Superação

“A gastronomia salvou minha vida”, diz ex-morador de rua que lançou buffet de cachorro-quente

Depois de passar fome e morar na rua, Anderson alcançou sua redenção na gastronomia
Dog do Anderson é sucesso no Sítio Cercado. Foto: Rodrigo Pierrot / |Gazeta do Povo

Para uns, a gastronomia representa um dos grandes prazeres da vida. Para outros, a comida representa mais do que isso: é a redenção. O empresário Anderson Vitorino da Silva, que vende cachorro-quente no Sítio Cercado, na região sul de Curitiba, se enquadra neste segundo grupo e não vacila ao garantir. “Foi a gastronomia que salvou a minha vida.”

Antes de começar a produzir o hot dog que é sucesso garantido – ele chega a vender 70 sanduíches em uma única noite –, Anderson chegou a passar fome nas ruas da capital paranaense. “Mesmo tendo uma família estruturada, caí no mundo das drogas com 14 anos, por influência dos amigos. O que começou como tirar onda, acabou se tornando um vício, que me levou a viver nas ruas”, relembra, sem conseguir conter a emoção. “Vivi um inferno, que incluiu 29 internações. O médico que cuidava de mim chegou a desistir, dizendo que não tinha mais jeito. Aquilo mexeu demais comigo.”

O ponto da virada veio em um dia em que, faminto, Anderson pediu um sanduíche em um trailer especializado em buffet de cachorro-quente no Portão. “Eu estava com muita fome e recebi uma negativa que mexeu muito comigo, como nunca havia ocorrido. Naquele momento pensei: um dia vou ter um trailer como esse e vou ajudar os moradores de rua sempre que puder.”

Para compensar os tempos bicudos, ele doa o excedente da produção diária às pessoas em situação de rua que transitam nos arredores da rua Izaac Ferreira da Cruz, número 4.005. “Eu senti na pele o que é sentir fome e não ter o que comer. Não desejo isso a ninguém.”

Há aproximadamente três anos, mesmo ainda entregue ao vício, ele traçou um plano com foco total na comida. Dias depois, ao passar em frente a um fabricante de trailers, ele se informou do custo para ter um: R$ 12 mil, na época. Obstinado, ele fez um acordo para ir pagando, mesmo que de pouquinho em pouquinho, o sonhado veículo que viabilizaria o seu desejo de investir em gastronomia. “Eu ainda vivia nas ruas, mas fui construindo meu sonho.”

Quando finalmente o trailer ficou pronto, no ano passado, ele contou com a ajuda da mãe, Delita, para comprar os equipamentos. “Ela acreditou que era a hora da mudança. Foi a comida que me ajudou a deixar o vício, as ruas e recomeçar”, afirma. Em meio à pandemia, ele começou apenas com delivery, mas com a liberação dos buffets, começou a servir exclusivamente no modo presencial, com cuidados extras.

“O cliente só pode se servir uma vez dos complementos, com luvas, máscara e talheres descartáveis. Também mantenho o álcool acessível. Outro cuidado é com a limpeza das mesas, que estão bem espaçadas e são higienizadas sempre que o cliente sai”, garante.

Na raça

Buffet de ingredientes. Foto: Rodrigo Pierrot / Gazeta do Povo

O início no novo ramo, no entanto, não foi nada fácil, já que Anderson nunca tinha trabalhado na área. Para chegar ao produto que entrega hoje, foram necessárias muitas tentativas e erros. “Aprendi na raça. Quando estava testando as receitas de maionese, cheguei a gastar 30 ovos para, finalmente, atingir o ponto que queria”, aponta.

Hoje, quem diria, o molho é uma das grandes atrações da casa. O favorito é o molho verde, cujos segredos o Anderson gentilmente compartilhou com o Bom Gourmet. Há, também, o que leva cenoura ralada e alho. E os tradicionais rosé, com catchup e molho inglês, e tártaro, mas com uma pegada diferente. “O meu é sem picles. Uso vinagrete junto à cebola e à cenoura”, revela.

As quatro opções de molho fazem parte da lista de 15 ingredientes do buffet, que são diariamente trocados para garantir a qualidade da entrega, com produtos sempre fresquinhos. “Eu começo a preparação bem cedo, ainda pela manhã, para abrir às 19h. Também faço questão de ter produtos de boa procedência, de marcas boas disponíveis no mercado. O cliente é meu patrão e tenho que agradá-lo.”

O preço dos cachorros-quentes, que podem ser complementados com os ingredientes do buffet, fica entre R$ 13 e R$ 14, com uma salsicha e pão de 15 centímetros, e R$ 17 e R$ 22, com duas salsichas e pão de 22 centímetros. Nesse formato mais robusto, o sucesso absoluto é o Tudão, que como o próprio nome indica, é super turbinado: além do pão na opção maior e das duas salsichas, vão dois tipos de queijos, bacon, calabresa, lombinho, frango, tomate, pimentão, cebola, milho verde, ervilha, maionese com cenoura, molho tártaro, verde e rosé, azeitonas, queijo ralado, vinagrete, farofa e batata-palha extra-fina.

“Uma explosão de sabores”, brinca Anderson, reverberando o slogan da B.B.A Lanches, o Big-X e Big-Dog do Ander. Apesar dos sanduíches com hambúrguer estarem no nome do empreendimento, ficaram para uma próxima etapa. “Quando fui registrar o nome, pensei no futuro. Sonhador, sabe?”.

O Tudão leva pão maior, duas salsichas, dois tipos de queijo, bacon, calabresa, lombinho, frango, tomate, pimentão, cebola, milho verde, ervilha, azeitonas, queijo ralado, vinagrete, farofa, batata-palha extra-fina, além dos molhos especiais.

Com a vida refeita e um empreendimento de sucesso, que pode ser mensurado pelas 7 mil curtidas na página do Facebook e as cinco estrelas nas avaliações do Google, o próximo passo é ampliar o trailer que divide com a esposa, Ana Luiza, o que permitirá não apenas reforçar o menu, mas também atender em outra frente. “O pessoal está pedindo delivery, mas com a nossa estrutura atual a gente não consegue fazer um bom atendimento nas duas modalidades. Mas, se tudo der certo, logo vamos expandir para atender cada vez mais pessoas”, projeta.

Enquanto isso, Anderson segue dando o seu melhor, não apenas no preparo do cachorro-quente, como no carinho com os clientes que interagem na sua página no Facebook. “Respondo diariamente e é muito gratificante receber o carinho e o reconhecimento também pelas redes. É a certeza de que estamos no caminho certo”.

Maionese Verde

Foto: Rodrigo Pierrot

4 ovos de boa procedência e na temperatura ambiente
Óleo de soja ou similar
1/2 colher de sopa de molho de pimenta
18 g de alho
50 g de cebolinha
3 g salsinha
3 colheres de sopa de creme de alho
1 colher de sopa de vinagre de álcool
½ colher de chá de açafrão
½ colher de chá de páprica defumada
1 colher de chá de lemon pepper

PREPARO

Coloque todos os ingredientes no liquidificador em velocidade baixa e acrescente o óleo aos poucos, até dar o ponto cremoso. Depois, mantenha na geladeira antes de servir. *Dica: Para não deixar a maionese com gosto residual de ovo, retire a pele da gema.