação também feita pelos dois períodos do governo anterior que, subindo impostos existentes, criando outros e congelando tabelas por decreto, postergou a reforma e elevou a carga tributária a níveis que o governo atual critica, mas não se dispõe a baixar? Aliás, quer elevá-la… Autoriza a pensar assim uma resposta do próprio ministro Palocci, segundo a qual nem aqui, nem na China, no Japão ou em qualquer parte do mundo alguém reforma tributos sem deixar aberta a porta da escada que sobe…

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