Fruet diz que CPI pode convocar Lula

O desdobramento das investigações sobre a denúncia de que o Partido dos Trabalhadores recebeu dinheiro de Cuba para financiar a campanha presidencial de 2002 pode provocar um fato inédito na história política do país: a convocação do presidente da República para prestar esclarecimentos a uma comissão parlamentar de inquérito (CPI).

A possibilidade de o Congresso convocar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva existe e foi discutida ontem com o líder do PSDB na Câmara, Alberto Goldman (SP). A declaração, feita com exclusividade ao site Congresso em Foco, é do deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), um dos membros mais atuantes da CPMI dos Correios. O deputado reconhece que a possibilidade de uma CPI convocar a mais alta autoridade do país é um dos temas mais controversos do meio jurídico brasileiro.

"Uma doutrina jurídica entende que o presidente só pode ser chamado a dar explicações no decorrer de um processo de impeachment", diz Fruet. "Outra corrente, no entanto, admite sim a possibilidade de o presidente ser ouvido como testemunha", complementa o tucano. Nesse caso, explica, Lula seria chamado a prestar esclarecimentos na condição de testemunha. Poderia definir data, horário e local para o depoimento.

Na avaliação do deputado, os desdobramentos da crise política nos próximos dias podem tornar insustentável o silêncio do presidente. "Se investigarmos, vai parecer perseguição. Do contrário, porém, vai ser omissão. Por isso, temos que investigar. Se a denúncia não for verdadeira, os autores dela terão de se explicar na Justiça", afirmou Fruet.

Fôlego novo

A discussão do assunto pelos oposicionistas revela que as investigações das CPIs, que estavam desacreditadas, vão ganhar novo fôlego a partir desta semana com a denúncia publicada pela revista Veja de que o PT teria recebido US$ 3 milhões ou US$ 1,4 milhão de Cuba para financiar a campanha presidencial de 2002.

PSDB, PFL e PPS já decidiram que representarão contra Lula e o PT na Justiça Eleitoral e no Ministério Público. Pedirão que as duas instituições abram investigações para verificar se os petistas realmente receberam doações provenientes do exterior, crime passível de pena de cassação de registro do partido. A eventual comprovação da denúncia também pode, em tese, embasar um processo de impeachment do presidente da República.

Sem mencionar o nome de Lula, o líder da oposição na Câmara, José Carlos Aleluia (PFL-BA), afirmou, ontem, que o partido vai trabalhar para convocar todos os envolvidos na denúncia relatada pela revista Veja neste final de semana. As convocações, segundo Aleluia, deveriam ocorrer no âmbito da CPI dos Bingos.

Segundo a revista, dois ex-integrantes da gestão do ministro Antonio Palocci (Fazenda) na Prefeitura de Ribeirão, Ralf Barquete e Vladimir Poleto, são acusados de terem "operado" na campanha de Lula em 2002. Eles teriam transportado dinheiro de Cuba para o PT. Barquete, morto em 2004, era secretário da Fazenda e Poleto, seu auxiliar direto. O caso também envolve o ex-assessor de Palocci na prefeitura, o advogado Rogério Buratti, já investigado pela CPI e que pode ser reconvocado.

Segundo a assessoria da CPI dos Bingos, a comissão deve fazer uma reunião administrativa hoje para definir o cronograma de trabalhos para a semana que vem. Nesta reunião, podem ser definidas as convocações para o caso do "dinheiro de Cuba". "Trabalhamos com o plano de convocar todos os envolvidos: o Poleto, o Buratti, o piloto de avião e o motorista", diz Aleluia, em referência aos funcionários que supostamente ajudaram a transportar os recursos mencionados na reportagem.

Punição

A legislação eleitoral proíbe os partidos políticos de receberem dinheiro do exterior, e pune com a cassação do registro partidário esse tipo de crime eleitoral. Na prática, a menos de um ano da eleição, a aplicação da pena tornaria inelegíveis todos os petistas, inclusive o presidente Lula.

A punição, severa, é vista com reservas até por integrantes da oposição. Mesmo que a denúncia se confirme, Gustavo Fruet se diz contrário à aplicação da pena para o PT. "Não trabalho com o cenário de cassação. Não é justo com o partido nem com os militantes", afirma. O tucano lembra, por outro lado, que ainda não se passaram os oito anos previstos na Lei 9096/95 para a prescrição desse tipo de crime.

Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Fruet ressalta que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já manifestou entendimento de que o candidato não deve responder solidariamente ao partido em irregularidades dessa natureza.

"Foi o que ocorreu com Cassio Taniguchi (PFL) em Curitiba", diz o deputado, ao recordar que o ex-prefeito da capital paranaense não perdeu o mandato mesmo após a confirmação do uso de caixa dois em sua campanha eleitoral. "De qualquer forma, esse episódio vai ser explorado nas eleições do ano que vem e vai marcar negativamente o presidente Lula caso a denúncia seja verdadeira", avisa Fruet.

Caso os tucanos insistam com a ofensiva, os petistas prometem contra-atacar com o pedido de cassação do mandato do senador Eduardo Azeredo (MG), que renunciou à presidência do partido semana passada após confirmar ter recebido dinheiro do empresário Marcos Valério Fernandes numa operação de caixa dois da campanha eleitoral de 1998.

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