Adolescentes em conflito com a lei, estigma e realidade

A apreensão da realidade é imprescindível para a compreensão de processos como um todo, para tanto a forma de análise e reflexão deve ser sob o aspecto da totalidade. Então, ao falarmos de adolescente infrator trazemos à tona a adolescência que se caracteriza por ser uma fase da vida de difícil compreensão, tanto pelo próprio adolescente como pelas pessoas que o cercam.

A adolescência é um processo complexo e altamente mutável que envolve as questões pessoais, familiares e sócio políticas. O acesso à vida social, ao mundo do trabalho, além do fenômeno fisiológico que pode ser caracterizado por redefinição de imagem corporal, entre outros, contribuem para que a questão da adolescência se complexifique.

A fase da adolescência em si é uma fase conturbada onde surgem conflitos psicológicos pessoais que interferem nas relações sociais estabelecidas entre os indivíduos. Estes conflitos conjugados a outros, podem acarretar sérias conseqüências, dentre elas a violência.

A realidade brasileira vem sendo marcada por uma série de questões que estão interligadas ao sistema econômico vigente. O capitalismo sob a ideologia do lucro e da exploração do trabalho tem ocasionado cada vez mais as desigualdades sociais.

As conseqüências destas desigualdades sociais acabam por gerar desemprego, violência e um empobrecimento generalizado da população. Em meio a estas questões sociais está o adolescente em conflito com a lei, situação esta que deságua na fase adulta no aprisionamento.

Ao ingressar em Programas para cumprimento de medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e Adolescente – E.C.A. e ao realizar contato com adolescentes em conflito com a lei podemos perceber que a intervenção junto a esta população tem um caráter educativo, como sugere o próprio E.C.A., porém surgem questionamentos tais como:

A atuação pedagógica junto aos adolescentes de Programas como o Liberdade Assistida, contribui para a formação da cidadania?

E começamos a perceber que: ?é possível admitir possibilidades de uma ação pedagógica num sentido emancipatório, no contexto da prestação de serviços e benefícios sociais mediante a construção de estratégias de efetivação de direitos? como bem coloca Marina Maciel Abreu em seu livro Serviço Social e a organização da cultura: perfis pedagógicos da prática profissional.? Então esta ação pedagógica pode ser possível na realidade dos adolescentes em conflito com lei, desde que as políticas não sejam fragmentadas e haja compromisso ético-político dos sujeitos envolvidos.

A relação existente entre adolescente e ato infracional é demonstrada a partir desta etapa da vida (adolescência) ligada ao processo socioeconômico e cultural vivenciado pelo jovem na sociedade. E ao realizar análises acerca das políticas públicas que prestam atendimento ao adolescente, constata-se que se tornam pontuais e fragmentadas frente à realidade de muitas famílias que se encontram em condições de precariedade de desenvolvimento e estruturação.

adolescente infrator está sujeito a uma série de problemas que se complexificam, ainda mais, frente ao contexto socioeconômico no qual está inserido e constata-se que caso não sejam cedidos os direitos que lhe são assegurados, a sua recuperação se torna praticamente impossível.

Numa realidade em que os mínimos sociais não são respeitados, a tendência é que sejam encontradas estratégias de sobrevivências, sendo uma entre elas o ato infracional. Que se apresenta na maioria das vezes contra o patrimônio (furtos e roubos).

Devido à forma como se estruturam as políticas públicas é necessário que se busque transformar a concepção da benesse em direito, fazendo com que o indivíduo conquiste o direito a ter direitos. O incentivo da participação da comunidade em conselhos, fóruns e congressos de direitos poderia contribuir para uma maior efetividade da cidadania. Sendo assim, então, acreditamos ser importante a realização de estudos acerca dos fatores determinantes à participação dos indivíduos em movimentos de reivindicação de direitos sociais, levando-se em conta que a participação pode derivar para a emancipação dos sujeitos atuantes que percebem criticamente todo o funcionamento da sociedade e suas contradições.

E quanto ao estigma ?… não se pode prender nem bater nesses deliquentes …?, é comum ouvirmos isto, quanto ao prender por exemplo podemos verificar o art. 112 do E.C.A. que diz:

Verificada a prática de ato infracional, a autoridade, competente, poderá aplicar, ao adolescente, as seguintes medidas:

I – advertência;

II – obrigação de reparar o dano;

III – prestação de serviços à comunidade;

IV – liberdade assistida;

V – inserção em regime de semiliberdade;

VI – internação em estabelecimento educacional;

VII – qualquer uma das previstas no 101, I a VI.

§ 1.º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la as circunstâncias e a gravidade da infração.

Porém devemos antes de tudo buscar legitimar o artigo 227 da Constituição Brasileira:

Constituição da República Federativa do Brasil em seu Artigo 227 – É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de coloca-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Uma vez que o adolescente é o adulto de amanhã, é de suma importância cumprirmos nossos deveres conforme o que diz o art. 4.º do E.C.A.:

Art. 4.º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção socorro em quaisquer circunstâncias:

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública:

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Os adolescente infratores são colocados como culpados por parte da violência e criminalidade, mas o que há por traz disso? Exclusão social, políticas públicas fragmentadas como já comentamos anteriormente, o problema da drogadição com acesso à droga em cada esquina das ruas de nossos bairros.

Qual pai não tem problemas com seus adolescentes? Qual sociedade não tem que ter políticas pedagógicas para suas crianças e adolescentes?

As contradições do capitalismo: emancipar os jovens através do conhecimento e estes contestarem o poder econômico-político ou mantê-lo alienado e fazer do adolescente em conflito com a lei o criminoso de amanhã? Das penas impostas com caráter pedagógico do Estatuto da Criança e Adolescente às penas de ?ressocialização? do Código Penal. Do adolescente infrator ao adulto criminoso cumprindo pena no Sistema Penitenciário.

Valdir Cozendey de Almeida é agente penitenciário e bacharel em Serviço Social.

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