Absolvição que condena

O segundo julgamento pelo plenário da Câmara de processo oriundo da Comissão de Ética, indiciando corruptos ou corrompidos, resultou em arquivamento. Tal resultado pode ser frustrante para todos aqueles cidadãos brasileiros que esperam que o País saia dessa crise política e moral higienizado. Mesmo que parcialmente, higienizado. Mas não há nada a reclamar, pois a Comissão de Ética não encontrou no processo do deputado Sandro Mabel, do PL goiano e líder do seu partido na Casa, provas de que tivesse cometido algum ilícito ou ato que ferisse a ética parlamentar. Ele foi acusado de ter distribuído a seus colegas e liderados dinheiro do caixa 2 ou mensalões (a diferença está na freqüência e quantia) e ainda de ter oferecido R$ 1 milhão à deputada Raquel Teixeira, do PSDB goiano, para que ela mudasse de partido e fosse engrossar as fileiras do PL.

A falta de provas, mesmo que apenas testemunhais, levou o caso ao enfrentamento da palavra da deputada, que acusava, e de Mabel, que negava. Agiu de forma certa a Comissão de Ética, ao recomendar o arquivamento do processo. Também certo agiu o plenário da Câmara, mandando arquivar o processo por 340 votos contra 108, com 17 abstenções e dois votos em branco.

A absolvição se impunha, pois dentro de um regime democrático não se há de condenar ninguém sem provas e faculdades de ampla defesa. E prova não havia contra o indiciado.

Cabe, entretanto, levar em consideração alguns fatores que demonstram como até mesmo parlamentares estão vendo a atuação de seus pares e a poluição que torna nebuloso o ambiente político. E com uma ótica ainda mais severa, tudo é assistido pela nação.

Nada menos de 108 deputados, em votação secreta, não titubearam em condenar o deputado Mabel, mesmo sem prova provada, aceitando como válida a palavra da acusadora, que se disse vítima de uma tentativa de aliciamento mediante grossa paga. Devem ter pensado, em primeiro lugar, que Raquel Teixeira não tinha e não tem nenhum motivo para inventar a história do aliciamento. Também que esse procedimento ilegal e imoral não é estranho ao ambiente parlamentar, hoje impregnado de impropriedades e fértil em maracutaias que envergonham o País. Os exemplos de casos de mau uso de dinheiro público, renúncias de mandatos para escapar a punições, inclusive do então presidente da Câmara Federal, e a existência provada de rios de dinheiro formando caixa 2 e alimentando campanhas eleitorais, bolsos de políticos espertos e cuecas de assessores e transgressores, permitiam que sem pejo se acreditasse na tentativa de cooptação da deputada. Tanto mais quando isso custaria ?apenas? R$ 1 milhão, dinheiro que, de uma forma ou de outra, saiu dos bolsos do povo. Portanto, da casa-da-mãe-joana.

Estes comentários não devem ser interpretados como dúvidas sobre o acerto do arquivamento que significou a absolvição do deputado Sandro Mabel. Devem, sim, ser interpretados como evidências de que os nossos políticos e, ?in casu?, os membros da Câmara dos Deputados, estão com um conceito tão baixo que até mesmo uma absolvição por falta absoluta de provas se dá sem unanimidade, com decepção da platéia e muitos cumprindo com o seu dever e, paradoxalmente, sentindo dor na consciência. E mais de uma centena de deputados atirando no escuro. Os votos contra o deputado sempre poderiam estar acertando um corruptor ou corrupto, mesmo sem evidências.

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