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“Eu não vou ajudar drogado”. Comunidade terapêutica sofre com preconceito e pede ajuda

Comunidade Terapêutica para Dependentes Químicos Perpétuo Socorro, em Quatro Barras. Foto: Jonathan Campos / Arquivo

As instituições terapêuticas que atendem dependentes químicos em Curitiba, no trabalho de recuperação do uso de álcool e drogas, precisam de doações para manter as suas atividades. Com a pandemia de coronavírus (covid-19), as colaborações com doações de roupas, materiais de limpeza e até mesmo as contribuições financeiras praticamente pararam.

Além disso, o preconceito – como na frase do título, muito ouvida por quem trabalha com dependentes químicos – torna tudo mais difícil.

Ao mesmo tempo, a procura pelo tratamento aumentou, principalmente das pessoas mais necessitadas, como as que estão em situação de rua e não têm como pagar pelo apoio. Instituições renomadas como a Comunidade Terapêutica Redentorista – Chácara Nossa Senhora do Perpétuo Socorro chegam a recusar cerca de dez atendimentos por dia, por falta de vagas e recursos. A situação preocupa os gestores, que alertam sobre o “impacto devastador” que as drogas e o álcool provocam na sociedade.

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Segundo Marcelo Fortunatto, gestor da Perpétuo Socorro, a principal fonte de recursos da comunidade terapêutica é o Santuário de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, no Alto da Glória, mas não tem sido fácil se manter com a pandemia e os decretos municipais que restringem as missas a poucos fiéis.

“É uma situação preocupante. As doações diminuíram muito e, por mais que a área financeira não seja o foco do nosso trabalho, a instituição carece de recursos para manter as portas abertas e acolher a quem precisa. Tem comida, material de limpeza. Isso custa dinheiro. E o que fazemos faz a diferença na sociedade, tem o impacto positivo lá na frente. Precisamos de apoio”, explica o gestor.

A assistente social Rosemari Helvig, do Projeto Fazendo Diferença (FAZDI), instituição que há 20 anos acolhe dependentes químicos em situação de rua, conta que o pior momento de impacto da pandemia tem sido sentido neste ano de 2021. “Apesar da crise em 2020, ainda conseguimos parcerias e apoio das esferas governamentais e de projetos que abriram pela internet. Mas agora, percebemos que os nossos parceiros, que nos apoiam e sempre doaram, também estão com certa dificuldade”, revela a Rosemari Helvig.

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Além disso, a assistente social destaca a batalha constante contra a rejeição social que recai sobre as comunidades terapêuticas que trabalham com adultos em condições de dependência do álcool e das drogas, as chamadas Organizações da Sociedade Civil (OSC).

“Mesmo antes da pandemia, a gente já sofria por ser OSC, já sofria por causa do público que atendemos. Discriminação, preconceito, dificuldade de acesso a convênios e doações. Quando a gente se apresenta, vem a questão do estigma dessas pessoas. Só que esse pensamento precisa mudar”, ressalta. “Esse dependente precisa de apoio para ser reinserido na sociedade, ter documentos, assistência social, acesso à educação e à saúde”, completa a Rosemari.

“Se não fosse a Perpétuo, não recuperava minha vida”

As aspas são do marceneiro João Alexandre da Silva Filho, 40 anos. Ele conta que a instituição Perpétuo Socorro o ajudou a ter uma nova vida social, espiritual e familiar. “Devido ao uso do álcool e das drogas, fui destruído e acabei indo morar nas ruas. Perdi meu emprego, perdi minha família. Fui casado por 18 anos, tenho dois filhos e minha família se afastou de mim”, relata Silva, que iniciou a recuperação no dia 11 de julho de 2020 e teve a conclusão no dia 11 de abril deste ano.

“Isso, pra mim, foi uma bênção na minha vida. Graças a esse acolhimento, sou uma nova pessoa, tenho um motivo pra viver de novo, limpo e em sobriedade. Graças a Deus. Por isso, acho que é importante que as pessoas ajudem a comunidade, continuem colaborando”, diz.

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O gestor Marcelo Fortunatto destaca a história de Silva como vitoriosa em meio a tantas desistências de viver e tanto preconceito com os dependentes químicos. “Ele tem um talento fantástico para a marcenaria. Com a dependência, o João Alexandre não tinha forças para trabalhar. Agora, eu mesmo contratei o serviço dele na minha casa, para também dar a oportunidade da reinserção”, ressalta Fortunatto.

Para o marceneiro, a chance da retomada profissional começou ainda durante o tratamento. “Dentro da comunidade, eles me deram a oportunidade de voltar pra minha área de trabalho. Marcenaria é o que sempre trabalhei, já vem do meu pai. Então, pude assumir trabalhos internos e externos. Agora, com o término do tratamento, quero conseguir emprego e dar continuidade na minha vida”, planeja Silva.

Fortunatto diz que a importância das doações se reflete aí. “Dar mais qualidade de vida para o acolhido”, aponta. “Se a comunidade não tiver a condição de atendê-lo, ele vai sair vazio, assim como entrou. Queremos ver a pessoa bem. E para tratar uma doença é preciso método. Isso tem um custo. Tudo isso tem um valor agregado muito grande e na pandemia foi mais difícil para trabalhar. Mas se as pessoas ajudarem, o reflexo positivo chegará para toda a sociedade”, destaca.

Marcelo Fortunatto, gestor da Perpétuo Socorro, diz que as doações diminuíram muito. Foto: Lineu Filho

Ainda segundo o gestor, a procura por ajuda aumentou muito na pandemia. “Muita gente buscando. Temos quase 50 dispensas por semana porque não conseguimos atender. A pessoa em situação de rua, geralmente, vem mais na época de frio. Com a pandemia, a busca pela nossa ajuda foi quase que integral. O consumo de álcool cresceu, o uso de drogas e as doenças ligadas à mente também. Só muito amor e ajuda para poder dar conta”, pede Fortunatto.

Para ajudar

O Instituto GRPCom possui projetos de apoio e parcerias que auxiliam instituições terapêuticas em Curitiba. Quem quiser colaborar pode entrar em contato com o instituto pelo telefone (41) 3340-7922 ou acessar o site institutogrpcom.org.br.