Delúbio Soares: “Eu não costumo delatar ninguém”

  Antonio Cruz / ABr
Antonio Cruz / ABr

Soares: "As dívidas foram levantadas
pela direção do partido".

Brasília – O ex-secretário nacional de Finanças e Planejamento do PT assumiu sozinho, por diversas vezes, durante seu depoimento na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Mensalão, a culpa pelos empréstimos e pelo caixa dois do partido. E avisou que não é delator. "Eu não costumo, e faz parte da minha integridade, não delatar ninguém", garantiu ontem Delúbio.

Mesmo quando acabou confirmando uma declaração, dada um ano antes, que poderia comprometer o ex-ministro-chefe da Casa Civil, deputado federal José Dirceu (PT-SP), Delúbio demonstrou cuidado para não falar demais. Indagado sobre uma entrevista que deu à revista Época, em 2004, na qual assumia uma relação estreita com o então chefe da Casa Civil, o ex-tesoureiro resistiu a responder. Na entrevista, ele dizia: "Claro que converso muito com ele (José Dirceu). Nós assinamos muitos cheques de campanha, cheques do partido. Minha responsabilidade nas finanças do partido é a mesma que a dele." "É verdade", admitiu, depois de muita insistência do deputado Júlio Redecker (PSDB-RS), embora tenha destacado que os saques das empresas de Marcos Valério Fernandes de Souza, apontado como o operador do mensalão, eram feitos somente com sua autorização.

A preocupação em não comprometer mais alguém voltou à tona em outras oportunidades. Quando foi perguntado sobre se seria amigo e teria intimidade com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Delúbio não respondeu. Limitou-se a dizer: "Eu sou militante do Partido dos Trabalhadores e o presidente Lula foi presidente do partido por muitos anos. Admiro muito (o presidente)." "É amigo dele? Sim ou não?", indagou o deputado Júlio Redecker. "Eu o admiro muito", repetiu Delúbio.

O ex-tesoureiro do PT afirmou não ser um traidor, em resposta a uma pergunta sobre o pronunciamento do presidente Lula em que ele se disse traído por "práticas inaceitáveis" no PT. "Não costumo questionar a opinião das pessoas. Elas podem dizer o que quiser. Ele (o presidente Lula) fez aquela frase e eu acato a frase dele. Não me sinto traidor. Mas aí é a opinião de cada um, que vai analisar, e a vida vai nos ensinar."

O ex-tesoureiro contou que não produziu a dívida do PT, mas foi chamado a resolvê-la e reafirmou ser o único responsável pela forma como os recursos foram arrecadados. "As dívidas foram levantadas pela direção do partido. Mas da forma de resolver, ninguém mais do partido participou, nem das negociações dos empréstimos, nem da arrecadação de recursos."

Acerto com o PL

Delúbio Soares confirmou em seu depoimento o acordo financeiro fechado entre PT e PL para a coligação dos dois partidos na campanha de 2002. Segundo ele, pelo acordo, o PT iria repassar ao partido coligado R$ 10 milhões -25% do valor total da arrecadação da campanha presidencial. O ex-tesoureiro do PT confirmou a reunião entre os dois partidos para definir a campanha à Presidência da República e o valor a ser pago ao PL para compensar as perdas causadas pela verticalização – o PL só poderia se coligar com o PT em todos os Estados, o que prejudicou o partido e diminuiu sua bancada.

O ex-tesoureiro também confirmou que o encontro ocorreu na casa do deputado Paulo Rocha (PT-PA), com a presença do presidente Lula, o vice-presidente José Alencar e o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto. Assim como o presidente do PL, Delúbio disse que Lula e Alencar estavam em um escritório quando o repasse ao PL foi acertado.

Em entrevista à revista Época, o presidente do PL já havia falado sobre a negociação entre os dois partidos em 2002. Segundo Costa Neto, houve acerto financeiro entre as duas legendas para manter a coligação que efetivamente venceu as eleições daquele ano. No entanto, Valdemar Costa Neto afirmou à revista que foram R$ 6,5 milhões. "Não chegou aos R$ 10,8 milhões que estão falando. Estão botando R$ 4 milhões a mais na minha conta." Ainda durante o depoimento, Delúbio negou que tenham sido firmados acordos financeiros com outros partidos da base. "O acordo com o PTB foi político, para apoio em segundo turno", disse Delúbio, que também afirmou a informação do empresário Marcos Valério de que não foi o empresário quem procurou o PT para oferecer o esquema de empréstimos ao partido.

Recursos para Ciro

Delúbio Soares admitiu ainda que repassou recursos (cerca de R$ 400 mil) para o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, então candidato derrotado a presidente. Delúbio afirmou, contudo, que as verbas (provenientes do empresário Marcos Valério) não foram para pagar dívidas de campanha, mas sim filmetes que Ciro gravou no segundo turno, em apoio à campanha do presidente Lula.

Prazo de 8 dias

O presidente da CPMI do Mensalão, senador Amir Lando (PMDB-RO), deu um prazo de oito dias, contados a partir de ontem, para que Delúbio Soares apresente uma contabilidade informal – com uma relação de créditos e débitos -aos integrantes da comissão. Durante todo o depoimento, Delúbio se esquivou das perguntas sobre quem recebeu recursos do caixa 2. Lando destacou que não faz sentido, a essa altura da crise, o ex-tesoureiro esconder os nomes das pessoas que receberam os pagamentos. "Sempre que se esconde o óbvio, dá a entender que há delito maior do que ele realmente é", avaliou o presidente da CPMI.

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