A longo prazo

A longo, ou melhor, a médio ou talvez até curto prazo, o homem que tantas vezes saiu às ruas em passeatas e fazendo barricadas para mudar o mundo é quase certo que vai consegui-lo pela destruição de suas condições de habitabilidade. A longo prazo, falando em economia, ?todos estaremos mortos? e portanto impossibilitados de aproveitar o que de bom for feito e o que de mau acontecer. Esta previsão pragmática é do ex-ministro e ex-deputado Delfim Neto. Previsões em política já exigem mais retórica e, se possível, uma bola de cristal, principalmente no Brasil, onde os nossos homens públicos mudam de posição como biruta de campo de aviação, voltando-se para onde sopra o vento. É o que tem acontecido mercê de nossa falida legislação político-eleitoral, que tem permitido que um político mude de legenda duas, três, quatro ou cinco vezes, se não mais, num mesmo mandato. De espinha mole e em busca de vantagens eleitorais, despido de idéias, ideais e programas, muitos de nossos políticos ora viram para um lado, ora para o outro e sempre para o do poder, que lhes enseje nomear, desviar, roubar e garantir a reeleição montando um esquema de apaniguados, cabos eleitorais e até familiares.

Entretanto, chegamos a uma situação em que é possível, com alguma lógica, fazer previsões políticas. E isso, em razão de que o povo brasileiro, ?sem medo de ser feliz?, elegeu um presidente operário, homem do povo, enfrentando todos os nossos preconceitos e histórico temor reverencial à burguesia, que sempre imaginamos nasceu para mandar. E o povo, para sofrer e obedecer. Acontece que Lula não foi eleito pelo PT nem governou, em seu primeiro mandato, com seus correligionários. Quase um quarto de século de lutas do Partido dos Trabalhadores não foi capaz de formar, em torno de Lula, um apoio político suficiente para poder governar. O resultado foi ter de ceder a outros grupos aproveitadores, que não só partilharam com ele o poder, como ofereceram um apoio remunerado e caro, que custou a imagem ética do petismo e quase a do próprio presidente Lula.

Este resistiu, mas o PT não. O partido, encolhido, não será o escolhido neste segundo mandato. O partido-base do governo já se definiu: será o PMDB, sob a presidência de Michel Temer, que liderava a ala anti-Lula.

Isso terá um alto preço. O PMDB exigiu nada menos que cinco ministérios e ainda muitas estatais. Senão, não vai apoiar os pleitos do governo no Congresso. E quer mais. Deseja que se mantenha a coligação PT-PMDB, mas que desse grupo que faz parte do condomínio do poder saia um candidato à sucessão de Lula das fileiras do partido do falecido Ulisses Guimarães.

O sucessor de Lula terá de ser um peemedebista. Até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, líder do oposicionista PSDB, agremiação egressa do PMDB, entende que esse deve ser o caminho. Já é hora de o PMDB, que é o maior partido do País, ter de novo um candidato à Presidência, depois de alguns anos de ostracismo que foram antecedidos pelo gigantismo de ter sido o maior partido do ocidente.

O PT dificilmente terá um nome para suceder a Lula. Nem uma bandeira como a que o levou à Presidência, pois ele mesmo já mudou de rumos, aceitando um neoliberalismo com coloração social e um capitalismo que não rejeita o capital estrangeiro, como dantes. O futuro previsível é que os grupos de esquerda partam para uma nova agremiação, pequena e ideológica. E a semente revolucionária do PT levando um operário à Presidência e tirando do povo o ?medo de ser feliz? vai ficar estéril, substituída pela nova bandeira de salvação: a do PMDB velho de guerra e que de alguma forma representa a volta das oligarquias ao comando do País.

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