Ministério Público de Goiás põe marcha sob suspeita

Goiânia – O Ministério Público de Goiás abriu inquérito para apurar se o Estado de Goiás e a Prefeitura de Goiânia cometeram crimes ao doar cerca de R$ 500 mil em ajuda à Marcha Nacional da Reforma Agrária. A caminhada, organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), mobiliza mais de 11 mil pessoas na BR-060 pela aceleração da reforma agrária.

A Promotoria de Defesa do Patrimônio Público quer saber o valor exato da ajuda e como o dinheiro foi utilizado pelo MST. ?O Estado tem problemas sociais nas escolas e na área de saúde, as estradas estão em péssimas condições e o governo resolve fazer uma doação para um movimento sociopolítico?, criticou o promotor Fernando Krebs. Para o promotor, só a cessão de cem banheiros químicos e de oito caminhões-pipa carregados diariamente com água potável já caracteriza improbidade administrativa. ?A Constituição, no artigo 37, proíbe estados e municípios de financiarem movimentos políticos?, disse o promotor. A investigação prevê a convocação do procurador-geral do Estado, João Furtado de Mendonça Neto, para explicar as condições do repasse. Também serão convocados o presidente da Saneamento de Goiás (Saneago), Geraldo Félix de Souza; o procurador-geral do município de Goiânia, Marconi Pimenteira; o coordenador estadual do MST, Ney Orzekovski; e o coordenador nacional do MST, João Pedro Stédile. Caso o Ministério Público comprove irregularidades, os responsáveis poderão ser punidos por improbidade administrativa e dano ao erário. ?Eles podem ser condenados a devolver aos cofres públicos o valor que foi repassado ao MST?, explica o promotor Umberto Machado de Oliveira. O MST também pode ser condenado a devolver os recursos. O dinheiro público é gasto principalmente em comida e água para os manifestantes. A Prefeitura de Goiânia deu início à ajuda em 30 de abril, quando manifestantes montaram acampamento diante do Estádio Serra Dourada. Até 2 de maio, a prefeitura forneceu cerca de 50 mil marmitas, a R$ 3,49 cada. O total gasto pela prefeitura de Goiânia foi de R$ 174.500. Os gastos do governo de Goiás com a marcha são maiores. Além do custo dos oito caminhões-pipa, com 250 mil litros de água fornecidos por dia pela Saneago, a Secretaria de Estado da Cidadania deve gastar R$ 200 mil em alimentos para os manifestantes.

?Investiguem as dívidas?

Alexânia – Líderes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) reagiram ontem à decisão do Ministério Público de Goiânia de investigar os gastos do governo estadual e da Prefeitura com a Marcha Nacional pela Reforma Agrária, cobrando investigação sobre as dívidas dos ruralistas. De acordo com a coordenadora nacional do MST e porta-voz da marcha, Rosana Fernandes, o Ministério Público deveria ter a mesma preocupação com as dívidas dos ruralistas. ?Eles tiraram bilhões dos cofres públicos e agora estão pedindo renegociação. Isso, sim, é calote escandaloso.? Lideranças do movimento vão atender às convocações do MP, se elas ocorrerem, disse a líder. ?A estrutura de apoio à marcha é fruto da solidariedade dos companheiros e da sociedade?, disse Rosana. Ela contou que os grupos de cada estado se cotizaram e coletaram recursos para fretar os 300 ônibus e a maior parte da alimentação saiu dos assentamentos. A rádio foi emprestada pela Associação Brasileira de Rádios Comunitárias e os aparelhos, cedidos pela organização do Fórum Social Mundial. ?Recebemos doações das prefeituras e de pessoas que nem conhecemos.?

O presidente da União Democrática Ruralista (UDR), Luiz Antonio Nabhan Garcia, considerou o pedido de investigação das dívidas uma provocação. ?Estamos pedindo a renegociação porque queremos pagar, diferente do MST que recebe dinheiro do governo a fundo perdido.? Segundo ele, o produtor rural deu todas as garantias de que vai pagar as dívidas. ?Só precisa de um fôlego, pois foi vítima das condições climáticas e do cartel dos insumos.? Nabhan Garcia disse que o dinheiro repassado ao MST financia as invasões. ?Esse dinheiro nunca volta para o governo.?

Décimo dia

Ontem, no décimo dia de caminhada rumo a Brasília, os sem terra avançaram mais 14 quilômetros pela BR-060, acampando no sítio Recanto da Taboca, em Alexânia. O proprietário, Fernando Carvalho Araújo, disse que a área foi invadida. ?Cortaram a cerca em dois pontos para entrar com os caminhões?. Ele precisou passar o gado para outro pasto e prender os cavalos. A mulher de Araújo, Neudja, disse que os sem terra arrombaram dois cadeados da porteira e estavam nadando numa represa usada para abastecimento. Foi a sétima invasão de áreas particulares desde a saída de Goiânia, no dia 2.

A caminhada, com o apoio da Polícia Rodoviária Federal, não teve incidentes. A rádio, cuja antena esbarrou num cabo de alta tensão há dois dias, apresentou avaria e não funcionou. Na passagem por Alexânia, moradores saíram à rua para ver a marcha. ?Nota dez para a organização deles?, elogiou o comerciante Elziro Oliveira Soares. ?Deviam estar trabalhando?, disse Jean Rocha Salgado, também comerciante. A cozinha da marcha foi mudada de Anápolis para Taguatinga, no Distrito Federal. A chegada do comboio com dezenas de caminhões e ônibus causou uma imprevista mobilização do forte esquema de segurança montado em Brasília para a reunião da Cúpula América do Sul/Países Árabes.

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