Brasil fracassa na luta pelos direitos humanos

Brasília – O relatório divulgado ontem pela Anistia Internacional traduz em linhas gerais o “fracasso” do Brasil na tentativa de coibir a violência urbana e a repressão policial exagerada. Esquadrões da morte, limpeza social, entre outras mazelas, são citadas no estudo, que aponta ainda a conivência das autoridades na apuração de crimes, principalmente envolvendo as classes menos favorecidas da sociedade.

“Milhares de pessoas, predominantemente homens jovens, pobres, negros ou pardos, foram mortos em confrontos com a polícia, freqüentemente em situações oficialmente descritas como resistência seguida de morte”, diz o relatório, que ressalta ainda a morosidade na averiguação das acusações envolvendo policiais militares.

Como se não bastasse, o texto indica ainda que, muito embora o governo federal tenha se comprometido a combater a violência policial excessiva, os números desmentem essa tese. Só em São Paulo, a polícia matou o ano passado 915 pessoas, um aumento de 11% com relação ao ano anterior. No Rio de Janeiro, entre janeiro e novembro, as forças policiais do Estado mataram 1.124 pessoas, um crescimento de 34%.

Outro ponto que chama a atenção no relatório tem como base a tortura. Tanto nos presídios pelo Brasil afora, como na Febem, os relatos de maus-tratos seguem freqüentes. A equipe da AI visitou, em junho do ano passado, a unidade de Franco da Rocha e documentaram dezenas de casos de espancamentos e outras formas de tortura, que teriam sido cometidas por guardas penitenciários. “Os detentos em delegacias de polícia, prisões e centros de detenção juvenis continuaram a ser encarcerados em condições cruéis, desumanas e degradantes”, diz o estudo.

Violência, ameaças, intimidação e perseguição política de ativistas rurais continuam a ser endêmicos, segundo a Anistia Internacional. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, 53 ativistas rurais foram mortos entre janeiro e setembro. Somente cinco pessoas foram presas como conseqüência das 976 mortes ocorridas entre 1985 e 1996.

A região que registrou maior incidência de violência relacionada a conflitos rurais foi, mais uma vez, o Sul do Estado do Pará, uma área atingida por trabalho escravo, tráfico de drogas e conflitos agrários. Até setembro, 31 mortes foram registradas no Pará, a maioria no Sul do Estado.

Além disso, a AI aponta ainda para as questões das prisões injustas – ou sem motivo – de pessoas ligadas à briga pela terra.

EUA jogam direitos humanos no lixo

Londres

– “Os Estados Unidos sacrificaram os direitos humanos e utilizaram uma linguagem dupla em sua intervenção no Iraque e contra o terrorismo”, acusa Anistia Internacional (AI) em seu relatório anual. O documento, que examina a situação dos direitos humanos em 157 países em 2003, denuncia violações cometidas em numerosos países, mas insiste nos abusos cometidos em nome da liberdade e da “guerra ao terrorismo” de Washington.

A guerra unilateral declarada para expulsar Saddam Hussein do poder teve ainda o efeito de “quase paralisar” as Nações Unidas. A Anistia questiona inclusive se os acontecimentos de 2003 não foram “um golpe fatal para as esperanças de uma justiça planetária”. A organização de defesa dos direitos humanos considera que a ONU não foi levada em conta durante o conflito no Iraque e depois foi marginalizada na questão do pós-guerra, desacreditada em razão de sua aparente maleabilidade às grandes potências. E agora “parece incapaz de obrigar os países a responderem por seus atos”.

Os EUA têm uma responsabilidade específica nesta situação, segundo a Anistia, cujo informe 2004 é, pela primeira vez, acompanhado de um vídeo de 15 minutos de imagens de arquivo. “Não pode haver segurança duradoura sem respeito aos direitos humanos”, escreve Irene Khan, secretária-geral da Anistia: “As intenções mundiais de segurança do governo dos EUA aparecem desprovidas de princípios e de perspectivas”.

“Não é sacrificando os direitos humanos em nome da segurança interna, fechando os olhos aos atentados (contra os direitos fundamentais) no estrangeiro e recorrendo sem restrição aos ataques militares preventivos, que um governo pode esperar o reforço da segurança ou a defesa da liberdade”, acusa Khan.

Neste contexto, prossegue, o fato de realizar uma campanha contra o terrorismo e a favor dos direitos humanos, ao mesmo tempo em que pisam neles, é uma mostra de “linguagem dupla”.

O relatório, em uma atualização anexa, lembra a carta aberta enviada por Irene Khan a George W. Bush no dia 7 de maio, na qual afirma que “os supostos abusos cometidos por militares na prisão de Abu Ghraib em Bagdá são crimes de guerra e pede ao governo americano que faça uma investigação profunda”.

Ásia é ?campeã da pena de morte?

Londres

– A Ásia executou mais pessoas em 2003 do que todo o resto do mundo junto, segundo dados apresentados pela Anistia Internacional, que também acusa a guerra contra o terrorismo de servir de pretexto para a opressão de centenas de pessoas no continente. Cingapura, onde a taxa de penas capitais por habitante é a maior do planeta desde 1994, executou mais de 400 pessoas desde 1991.

A China admite 1.639 condenações à morte e 726 execuções, mas estes dados podem esconder uma realidade muito mais inquietante, segundo a organização internacional. No Vietnã, 103 pessoas foram condenadas à morte em 2003, segundo números oficiais. Informações divulgadas pela imprensa contabilizam 64 execuções, geralmente públicas, mas também neste caso, a realidade pode ser ainda pior.

A Anistia destaca o caso do Japão, onde os condenados à morte só são informados sobre a sentença um pouco antes do momento de sua execução, às vezes a poucas horas, o que os coloca em um estado de tensão mental dificilmente suportável. O Paquistão tem 5.700 condenados à espera da execução. A Índia recentemente reservou a pena de morte aos casos “mais escassos”, mas de todos os modos, 33 condenações à morte foram divulgadas em 2003. A Malásia executou “apenas” sete pessoas no último ano, mas a AI critica as condenações a golpes de bastão, uma punição tão cruel quanto desumana.

A situação dos direitos humanos não melhorou na Ásia, segundo a AI.

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