Do dispositivo da sentença e acórdão

1. O dispositivo da sentença ou acórdão é a conclusão, a decisão ou parte final; enfim, o desfecho da demanda, onde aplicando a lei ao caso concreto, o julgador acolhe ou rejeita o pedido formulado pela parte.

2. De suma importância o dispositivo da sentença ou do acórdão, porque contém a prestação da tutela jurisdicional buscada e que propiciará ao vencedor, principalmente no caso de acolhida de pedido condenatório, a execução da sentença. Os pedidos declaratórios e constitutivos não comportam liquidação de sentença.

3. Daí a necessidade de que a decisão seja clara, possibilitando o fácil entendimento da conclusão a que se chegou, bem como abrangente, ou seja, incluindo todos os pedidos formulados e acessórios conseqüentes.

4. Na casuística observamos casos comuns de inobservância dos preceitos mencionados. Vejamos:

4.1. Juros. Muito comum a confusão na incidência de juros quanto ao índice e início de sua incidência. No Código Civil de 1916 como preceito geral aplicam-se os juros legais de 6% ao ano e contam-se a partir da citação (art. 1.062). No Código Civil de 2002, o art. 402 estabelece: “Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.” Regra que por certo causará polêmica nos tribunais, considerando que atualmente se aplica a Taxa Selic para os impostos devidos à Fazenda Nacional (art. 13 da Lei 9.065/95), embora haja divergência de interpretação sobre sua legalidade, uma vez que engloba juros e correção monetária. Existem precedentes do STJ no sentido que inadmissível a cumulação de correção monetária e taxa Selic (Resp 542.221-PR; AGRESP 210.554/PR). Contam-se os juros moratórios também na culpa contratual a partir da citação pelo novo Código Civil (art. 405).

Exceções. Nos atos ilícitos por culpa extracontratual os juros incidem a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ) e art. 398 do Código Civil de 2002, por exemplo, responsabilidade civil decorrente de acidente de veículos; na culpa contratual aplica-se a regra geral (da citação), porém, nas obrigações líquidas a partir do vencimento da obrigação, se houver (Código Civil de 1916, art. 960 e Código Civil de 2002, art. 397); observe-se, também, que os juros compostos (capitalizados), previstos no art. 1.544 do Código Civil de 1916 só se aplicam contra aquele que praticou o crime (Súmula 186/STJ) e não existe disposição análoga no Código Civil de 2002.

Em termos de matéria tributária os juros moratórios são de 1% ao mês ou 12% ao ano, conforme art. 161, parágrafo único, do Código Tributário Nacional. Na repetição de indébito tributário aplica-se por analogia a mesma regra, contudo, recaem a partir do trânsito em julgado (Súmula 188/STJ).

Na desapropriação direta e indireta os juros moratórios de 6% ao ano e os compensatórios de 12% ao ano, encontram-se sumulados (Verbetes 12, 56, 69, 70, 102, 113 e 114/ STJ). Agora pela Medida Provisória nº 2.183 os juros compensatórios passaram a ser de 6% ao ano. A aludida MP alterou vários dispositivos do Decreto-Lei 3365, de 21-6-1941 (Lei de Desapropriação).

Quanto aos benefícios previdenciários os juros de mora de 6% ao ano contam-se da citação ( S. 204/STJ).

4.2. Correção Monetária. Outro aspecto importante para a fase de execução de sentença é a definição da correção monetária quanto ao seu início e o respectivo indexador.

Hoje via de regra incide a atualização monetária a partir do efetivo prejuízo no ilícito contratual ou extracontratual (Súmula 43/STJ). Na repetição de indébito tributário incide a partir do pagamento indevido (Súmula 162/STJ).

4.3. Indexador. Quanto ao indexador a ser utilizado necessário estar atento ao período da obrigação. Nas obrigações atuais, aplica-se via de regra o INPC do IBGE e nas antigas, devido aos sucessivos Planos Econômicos, índices diversos. A Súmula 41 do TRF da 1.ª Região, resume bem a matéria: “Os índices integrais de correção monetária, incluídos os expurgos inflacionários, a serem aplicados na execução de sentença, ainda que nela não haja previsão expressa, são de 42,72% em janeiro de 1989, 10,14% em fevereiro de 1989, 84,32% em março de 1990, 44,80 em abril de 1990, 7,87% em maio de 1990 e 21,87% em fevereiro de 1991.ª Nos créditos rurais por exceção aplica-se no mês de março/90 o BTN com índice de 41,28% no lugar do IPC.

A TR – Taxa Referencial de Juros apenas pode ser utilizada como indexador, quando convencionada pelas partes.

4.4. Pensão. Nas ações de indenização por ato ilícito que envolvem questão de pensão à vítima ou beneficiários necessário definir o termo inicial e final. Como princípio geral devida desde o evento danoso até a idade provável da vítima (65 anos de idade); se a vítima sobreviveu e ficou incapacitada parcial ou totalmente, a pensão deve ser paga enquanto viver, vale dizer, a pensão é vitalícia.

No caso de vítima menor de família não abastada, de acordo com nova orientação do STJ (REsps 147.075-MG; 220.234-SP e 160.970-SP), a pensão arbitrada deve ser integral desde os 14 anos (Constituição Federal, art. 7.º, XXXIII) até os 25 anos (idade provável do casamento), reduzindo-se então pela metade (há julgados entendendo que se reduzem a 1/3, como Resp 172.335-SP) e até os 65 anos de idade da vítima, desde que sobrevivam os beneficiários.

Na ação de investigação de paternidade, cumulada com alimentos, existe dissídio sobre o início da pensão alimentícia, se da citação ou da sentença. Prevalece no STJ o entendimento da primeira corrente (RSTJ, 26:306).

4.5. Dano Moral. Não se pode esquecer que inadmissível a fixação do dano moral em salários mínimos, como decidiu o Supremo Tribunal Federal (RE n.º 225.488-PR, 1.ª Turma do Supremo Tribunal Federal, rel. Min. Moreira Alves, DJU de 16-6-2000, p. 39). Deve ser fixado em quantia certa, com atualização monetária a partir de data da sentença ou acórdão e acrescida de juros moratórios a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ).

4.6. Honorários advocatícios. Tema que o julgador deve estar atento na parte dispositiva, inclusive quanto à sucumbência recíproca e ao conceito de perda mínima do pedido (CPC, art. 21). O conceito de perda mínima quer dizer parte irrelevante ou insignificante do ponto de vista econômico. Arruda Alvim fornece bom conceito (Código de Processo Civil Comentado, RT, 1975, vol. 2, p. 195). Na maioria dos casos perdas de até 5% consideram-se mínimas. Nas sentenças condenatórias os honorários advocatícios incidem sobre o valor da condenação e nunca sobre o valor da causa. Nas declaratórias e constitutivas arbitram-se em quantia certa, com apreciação eqüitativa do juiz (CPC, art. 20, § 4.º). Outrossim, observar o princípio da causalidade, ou seja, de quem deu causa ao ajuizamento da demanda responde pelas verbas de sucumbência. Nas ações previdenciárias não recaem sobre prestações vincendas (Súmula 111/STJ) e nas desapropriações observar Súmulas 131 e 141/STJ. Não podem ser fixados em salários mínimos (Súmula 201/STJ). Impõe-se a condenação do beneficiário da justiça gratuita nas verbas de sucumbência, mas que só poderão ser executadas, se comprovado que ele perdeu a condição de necessitado (arts. 11 e 12 da Lei 1.060/50), antes de consumada a prescrição, conforme entendimento majoritário do STJ. Firmou a Corte Especial do STJ entendimento de que não é computável, para efeito de cálculo de honorários advocatícios de sucumbência, a verba necessária à constituição de capital para assegurar o pagamento de prestações futuras de pensão, conforme art. 20, § 5.º, do CPC (Resp 249.728/RJ).

5. Forma de liquidação. Enunciar a forma de liquidação da sentença: por memória discriminada do credor (art. 604), por arbitramento (art. 607) ou por artigos (art. 608, todos do CPC).

6. Duplo grau de jurisdição. Cabe ao juiz observar a regra do art. 475 do Código de Processo Civil, determinando a remessa dos autos ao tribunal competente, haja ou não recurso voluntário, nas hipóteses ali previstas, bem como observar que após o advento da Lei 9.469, de 10-7-97, aplica-se o referido dispositivo às autarquias e fundações públicas. No mandado de segurança quando concedida a ordem também se impõe o reexame necessário (art. 12, § único, da Lei 1.533/51). A Lei nº 10.352, de 26-12-2001 restringiu o cabimento do reexame necessário (condenação de valor não excedente a 60 SM e jurisprudência do Pleno do STF ou Súmula de Tribunais Superiores), conforme §§ 2.º e 3.º, do art. 475.

7. No segundo grau de jurisdição, principalmente quando julgado improcedente o pedido inicial e o tribunal dá provimento ao recurso julgando procedente aquele, muitos relatores deixam de fazer a parte dispositiva completa no acórdão, o que causa evidente prejuízo às partes na liquidação de sentença. Não se pode apenas dizer que se dá provimento ao recurso, com inversão do ônus da sucumbência. Imprescindível, pois, a conclusão do dispositivo com todos os seus requisitos, como se sentença fosse. Aliás, se o juiz fixou, no caso de improcedência do pedido inicial, honorários advocatícios sobre o valor da causa e o tribunal dando provimento julga procedente o pedido inicial, de cunho condenatório, impõe-se observar que a verba honorária incide sobre o valor da condenação.

8. Não se pode esquecer também a importância do dispositivo da sentença para a formação da coisa julgada (Humberto Theodoro Junior, Revista de Processo, RT, vol. 81:82).

9. Conclusão. Do exposto, vê-se a relevância da especificação na parte dispositiva do julgado dos acessórios (juros, correção monetária, indexador, termo inicial e final das verbas, como pensões, honorários advocatícios). Incumbe ao julgador na parte dispositiva da sentença ou acórdão realizar, uma conclusão lógica, clara e abrangente para a formação da coisa julgada, evitando incidentes processuais, nova decisão em fase de liquidação de sentença e conseqüente desafio de outro recurso, contribuindo assim para uma melhor prestação da tutela jurisdicional e velando pela rápida solução do litígio (CPC, art. 125, II). Ao advogado, por sua vez, incumbe formular pedidos completos, claros e objetivos, bem como fiscalizar os julgados, para garantia plena dos direitos e interesses de seus clientes.

Lauro Laertes de Oliveira

é Juiz do Tribunal de Alçada do Paraná.

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