Ato ecumênico lembra os 30 anos da morte de Herzog

A homenagem na Catedral da Sé em memória da morte do jornalista Vladimir Herzog, neste domingo, foi uma reedição de sua missa de 7º dia, que há 30 anos uniu diferentes grupos religiosos e políticos inconformados com sua morte, sob tortura. A reação à morte de Vlado, que o regime militar anunciou como suicídio, marcou o início da luta pela redemocratização – o jornalista passou a ser encarado como símbolo da tolerância, da justiça e da busca pela paz.

Além dos familiares e amigos de Vlado, o ato ecumênico de hoje, que durou quase duas horas, pôs lado a lado políticos de vários partidos, como o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, o prefeito José Serra e o deputado Alberto Goldman, todos do PSDB, o deputado petista Luiz Eduardo Greenhalgh (SP) e os ex-petistas Ivan Valente e Plínio de Arruda Sampaio, que hoje estão no PSOL. Acolheu e deu voz aos mais variados grupos religiosos, de católicos, protestantes e judeus a xamanistas, muçulmanos, espiritualistas e hindus.

Clarice Herzog, mulher de Vlado, chorou e lembrou de d. Hélder Câmara, na época arcebispo de Olinda, a quem atribui o apoio que a fez conseguir criar os filhos e seguir a vida. "Há 30 anos ele (d. Helder) esteve aqui e não pôde abrir a boca, porque estava proibido, porque era perigoso, como o Vlado representava o perigo, assim como tantos outros de nós", disse.

Em seguida, leu o poema ‘Deve ser Pesadelo’, de d. Helder, dedicado a Herzog. Clarice disse que na missa de 7º dia de Vlado, tentou não falar nada, mas não conseguiu, e lembrou que recebeu apoio de d. Helder para extravasar suas emoções. "A raiva que me fez conseguir viver."

Há 30 anos, assim como hoje, o ato foi celebrado pelo cardeal d. Paulo Evaristo Arns e pelo rabino Henry Sobel. "Gostaria de recordar os compromissos que assumimos há 30 anos, neste mesmo local, diante dos despojos daquele que havia sido arrebatado à força de nosso meio e tinha sido caluniado de toda forma, e depois foi glorificado no Brasil e no mundo inteiro", disse d. Paulo ao iniciar o ato. Ele falou de Vlado como amigo e mártir da liberdade e da democracia.

"Deus faz questão de dizer aos homens que é maldito quem mancha as mãos com o sangue de seu irmão. Então Vlado Herzog não terá morrido em vão, mas terá coroado os corações jovens para a sua autêntica missão na vida."

Sobel comentou com indignação a morte de Herzog, mas argumentou que ela "surtiu efeitos positivos incomensuráveis" no País. "Foi a pressão da sociedade que fez o governo militar refrear a ditadura militar. E é com essa mesma voz que assumimos hoje o compromisso, o sentimento de indignidade e inconformidade diante da violação dos direitos alheios."

Para Sobel, a grande resposta que a sociedade pode continuar a dar em memória de Herzog é se manifestar sempre, não se conformar com nenhuma arbitrariedade. "Assumimos hoje o compromisso de nunca mais calar, pois o silêncio é o mais grave dos pecados." Ao fim, Sobel repetiu o Kadish, oração judaica aos mortos, acompanhada por todos, de mãos dadas.

Ivo Herzog, filho de Vlado, que na época de sua morte tinha 8 anos, elogiou o ato e pediu que a mensagem de luta pela paz e pelos direitos humanos seja disseminada. "A violência hoje é outra, passou para um caráter mais social, mas a luta é sempre a mesma, pela dignidade humana", disse. "Muitos que estão aqui hoje ou que ouvem sobre o meu pai nem viveram na sua época, mas percebem que é muito importante e reconhecem o legado que ele deixou."

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