Denuncismo maldito

Se a voz do povo é a voz de Deus, é bom que ela se expresse com lucidez, sob pena de mais parecer coisa do capeta. Neste ano eleitoral, políticos, marqueteiros e caluniadores descobriram que é fácil distorcer o tom dessa voz e o seu sentido, espalhando sobre candidatos suspeitas infundadas, porém suficientes para retirar-lhes as preferências do eleitorado. Ou até derrotá-los, quando não houver mais tempo para desmentidos convincentes. Neste período pré-eleitoral, os candidatos que despontam, seus partidos, amigos, ex-amigos, sócios e ex-sócios, correligionários, parentes ou mesmo simples conhecidos, são objeto de um desbragado e irresponsável denuncismo, que, uma vez ganhando as ruas, vai conquistando coloração de verdade. Busca-se eliminar concorrentes, espremendo o eleitor entre o desejo de expurgar da vida pública os desonestos e sua justa ambição de eleger os melhores.

Nenhum dos pré-candidatos à Presidência da República escapou, até agora, desse maldito denuncismo. Começou por Roseana Sarney, contra a qual, até agora, surgiram as únicas denúncias fundadas em fatos que carecem de sérias investigações. Tanto que ela renunciou. Contra Lula e Serra, denúncias pessoais inexistem. Mas não escapam correligionários deles, nem amigos, ex-amigos, colegas e ex-colegas, contraparentes, etc. Sempre se diz de um e outro que fatos ocorreram, às vezes há muitos anos, em que foram suspeitas pessoas que com eles mantinham ou mantém alguma relação, mesmo que seja a de correligionários. Em alguns casos, as denúncias aparecem com fundamentação que não deve ser desprezada, mas que está longe de atingir os próprios candidatos.

Homens como Lula e Serra, que estão na vida pública há muitos anos, com certeza um dia tiveram em seus círculos de relações pessoas que praticaram atos que poderiam ser objeto de reprimendas ou até condenações. Mas, daí a tentarem atingir os próprios candidatos vai uma forte dose de maledicência que não é justo venha a implantar na opinião pública dúvidas sobre eles mesmos.

O próprio presidente Fernando Henrique Cardoso está preocupado com essa prática de denuncismo irresponsável, porque colabora para aumentar as turbulências no mercado, em especial no mercado financeiro internacional do qual ainda dependemos em larga escala e precisamos que continue confiando no Brasil. No de hoje e no Brasil com um novo governo, seja quem for o eleito. Isto porque o mercado também leva em conta o bom conceito dos candidatos, mais ainda dos que aparecem com chances de vitória.

Em recente pronunciamento feito no exterior, FHC disse que todos os candidatos à sua sucessão são progressistas. Em outra oportunidade, foi além considerando-os homens de bem. Sabe-se que ele apóia José Serra, mas preocupa-se com a imagem do País e, pelo que tudo indica, admite que seu preferido não seja o eleito.

Temos de distinguir esse irresponsável “denuncismo” da obrigação de apurar denúncias fundadas contra quem quer que seja, pois o povo brasileiro reclama o fim da impunidade, principalmente de políticos e outros colarinhos brancos. Mas é preciso cuidado, neste ano de eleições, para não permitir que às denúncias se misture a maledicência com o único fim de confundir a opinião pública e alterar suas preferências. O brasileiro tem de estar suficiente e honestamente informado para eleger os melhores.

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