Uso de MPs para embutir projetos vira ‘vale-tudo’

A banalização da prática de editar medidas provisórias criou uma nova relação do Palácio do Planalto com a base governista no Legislativo. Apesar das constantes reclamações contra a pauta de votação do plenário entupida de MPs, basta chegar uma nova medida ao Congresso para a sala do líder do governo na Câmara, José Múcio Monteiro (PTB-PE), se transformar em um ponto de romaria dos mais diferentes lobbies. Motivo: as MPs passaram a ser o caminho mais rápido para os parlamentares verem seus projetos transformados em lei.

Entra de tudo um pouco em qualquer medida provisória. A MP 350, por exemplo, que incentiva a compra de casa própria pela população de baixa renda, pelo Programa de Arrendamento Residencial, virou lei com um artigo sobre normas para rótulos nas embalagens de leite. Outra que criava gratificação para servidores de carreira do INSS, a MP 359, alterou o Estatuto do Desarmamento.

Os deputados descobriram que é mais fácil acrescentar artigos na MP do que apresentar um projeto sobre o assunto, que tem de ser aprovado em comissões temáticas e pelo plenário da Câmara. Já a MP é votada só no plenário, em 45 dias. A pressa do governo e dos interesses dos deputados embutidos na medidas provisórias aumenta a pressão sobre o Planalto em favor da votação da MPs.

No primeiro semestre deste ano, produtores de leite usaram a MP da casa própria para mudar a orientação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) sobre aleitamento materno. A Anvisa havia decidido que todas as embalagens de leite deveriam trazer advertência sobre os perigos dos produtos industrializados, em detrimento do leite materno. Na medida provisória, os produtores, com a ajuda de deputados, fizeram emendas para mudar a determinação da agência, colocando nas embalagens um texto que não associa a advertência ao produto.

A permissão para que auditores fiscais da Receita e do Ministério do Trabalho tenham direito ao porte de arma também foi aprovada no meio da MP 359, enviada para o Congresso em março, que não tinha nada a ver com o assunto. ?Ninguém sabia disso. Só vimos depois que virou lei?, conta o deputado Raul Jungmann (PPS-PE).

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