Antes do Natal, do Ano Novo e do Carnaval

Na edição de "Direito e Justiça" de 2/3/2003, publicamos o artigo "Depois do Carnaval" e na edição de 28/12/2003 o texto "No Natal e Antes do Carnaval". Agora, novamente antes do Natal, do Ano Novo e do Carnaval, retornamos à retrospectiva das condições políticas e sócio-econômicas e seus reflexos nas relações de trabalho face o ano que se finda e o que se aproxima. Neste momento, já se iniciou o processo que alia a reflexão do que passou no ano, com nossa situação no presente, para nos projetarmos para o que poderá ser o futuro. Este exercício individual não é suficiente. Também se verifica coletivamente nas instituições públicas, nas empresas, nos sindicatos, nos partidos políticos, nas igrejas, nas escolas, nas organizações da sociedade civil, na busca da interação do desenvolvimento pessoal-familiar com o crescimento de toda a sociedade. Relembro algumas das questões suscitadas nos artigos anteriores e aponto cenários para um período que envolverá 2005 e 2006.

Inflação: 2002 fechou com índice inflacionário de 14,74% (INPC/IBGE), balizador de reajustes salariais nas negociações coletivas, atingindo 16,33% entre 02/02 a 01/03. De 12/02 a 11/03 o índice ficou em 12,76%(INPC). Era o principal obstáculo a ser ultrapassado, finalmente registrando 5,72% no período dos últimos 12 meses, de 12/03 a 11/04, estabilizando a correlação entre preços dos produtos e reajustes salariais, equilibrando o mercado de trabalho.

Macroeconomia: A taxa de juros era 18% em 09/02, avançou até 26,5% no início de 2002 e progressivamente foi reduzida para retornar ao patamar anterior, hoje em 17,25%. Outros índices podem ser acrescentados para a análise, como o valor do real perante o dolar, então em R$3,63 e hoje em R$2,70, o risco-Brasil que atingia a 1.600 pontos e agora por volta de 500 pontos, o saldo comercial de 11 bilhões de dólares (2002), atingindo o dobro em 11/2003, ou seja, 22 bilhões de dólares e agora em cerca de 32 bilhões de dólares. Este saldo positivo na balança comercial está ligado ao crescimento do nível de emprego, em decorrência do avanço significativo das exportações, no maior resultado já verificado em nosso país. Mas 2003 teve o resultado quase negativo do produto interno bruto (apenas +0,25%), sinalizando a necessidade da retomada mais conclusiva da política de crescimento econômico, o que ocorreu durante todo o ano de 2004, agora com o PIB atingindo o patamar de 6,1%. Mantida a política de contenção inflacionária, na tentativa de segurar preços, o reequilíbrio nas contas externas, superávit nas exportações e novos investimentos externos, foi possível superar o quadro recessivo que se afigurava.

Negociações salariais: Em 2002, pouco mais da metade das categorias profissionais conseguiu fixar o reajuste salarial respeitado o INPC anual. Já o resultado de 2003 foi de 53% das categorias com reajustes abaixo do INPC, embora no 2º semestre algumas delas (bancários, petroleiros, químicos, metalúrgicos, por exemplo) tivessem conseguido reajustes acima dos índices de inflação. Houve, portanto, quadro semelhante em 2002 e 2003, embora a queda inflacionária possibilitasse a manutenção do poder aquisitivo em patamares mais elevados do que no ano 2002. Em 2004, ocorreu avanço na quase totalidade dos acordos, convenções coletivas e acordos sobre a participação nos lucros e resultados, pois a grande maioria registrou percentuais iguais ou superiores ao INPC do período. No primeiro semestre de 2004, os índices de reajustamento e de aumento salarial foram os melhores desde 1996, quando cerca de 80% das categorias profissionais obtiveram ganhos iguais ou superiores a inflação. No Paraná, 70% dos acordos e convenções do setor industrial foram acima da taxa inflacionária. O segundo semestre manteve o mesmo patamar, com a novidade da longa greve dos bancários visando (e conseguindo) aumentos salariais acima da taxa inflacionária e ganhos adicionais, inclusive reavivando a luta por reposição de perdas salariais acumuladas ao longo dos anos.

Desemprego: No início de 2003, o desemprego era a principal questão da herança recebida do neoliberalismo no país, com a existência de 12 milhões de desempregados, sendo 19% na região metropolitana de São Paulo e 7,3% o índice médio nacional. No final de 2003, segundo a CUT, "os maiores problemas no Brasil são a desigual distribuição de renda e o desemprego. Há um agravamento da crise social, manifestada nos índices de desemprego (20,4% na Região Metropolitana de São Paulo, conforme o DIEESE) e pela pior renda média dos trabalhadores nos últimos anos, efeitos da política neoliberal implementada pelo Governo FHC". Portanto, naquele momento, persistia o desemprego "como fator desagregador do equilíbrio social e ainda a principal preocupação dos brasileiros". Entretanto, 2004 mostrou a reversão inicial desse panorama, com o crescimento dos empregos formais, em cerca de dois milhões (+7%), basicamente nos setores industriais e do comércio. A indústria teve a produção acrescida de 8,3%, seu melhor desempenho desde 1995.

Perspectivas: Escrevíamos no início de março de 2003 que "o desafio, pois, será encontrar, nesse quadro de dificuldades locais, herdado de uma política econômica neoliberal por oito anos, e nas turbulências da política internacional norte-americana, as fórmulas eficientes para superar a crise, gerar empregos e renda e estabelecer um ponto de equilíbrio nas relações entre capital e trabalho, que são as indicadoras da harmonia social Eis algumas das difíceis tarefas que se colocam para todos nós, depois do carnaval". No final de 2003, assinalávamos que "hoje, durante as festividades do Natal temos a certeza que a política macroeconômica foi controlada, o processo inflacionário está sendo reduzido a quase zero ao mês, o real readquire sua capacidade de compra, o risco país foi drasticamente rebaixado, a balança comercial é favorável, a credibilidade internacional brasileira está em alta. As condições para o combate ao desemprego estão colocadas. Ainda na avaliação da CUT, "para 2004, as perspectivas de crescimento são positivas. A partir da redução da taxa de juros, haverá uma queda da dívida pública e aumento da oferta de crédito, estimulando o consumo e os investimentos produtivos. A retomada do desenvolvimento do nosso país passa pelos investimentos em produção de bens de capital, com fortalecimento da indústria nacional. Para isso é preciso reduzir o superávit primário para gerar emprego e renda e desenvolver uma política social integrada e audaz". Já o ministro Antônio Palloci, em entrevista a Agência Estado (21.12.03) assinalava que o governo vai ser proativo na questão do emprego, pois "o Brasil precisa de um compromisso,na retomada do crescimento, de distribuir renda. Essa é uma política que gera emprego. O Brasil já cresceu a taxas baixas e altas, mas nunca distribuiu renda". E indica a fórmula:" O que o presidente Lula tem usado muito é que o Brasil agora vai crescer para todos. A novidade é, primeiro, a possibilidade de arrumação da casa de longo prazo; segundo, crescimento de longo prazo e terceiro, crescimento com distribuição de renda. Isso já é outro Brasil". Embora, alguns desses fatores tivessem sido confirmados, ainda persistem grandes dificuldades para o ano de 2005, como as mesmas questões cruciais do final de 2003 a serem enfrentadas, "entre elas a da dívida pública, interna e externa, a dependência do país em face ao capital internacional, a especulação financeira e a necessidade de controle desse capital especulativo" e, agora, acrescente-se, a questão relacionada com a queda do dólar em relação ao real, podendo gerar problemas nas exportações. A avaliação empresarial é no sentido de manter as taxas de crescimento, em conseqüência, de manter os investimentos e persistir na geração de empregos, embora persista a reivindicação relacionada com a queda da taxa dos juros, ponto essencial para o empresariado. As entidades sindicais dos trabalhadores assinalam com o aumento significativo do salário mínimo e correção da tabela do imposto de renda, como fatores emergenciais.

Desdobramentos no Paraná: No final de 2003, registramos que "em nosso Estado, a sétima sondagem industrial da Federação das Indústrias do Estado do Paraná aponta que 87,46% das 393 empresas pesquisadas têm expectativas favoráveis para 2004, quer com aumento de vendas, quer com elevação no nível de emprego. O quadro econômico paranaense é mais favorável que o brasileiro, eis que, segundo pesquisa do Ipardes, o produto interno bruto em 2003 crescerá 2,9%, contra apenas 0,25% do país. No campo do emprego, houve aumento de 5,9% de trabalhadores com carteira assinada, sendo que destes, 85,6% em cidades do interior paranaense. A taxa de desemprego na região metropolitana de Curitiba ficou em 8,5% da população economicamente ativa, o melhor resultado da região sul e abaixo da média nacional de 12,5% para as regiões metropolitanas em geral. A projeção do crescimento do PIB para 2004 é de 4%". Neste ano de 2004, confirmadas as previsões do final de 2003, no Paraná foram criados cerca de 150 mil empregos formais, crescimento de 9,37% (11,18% no interior e 6,53% na região metropolitana de Curitiba), especialmente na indústria de transformação, serviços e comércio. A taxa de desemprego em Curitiba e Região Metropolitana ainda se mantém no índice de 8,4%, diante de 7,6% em Porto Alegre, 11,2% em São Paulo, 12,1% em Salvador e 15,8% em, Recife. Segundo levantamento da FIEP a massa salarial teve crescimento real de 5,98% (já descontada a taxa inflacionária).

As questões em debate: No texto de 28.12.03, escrevíamos que "não necessitamos, assim, esperar para depois do carnaval, como no início de 2003, que as condições sejam estabelecidas, pois elas estão definidas e há indicativos seguros que, se o governo adotar medidas como as preconizadas pela entidade sindical dos trabalhadores, além das que se referem à dívida pública e o capital financeiro especulativo, dentre outras, será possível iniciar um amplo combate ao desemprego, ampliando as oportunidades de trabalho e gerando renda, com o crescimento sustentado da economia. Neste rumo, as relações de trabalho poderão se solidificar dentro de um quadro de apoio recíproco entre empresários,. trabalhadores e governo". Atualmente, debatemos os rumos da economia, o aumento significativo do salário mínimo, o reajustamento da tabela do imposto de renda, a maior desoneração fiscal dos produtos da cesta básica, a aplicação de parte do superavit primário (cerca de 75 bilhões de reais) em investimentos sociais para a construção de casas populares, assentamento de sem-terra, escolas, hospitais, com geração de maior número de empregos formais, além de investimentos na recuperação da infra-estrutura básica (transporte, energia elétrica etc).

Esperança: Que as confraternizações do Natal e do Ano Novo nos unam e revigorem e que, passadas as férias, depois de Carnaval, já estejamos dispostos a enfrentar velhos e novos desafios que se nos colocam neste país tão maravilhoso pela sua gente e natureza, mas tão desigual e injusto para milhões de excluídos.

E-mail: edesiopassos@terra.com.br

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