Petrobras será ?sócia? da YPFB na Bolívia

O presidente eleito da Bolívia, Evo Morales, anunciou ontem que a Petrobras será sócia da Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolívia (YPFB), a antiga empresa estatal do setor que foi desmobilizada nos anos 80 e que deverá ser recriada em seu governo. Claramente disposto a atrair capitais estrangeiros a seu país, Morales manteve o tom suavizado que empregou na última etapa de sua campanha eleitoral ao tratar do tema com a imprensa, no Itamaraty. Deixou especialmente claro que protegerá os investimentos privados em seu país e que seu governo não tomará a iniciativa de estatizar as companhias que exploram o petróleo e o gás.

Brasília – Esse compromisso foi igualmente expresso por Morales no encontro que manteve por cerca de duas horas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio do Planalto, e que foi acompanhado pelo presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli. O próprio Gabrielli, também em entrevista no Itamaraty, confirmou a parceria Petrobras-YPFB, mas insistiu que ainda não começaram a ser negociadas as condições dessa associação nem futura a composição societária.

?Nós somos responsáveis. Mas, como qualquer país, temos o direito de exercer a nossa soberania sobre os recursos naturais bolivianos. Isso não significa expulsar ou confiscar os bens de companhias internacionais. Disse (ao presidente Lula) que necessitamos de parceiros e que a Petrobras será nossa sócia?, afirmou o presidente eleito. ?Evo Morales, como presidente da Bolívia, vai proteger o investimento privado e garantir às empresas instaladas no país o direito de recuperar seus investimento e de obter lucro?, completou.

Em uma atitude bem recebida pelo governo brasileiro, Morales repetiu que será ?radical apenas com as empresas contrabandistas e que não pagam impostos?. Sob estreita fiscalização, as companhias estrangeiras do setor de gás e de petróleo não estariam enquadradas nesses casos. A ameaça paira sobre as empresas bolivianas do segmento de gás de cozinha, que se valem dos subsídios internos para a produção para vender ilegalmente, e a preços mais baixos, parte do produto para os países vizinhos.

A Petrobras desembolsa cerca de US$ 400 milhões por ano em pagamentos de impostos e royalties às diferentes esferas de governo da Bolívia, o equivalente a 24% da arrecadação tributária do país. A companhia já injetou no país vizinho US$ 1,5 bilhão – 20% do investimento direto estrangeiro na Bolívia entre 1994 e 2000 – e responde por 18% do Produto Interno Bruto (PIB). Igualmente é a maior exportadora da Bolívia, com embarques anuais de cerca de US$ 700 milhões para o Brasil, opera 46% das reservas de gás do país e detém 95% da capacidade de refino.

Extremamente cuidadoso ao lidar com a situação da Petrobras na Bolívia, Gabrielli acabou admitindo que a posição da empresa naquele país era de patroa, e não de parceira. Entre o mea-culpa e a promessa de agir com maior responsabilidade social na Bolívia, o presidente da Petrobras deixou claro o temor da companhia de sofrer um processo de estatização, como a Bolívia fez com as multinacionais exploradoras de estanho nos anos 50. Ou de arriscar o Brasil, onde 50% da demanda por gás é suprida pela Bolívia, a enfrentar cortes de fornecimento.

Morales diz que Bolívia quer parceiro, não patrões

Brasília – ?O presidente Morales não quer patrões, quer sócios. Concordamos inteiramente e queremos ser parceiros no desenvolvimento econômico e social da Bolívia?, afirmou Sérgio Gabrielli, presidente da Petrobras. ?Temos agora uma perspectiva tranqüila no país porque há estabilidade política, há definição para onde o governo vai seguir, há apoio do Congresso ao novo presidente, e temos o compromisso que não haverá quebra de contratos e estatização?, completou.

A cautela de Gabrielli está vinculada aos passos que o novo governo dará nessa direção, ainda encobertos de névoas. A Lei de Hidrocarbonetos, que nacionalizou as reservas naturais e impôs o aumento da carga tributária do setor de 35% para 50%, no ano passado, ainda não foi totalmente regulamentada. A YPFB, a rigor não existe fora do papel. Os contratos entre a Petrobras e essa mesma YPFB terão de ser negociados, sem que haja nenhuma noção das primeiras exigências do novo governo.

Em paralelo, como afirmou Gabrielli, a demanda por gás no mercado brasileiro é crescente. Nem os gordos investimentos na exploração dos campos da Bacia de Santos, anunciados na última quarta-feira, nem o gasoduto que trará o gás da Venezuela seriam fontes suficientes para se descartar o suprimento boliviano. ?Brasil e Bolívia são dependentes do gás. São duas pontas com um gasoduto no meio. Por isso, temos de buscar uma solução equânime e equilibrada?, explicou.

Depois do encontro em Brasília, Lula mandou o Boeing presidencial 737, o Sucatinha, ir à noite à La Paz para levar de volta à capital boliviana o presidente eleito, Evo Morales. O vôo custou aos cofres públicos algo em torno de R$ 45,2 mil. O assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia, disse que ?foi uma questão de cortesia? e que isso ?é uma coisa muito normal?. E indagou: ?Qual o problema??

Voltar ao topo