Com amor, sem paz

Cresce no PT, segundo a crônica de Brasília, o movimento de que é necessário mudar o rumo do governo Lula. O descontentamento já é conhecido, e vai desde o pessoal ligado ao MST – Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra, que quer reforma agrária já, ao funcionalismo público, que quer aumento salarial para ontem; dos sem-comida, que esperam o Fome Zero de pratos na mão, até a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que adverte para o esgotamento da paciência. Mas os mais insistentes, que se referem à política econômica, falam mais alto. Já conseguiram depor gente graúda da equipe do ministro Antônio Palocci Filho, reclamam dos juros altos e inventam agora um plebiscito nacional para decidir pela autonomia ou não do Banco Central. O Lula paz e amor pode continuar com muito amor. Paz ele já não tem mais.

O pessoal da mudança ganha espaço. A senadora Heloísa Helena, na liderança do quarteto formado ainda por João Batista Babá, Luciana Genro e Lindberg Farias, faz o gênero “morde e assopra”. Num mesmo dia subiu à tribuna para atacar a política econômica do governo Lula, este que aí está, mas também achou jeito de descer a lenha nos que chamou, sem meias palavras, de caras-de-pau, dignos de imaginário “prêmio óleo de peroba”. As dificuldades econômicas do País – disse ela, dedo em riste – não podem ser creditadas aos primeiros 50 dias do governo Lula, mas sim “à atuação das elites que se valeram do parasitismo para se perpetuarem no poder”.

Helena em parte tem razão. Mas ficou também evidente seu oportunismo. Elogiando Lula, evitou a punição que merecia por abster-se de votar em José Sarney e, de quebra, por recusar-se a ir ao jantar oferecido pelo presidente do Senado em homenagem ao companheiro presidente Lula. Com relação ao Banco Central, a coleta de assinaturas para o plebiscito tem a evidente intenção de bloquear a proposta de conferir maior autonomia à instituição, cujo presidente Meirelles foi seu primeiro desafeto dentro do novo governo. Para não continuar trombando de frente, recorre à velha arma da militância – a mesma esgrimida por José Genoíno: vamos sair às ruas, bater às portas das fábricas, conversar com os trabalhadores, explicar as reformas, defender, enfim, o governo do presidente Lula, “pois estamos muito orgulhosos de ser governo”.

O orgulho também pode se acabar antes do tempo. Até os bispos e padres que ajudaram na eleição começam a demonstrar sinais de impaciência com a priorização dos mercados em detrimento da produção e do emprego que dignifica o homem. “A economia também tem de ser em favor do ser humano”, sentenciou dom Jayme Chemello, presidente da CNBB. Para ele, as explicações de Palocci não convencem. Os juros altos, sofisma o bispo, atraem investidores que, depois que as taxas caírem, abandonarão o País. Não constituem investimento real, mas, sim, financeiro, que exaurem nossas riquezas…

Vê-se, assim, que estão roubando o discurso do Lula candidato para devolver ao Lula presidente a responsabilidade que até hoje ele não assumiu, alegando falta de tempo e casa desarrumada. Logo ele que afirmou tantas vezes que se elegeu para realizar e não para criticar – sempre a parte mais fácil. Por motivos semelhantes, o “Fora FHC” teve início. Ou Lula muda os rumos do governo mal-iniciado, ou tentarão mudar Lula…

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