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Casos de giárdia em cães e gatos preocupam veterinários em Curitiba: Risco pode estar na água

Casos de giárdia preocupam veterinários em Curitiba. Foto: Lineu Filho/Tribuna do Paraná.

Os médicos veterinários de Curitiba estão preocupados com o aumento no número de casos de uma doença que pode levar os pets à morte e ainda atingir as pessoas. A giardíase ataca o intestino delgado, causando distúrbios intestinais e a qualidade da água é apontada como um possível fator da doença, o que é descartado pela Sanepar. No entanto, não se despreza a possibilidade que perfurações e contratações de caminhões-pipa irregulares utilizados neste período de estiagem possam estar levando esta doença para dentro de casa.

O que é Giardíase?

O alerta chegou nas redes sociais com depoimentos de médicos veterinários ou em comunidades dedicadas a cães e gatos, mas o que é a giardíase? Trata-se de uma doença parasitária causada pelo protozoário Giardia lamblia. A infecção ocorre principalmente quando a pessoa ou animal tem contato com cistos do protozoário que podem vir de várias formas, como de um alimento contaminado, água sem o devido tratamento ou até das fezes de um cachorro que vive na rua. Inclusive, antigamente se falava que os animais pegavam a doença em cemitérios ou mesmo ao tomar a água de uma poça. Os principais sintomas são a diarreia e desidratação, o que pode levar os animais à morte.

A doença sempre existiu, mas nos últimos três meses as clinicas veterinárias de Curitiba notaram que os casos de giardíase aumentaram de maneira assustadora na cidade. Na clínica São Geraldo, no bairro Cristo Rei, a frequência mensal de casos era de, no máximo, 15 atendimentos para este tipo de doença. Já no último mês foram 60, ou seja, quadruplicou o número de doentes.

A veterinária Liédge Felicio conta que os casos da doença quadruplicaram em sua clínica. Foto: Lineu Filho/Tribuna do Paraná.

Liédge Camila Simioni Felicio, 32 anos, é medica veterinária da São Geraldo e professora da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). Responsável por uma polêmica postagem nas redes sociais em que alertou os donos dos animais sobre um possível surto de giárdia, Liédge acredita que o momento é de atenção e cuidado com a água que é disponibilizada aos pets.

“A giárdia sempre foi frequente na clínica, pois os animais tomam água da rua ou mesmo as pessoas não tem o costume de filtrar a água para os animais e colocam direto da torneira. A doença é muito confundida com outras gastroenterites ou se faz a relação de um alimento não caiu bem para o animal. Inicia com a diarreia seguida de dores abdominais e pode ter vômito. A diarreia tem muco e sangue. A falta de apetite e a desidratação pode levar o animal a morte”, relatou Liédge.

Cristiane passou por momentos complicados com a Chele, uma yorkshire de 4 anos, diagnosticada com giárdia. Foto: Arquivo Pessoal.

A enfermeira Cristiane Doell, 51 anos, tem na sua residência no bairro Portão, em Curitiba, seis cachorros. Em um certo dia percebeu que a Chele, um yorkshire de 4 anos, não estava bem, pois tinha vomitado pela manhã e apresentava diarreia. “Pensei que era uma gastroenterite, pois ela começou a vomitar e depois teve uma diarreia com fezes escuras. Dei soro e imaginei que fosse o estômago. Ao longo do dia, as fezes apresentaram sangue e entrei em contato com a veterinária. Exames a diagnosticaram com giárdia. Ficou internada por dois dias e ainda bem que verifiquei o problema cedo. Hoje ela está bem”, comentou a dona da Chele.

Bairros com maior incidência de giardíase em gatos

Levantamento feito pela veterinária Patrícia Montaño mostra as ocorrências da doença segundo atendimentos feitos por ela. Foto: Reprodução.

É difícil apontar a quantidade de casos confirmados de giardíase em Curitiba. Apesar disto, a médica veterinária Patrícia Montaño, 35 anos, especializada em felinos produziu um levantamento no mês de julho com os bairros de maior incidência da doença levando em conta atendimentos feitos nas casas das pessoas. Bairros como Ahu, Alto da XV, Bigorrilho, São Francisco, Batel, Centro, Cajuru, Guabirotuba, Guaíra, Portão, Vila Isabel, Santa Quitéria e Rebouças são os campeões de casos em gatos.

“Este levantamento surgiu com o objetivo de avaliar se existia algum foco ou algo mais localizado até para chamar a atenção das autoridades sobre este volume de casos. Este mapa é de julho, mas segue igual até hoje. O estranho é que atendo gatos de apartamento e que não saem para passear. Na minha opinião, podemos estar tendo um surto em Curitiba e na região metropolitana”, ressaltou Montaño.

Ao fazer o estudo, Patrícia procurou o Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV), órgão que regulamenta a profissão e dá suporte aos associados. Ao ser informado do problema, o CRMV buscou a Sanepar para saber se estava tendo algum tipo de problema na água nos bairros citados pelo estudo de Patrícia.

Sanepar garante pureza

Em nota enviada para a Tribuna do Paraná, a empresa paranaense responsável pelo abastecimento de água no Paraná informou que os sistemas de abastecimento de água que utilizam mananciais superficiais devem realizar monitoramento mensal de Escherichia coli (bactéria) nos pontos de captação de água e quando for identificada média geométrica anual maior ou igual a 1.000 Escherichia coli/100mL deve-se realizar monitoramento de cistos de Giardia spp. e oocistos de Cryptosporidium spp. nos pontos de captação de água.

Segundo a Sanepar, os resultados das análises de E.coli nos pontos de captação que abastecem as regiões indicadas pelo CRMV, não tiveram média geométrica maior que 1000 EC/100mL, indicando que não há necessidade do monitoramento de protozoários na saída dos filtros, mas mesmo assim, há dois meses, a Sanepar faz essa análise preventiva.

Ainda na nota, a Sanepar fez um alerta importante neste período de estiagem, o maior da história do Paraná. “Deve-se levar em consideração que muitos condomínios em Curitiba são abastecidos por poços artesianos, ou recentemente, devido ao rodízio imposto pelo racionamento de água, por caminhões-pipa não fornecidos pela Sanepar, que por sinal tiveram as vendas suspensas por causa do desperdício de água. As perfurações e as contratações dos caminhões são irregulares e em muitos casos não são fiscalizadas pela Sanepar ou pelos órgãos de saúde competentes”, diz a nota. Caso o consumidor tenha dúvida na procedência da água em um caminhão pipa, a pessoa deve solicitar para a empresa que recolheu a água um laudo certificando a qualidade.

Em consulta à Divisão de Vigilância sobre o Meio da Secretaria Estadual de Saúde do Paraná, não houve notificação de casos de giardíase em seres humanos nos últimos meses.

Torneiras secas

Com o rodízio no abastecimento de água, caixas d´água e até mesmo as torneiras ficaram secas. Veterinários ouvidos pela reportagem chegaram a apontar esta possibilidade da torneira virar uma espécie de habitat para a giárdia, mas segundo duas professoras do curso de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a chance disto acontecer é pequena e depende muito da qualidade da água.

“Pode acontecer, mas apenas para água não tratada (de fontes ou rios), que não é o caso de quem recebe água da Sanepar. Mesmo sendo uma água não tratada, essa água teria que ter muitos cistos de giárdia para alguns cistos grudarem na torneira. Caso algum cisto fique grudado na torneira, que seria improvável, poderia sobreviver ali alguns dias, mas seriam necessários estudos para comprovar essa hipótese. O mais provável seria a ingestão da água contendo os cistos de giárdia”, disseram as professoras Márcia Kiyoe Shimada e Larissa Reifur que atenderam a Tribuna do Paraná.

Segundo as especialistas, o parasita precisa de condições adequadas (umidade, temperatura) para sobreviver e o tempo de sobrevivência dependerá muito dessas condições. No solo, a 25 °C, o cisto da giárdia pode sobreviver aproximadamente 7 dias, mas esse número cai quando o ambiente é mais seco e pega sol. “Na água, por exemplo, de torneira, ou de rio ou banhado, o cisto também pode sobreviver por alguns poucos dias”, alertaram.

Como prevenir a giardíase?

A melhor prevenção é a limpeza no local que o animal permanece. Caso ele vá passear, fique atento ao que ele possa estar cheirando ou até pisando em caso de poças. O tutor também precisa ficar alerta no que pisa, pois também pode levar o cisto para dentro de casa. Quanto à água, a recomendação é ferver por no mínimo 10 minutos ou comprar a mineral. Os filtros ajudam, mas nem sempre podem combater 100% a doença. Outra forma eficaz de proteção é a vacina contra a giardíase que previne 95% de chances de ocorrer a contaminação. Porém, segundo especialistas, esta vacina é apenas para cachorros.

A melhor prevenção é a limpeza no local que o animal permanece. Foto: Lineu Filho/Tribuna do Paraná.