De saia justa

Inexperiência, prepotência ou impotência, talvez todos esses ingredientes unidos, deixaram o governo de saia justa no último, porém não derradeiro episódio do apagão aéreo. Enquanto o presidente Lula passeava no carrinho de golfe do presidente Bush e com ele perpassava assuntos como os problemas que temos com os Estados Unidos na Organização Mundial do Comércio e os planos de uma política comum no campo da produção e comercialização de energia limpa, no Brasil parava totalmente o tráfego aéreo. O motivo imediato era o movimento grevista dos controladores de vôo. E as causas mediatas, a incúria deste e de governos anteriores que não cuidaram com seriedade do sistema aéreo a ponto de levá-lo a um colapso.

Lula deu ordens enérgicas para que tudo fosse solucionado de pronto. E do governo surgiram ameaças de demissões, punições e o que mais fosse permitido pelo autoritarismo de quem, por incúria, não conseguiria exercer sua autoridade.

A inexperiência fez com que, a distância, Lula mandasse não punir os grevistas. E fê-lo através do ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, um civil, quando o controle dos vôos, exercido por profissionais civis e militares, é um serviço subordinado à Aeronáutica. Chegamos à beira de uma crise militar, pois o comandante da Força Aérea Brasileira, brigadeiro Juniti Saito, teria se sentido desautorizado e teve, desde logo, a solidariedade dos chefes das demais armas. O presidente manda, depois desmanda e veste saia justa ao entregar o problema a um civil, quando se tratava de assunto da alçada militar. E as Forças Armadas, como é sabido, têm um inabalável apreço pela hierarquia.

Ficou decidido, na intermediação de Paulo Bernardo, que o governo criaria um órgão civil para tratar do controle dos vôos e o setor seria desmilitarizado. Seria, será, mas ainda não foi e, portanto, não se pode colocar o carro na frente dos bois. O perdão aos grevistas, prometido por Lula, acabou num discurso pouco convincente no rádio. O presidente, tão logo voltou ao Brasil e deu-se conta da verdadeira situação e da fragilidade de sua posição, condenou veemente o movimento paralisatório num setor essencial. É greve no serviço público e em setor essencial. Está com razão, mas isso não impede que seja detectada sua incoerência. Estava voltando atrás dois dias depois de haver prometido complacência para com os grevistas.

Felizmente temos uma instituição chamada Ministério Público. E o Ministério Público Militar, seguindo a legislação pertinente, encontrou crimes no movimento de greve e punibilidade contra os controladores de vôo militares. Os civis, de sua parte, declararam-se em estado de greve, mas voltaram, com os militares, ao trabalho.

Continua tudo numa situação precária. Há descontentamento nas Forças Armadas, um processo contra os controladores militares começando, um estado de greve dos controladores civis, uma CPI na Câmara pendente de decisão do Supremo Tribunal Federal, que, liminarmente, a considerou legítima, apesar da oposição do PT e do resto do governo.

Como vai desdobrar-se politicamente esta batalha, ainda não sabemos. Mas existem fundadas esperanças de que tudo acabe em paz. Mas os problemas do apagão aéreo, com aviões não subindo, não descendo e passageiros revoltados nos aeroportos, muito provavelmente irão continuar. O fato inconteste é que para problemas de quem manda e quem tem de obedecer são solucionáveis. O que faltam são recursos materiais e humanos para pôr em ordem o sucateado sistema de navegação aérea.

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