Crise no ar

A caos no sistema de transporte aéreo no Brasil já dura tempo suficiente para que sejam identificadas as suas causas. E apontados os responsáveis. Trata-se de uma crise grave que compromete um transporte essencial neste País continental, prejudica negócios e interesses pessoais e já ceifou ou deixou de salvar vidas. Tudo começou com o desastre do avião da Gol, o maior já ocorrido no País, registra o calendário dos fatos. Mas esta é uma crise que vem de muito antes do desastre e, embora tenha eclodido neste governo e dele talvez seja a maior responsabilidade, nasceu em administrações anteriores.

Governo após governo têm praticado o ?empurrar com a barriga? como um dos principais instrumentos de gestão da coisa pública. Há sempre um político ou burocrata a dimensionar erroneamente as prioridades diante de recursos escassos e fazer-se de cego para problemas que não acontecem aos olhos do povo, dos eleitores, e que podem passar despercebidos e não prejudicar o conceito político-eleitoral dos mandantes.

Ninguém imaginou que a destinação insuficiente de verbas para a estrutura que mantém os aviões no ar, desde aparelhagem sofisticada até equipes de controladores de vôo que precisam ser suficientes, preparadas e bem pagas, um dia seriam problemas escancarados diante da opinião pública. Foi preciso a morte de uma centena e meia de brasileiros num desastre na selva amazônica e a reação, de todo justificada, dos sacrificados controladores de vôo, para que a revolta se instalasse. Revolta agravada com o verdadeiro caos que se instalou no sistema, com atrasos e cancelamentos de vôos em todos os aeroportos brasileiros, impedindo não só que homens de negócios se locomovessem para trabalhar, como até um transplante de fígado fosse frustrado, levando a risco de morte uma criança. Isso para não falar no caso da jovem que ficou horas e horas num aeroporto sem saber se voaria para o seu casamento, só salvo pela solidariedade de outros passageiros que tudo fizeram para que uma data tão importante na vida da moça não fosse frustrada.

Há vítimas mais conhecidas e que fizeram a festa dos repórteres, como o técnico da seleção brasileira de futebol e o maior dos nossos campeões mundiais de vôlei que amargaram horas e horas de confusões nas salas de espera, sem saber se poderiam comemorar com suas famílias o sucesso de seus feitos esportivos. Não faltou o jogo de empurra, cada um jogando a responsabilidade para outros, e os controladores aparecendo como bodes expiatórios. As companhias aéreas, que alguma responsabilidade pela confusão evidentemente têm, nenhum papel mais sério desempenharam na crise, senão o de ser caixa de pancadas dos revoltados passageiros.

Foi preciso que a massa de passageiros desassistidos invadisse a pista em Curitiba, ou pusessem narizes de palhaço e fizessem apitaços em Brasília, Rio e São Paulo, para que afinal se descobrisse que a culpa é do governo. Deste e dos anteriores. Afinal os governantes avoados puseram os pés no chão e descobriram que esta é uma crise do Poder Executivo federal. Que foi o governo que não apetrechou o sistema com equipamentos e gente suficiente e habilitada para que continuasse funcionando. E se tornasse mais eficiente e seguro, pois está provado que mesmo antes e ainda depois do desastre com o avião da Gol, os que voam nestes céus correm constantes riscos.

Fez-se um gabinete da crise, presidido pela ministra Dilma Rousseff, e Waldir Pires, ministro da Defesa, ficou numa posição insustentável.

Sistema aéreo eficiente e seguro não dá votos, mas não tê-lo pode um dia derrubar aviões, ministros e até governos.

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